António Barreto defende nova Constituição aprovada com referendo popular
Numa intervenção na Universidade de Verão do PSD, que amanhã termina em Castelo de Vide, Barreto considerou mesmo a revisão da carta magna do país uma “tarefa muito urgente”.
“A revisão constitucional, ou a refundação da Constituição, ou a elaboração de uma nova Constituição é uma tarefa muito urgente, muito séria e que não deve ser feita como no passado”, disse aos alunos sociais-democratas.
Barreto alegou que os tempos de crise não são impeditivos de uma revisão da Constituição, lembrando que a de 1976 foi feita durante a maior crise que Portugal já viveu. “E foi essa Constituição que ajudou a resolver a crise”, acrescentou.
Barreto não crê que a actual Constituição seja a causa dos problemas de Portugal, mas afirma não ter dúvidas que impede o país “de encontrar melhores soluções”. “Defendo uma nova Constituição, cuja estrutura, essência, dimensão, linguagem, propósito sejam muito diferentes da actual”.
O presidente da Fundação Francisco Manuel dos Santos enumerou os argumentos que considera fundamentais para a mudança da carta magna do país. O primeiro prende-se com o facto de “haver muita gente que se queixa da Constituição” e desta estar “sempre a ser evocada a bem e a mal, estar sempre a ser posta em causa”.
Também, a actual Constituição impede políticas e reformas. “Impede a procura livre de soluções para muitos dos nossos problemas”, disse Barreto.
A “carga ideológica” da Constituição é outro dos argumentos – o que, segundo Barreto, “obriga a políticas concretas, contrárias à vontade do soberano” eleito.
O facto de condicionar “excessivamente o Parlamento e o Governo, o legislador e as novas gerações” e de transformar “muito frequentemente os debates políticos em ‘a favor’ ou ‘contra’ a Constituição”, em vez de “se discutirem os méritos da proposta A ou B”, foram outros dos argumentos defendidos pelo sociólogo.
Por fim, acrescentou “que todas as gerações têm o direito de rever a Constituição, sobretudo quando é muito política ou programática”.
Quanto ao método de revisão, António Barreto propõe que o Governo e a Assembleia da República “digam ao povo o que pretendem” e que seja criada uma comissão de debate sobre a Constituição, com um mandato de uma ano e aberta a toda a sociedade. “Que ninguém diga ‘não tenho nada a ver com isso’”, afirmou. Tal debate terminaria com um referendo, “em que, pela primeira vez, os portugueses digam ‘sim’ ou ‘não’ à Constituição”.
Barreto considerou ainda que a actual Constituição é “super-defensiva” e “cheia de ratoeiras”. Mas o principal defeito, acrescentou, “o mais importante defeito”, é que “diminui a liberdade dos cidadãos e dos seus representantes”.
“Obriga as gerações actuais e futuras a aceitarem decisões de gerações anteriores e limita a liberdade de escolha e decisão dos governos e dos parlamentos para traçarem as políticas correntes”, disse António Barreto. “A maior parte da Constituição não é feita de princípios universais e permanentes, é feita de orientações tácticas e estratégicas a curto prazo e de circunstâncias”, explicou.
Direitos universais
Barreto quer uma Constituição escrita para os cidadãos “que acabe com a fragmentação dos direitos”: “Há mais direitos parcelares que universais. Os direitos das mulheres são às centenas, os dos jovens às dezenas, os direitos das crianças são diferentes dos direitos dos jovens, os direitos dos trabalhadores são centenas, os direitos dos deficientes, dos artistas, dos imigrantes. Isto não é uma Constituição é um programa político. A Constituição define direitos universais, não importa que seja homem ou mulher.”
Renovar a representação popular é outro dos objectivos que a nova Constituição deveria conter, “nomeadamente recriar um sistema eleitoral que não exclua cidadãos”. “A Constituição excluiu nove milhões de portugueses que não se podem candidatar a eleições”, afirma.
Barreto diz que não quer um parlamento de independentes, mas diz que “se dez milhões têm o direito a eleger, os mesmos dez milhões deveriam ter direito a ser eleitos”. Até porque acredita que, quando for possível haver candidaturas independentes, que essas candidaturas criariam “racionalidade às decisões”. Ou seja, “quando os partidos políticos se sentirem ameaçados” por candidaturas independentes vão escolher melhor os seus candidatos.
Reformar a Constituição judiciária é outra das propostas de António Barreto, considerando que a justiça “é o pior problema de Portugal”. E deu alguns exemplos do que, nesta matéria, devia ser revisto: “Evitar que o presidente do Supremo [Tribunal de Justiça] seja o presidente do Conselho Superior [de Magistratura]; eliminar os três conselhos superiores e fazer um só e retirar poderes ao Conselho Superior.”
“Em Portugal criou-se um vício semântico e político: em nome da independência do juiz quando julga, principio que eu reputo quase sagrado, criou-se a independência em auto-gestão dos juízes. E isso é inaceitável. Se os juízes são órgãos de soberania como alguns pretendem ser, têm de respeitar o soberano. E o soberano é o povo”, salientou.
Manifestou-se também contra o movimento sindical dos juízes que deveria “ser inibido”: “Os militares são inibidos do direito sindical e ninguém grita. Os juízes também o deveriam ser.”
O sociólogo diz que pretende “um debate sereno, profundo, racional sobre a Constituição, durante meses e não de supetão. Quem fizer este debate, que o faça sabendo que o povo está à escuta”.
Notícia actualizada às 18h02