No topo do Kilimanjaro

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Conseguimos! Estava confiante que chegaria ao cume, mas não contava com tamanha dificuldade. No passado mês de Junho, acompanhei a organização humanitária internacional Concern Worldwide, na subida à montanha mais alta de África, o Kilimanjaro, 5896 metros de altitude, numa aventura que classifico como uma das experiências mais marcantes da minha vida. O trekking seguiu a magnífica rota Machame, que acerca o Kilimanjaro pela parte sul, atravessando uma densa floresta tropical, até ao topo nevado, onde nos esperou uma vista de cortar a respiração. Até lá, e desde o campo de Machame, já nos 3000m, foram cinco dias de caminho, com seis a sete horas de marcha diária.

30 de Junho foi o dia do desafio final. A subida até ao topo. Acordei às 23h00 e, depois de uma refeição ligeira, o grupo estava pronto para começar a subir. O céu estava totalmente claro e a noite iluminada por uma grande lua cheia. A subida começou de maneira bastante abrupta, por entre pedras grandes e escarpas direitas. O grupo caminhava em linha de forma muito lenta. A altitude não permitia um esforço superior. Contudo, aos poucos, fomos ganhando altitude e confiança. Esta altitude pode ser fatal para o ser humano. Ninguém vive permanentemente aqui.

A suave luz da lua iluminava o suficiente para podermos caminhar sem lanternas e cada um foi-se fechando no seu próprio mundo. O único ruído que ouvia era da minha respiração. Conforme subíamos e a noite avançava, a temperatura diminuía. As minhas mãos gelavam. A água que transportava também congelou. Houve um ponto que o objectivo me pareceu inalcançável.

Após cinco horas de caminhada, já tínhamos avançado muito, tendo ganho quase 1000 metros verticais. O cansaço era grande, mas o desejo de chegar ao cume, em simultâneo com o nascer do sol, mantinha-nos a força e a vontade de fazer caminho. Nos minutos seguintes, o céu começou a tingir-se de tons de azul e cor-de-rosa. O dia estava finalmente a nascer. A temperatura subiu um pouco e a energia do sol transferiu-se para o grupo. Por entre a penumbra do dia, foi possível vislumbrar o branco dos glaciares a contrastar fortemente com o escuro do céu. De um lado glaciares azuis com mais de 50 metros de altura, do outro a linha do horizonte, curva pela altitude, e um sol que nascia trazendo o tão almejado calor do dia.

Os últimos metros até ao Stela Point, a primeira marca de altitude do Kilimanjaro, foram esgotantes. Até ao ponto mais alto, seriam mais 40 minutos de caminhada. Continuei. Tinham sido seis horas e meia de subida quase ininterrupta a uma altitude considerável.

Durante toda a noite caminhei com o grupo mas fiz um esforço para me adiantar e fazer o caminho restante sozinho. Senti uma forte necessidade de estar apenas comigo, de admirar a beleza desta paisagem em silêncio e sem partilha. A emoção do momento foi muito forte e as lágrimas correram-me soltas no rosto. Talvez por concretizar este sonho e ter superado todas as dificuldades da subida - afinal, estava no topo de África. Agradeci à vida a oportunidade de viver esses momentos mágicos e a energia que tive para concretizar a subida. Veio-me à memória o objectivo central desta expedição, o apoio à Concern e às pessoas que vivem neste maravilhoso espaço de terra que é a Tanzânia.

Estávamos prontos para enfrentar o segundo desafio do dia, a longa descida de volta ao campo base e daí até ao Milenium Camp, a 3800 metros, onde dormiríamos. Foi ao chegar ao campo, já com a luz do final de dia, que pude olhar para trás e ver o grande Kilimanjaro, já longe e imponente, e apreciar o quanto tínhamos subido naquela madrugada.

Francisco Cipriano

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