A violência homofóbica e transfóbica tem de ser parada
É mais do que tempo de os políticos europeus enfrentarem o fenómeno da homofobia e transfobia e as suas causas
Há algumas semanas, uma pacífica manifestação de Orgulho Gay em Split, na Croácia, foi brutalmente atacada por milhares de hooligans, ferindo mais de uma dúzia de pessoas. Os contramanifestantes eram consideravelmente mais numerosos do que a polícia e os participantes. A polícia não conseguiu proteger estes últimos, que queriam apenas alertar para a condição de pessoas lésbicas, gay, bissexuais ou transexuais (LGBT). Estes acontecimentos tiveram lugar após semanas de discursos repletos de ódio, com ameaças, graffiti, folhetos e as redes sociais a incitarem ao ódio.
Não é a primeira vez que uma manifestação contra a homofobia e a transfobia é vítima de ataques e ameaças por parte de extremistas. Em 2010, em Belgrado, na Sérvia, a polícia esforçou-se heroicamente para proteger a primeira manifestação de Orgulho Gay que decorreu na cidade, mas cerca de 150 pessoas foram feridas nos confrontos, na sua maioria polícias. Mais uma vez, os contramanifestantes eram mais numerosos do que aqueles que se expressavam pelos direitos LGBT. Em Vílnius, na Lituânia, em 2010, as autoridades tiveram de mobilizar um vasto contingente policial para proteger a Marcha Báltica do Orgulho Gay de ataques violentos.
Há uma consciencialização crescente no seio das autoridades locais de que as manifestações de Orgulho Gay pacíficas têm de ser autorizadas e protegidas; as pessoas LGBT têm os mesmos direitos que as outras à liberdade de associação e de expressão. Este reconhecimento é obviamente positivo.
A contínua necessidade de protecção policial maciça é, no entanto, extremamente negativa. É mais do que tempo de os políticos europeus enfrentarem o fenómeno da homofobia e transfobia e as suas causas. O primeiro passo será reconhecer que o problema é sério e que é necessária uma acção sistemática para promover a consciencialização de todos os níveis da sociedade. De seguida, há uma urgente necessidade de contrariar todas as tendências para a discriminação deste grupo de pessoas - incluindo em políticas oficiais de direitos humanos e de igualdade.
Nos últimos cinco anos monitorizei o exercício dos direitos humanos pelas pessoas LGBT nos 47 Estados-membros do Conselho da Europa. O resultado foi recentemente publicado num relatório: Discriminação com base na orientação sexual e identidade de género na Europa.
O relatório enumera uma série de obstáculos ao total respeito destes direitos humanos universais. Mostra, por exemplo, que a perseguição homofóbica e transfóbica nos locais de trabalho e o bullying de pessoas LGBT nas escolas é comum em praticamente todos os países. O registo oficial de organizações LGBT foi obstruído ou recusado em cinco países da Europa e tentativas de criminalizar "propaganda ou promoção da homossexualidade" foram identificadas em três Estados-membros.
Praticamente não tem havido resposta aos estudos e relatórios nacionais que destacam o número desproporcionado de pessoas LGBT que não vêem outra saída que não o suicídio para a não-aceitação da sua orientação sexual ou identidade de género por parte dos seus pares ou da família. Muito poucos países reconhecem a violência homofóbica ou transfóbica na sua legislação como crimes.
Os transexuais têm pela frente problemas de direitos humanos particularmente duros em quase todas as áreas da vida. Se querem ver legalmente reconhecido o seu género identitário, em 29 dos Estados-membros do Conselho da Europa enfrentam a exigência legal de realizar uma cirurgia de mudança de sexo conducente à infertilidade. Quinze Estados-membros exigem até que um transexual não seja casado para que possa obter esse reconhecimento, o que implica a obrigatoriedade de divórcio, se a pessoa já for casada.
Demasiadas vezes, políticos e decisores ignoram os direitos humanos das pessoas LGBT ao conceberem políticas e elaborarem legislação. Existem exemplos perturbadores de debates em Parlamentos nacionais que são caracterizados por um elevado grau de preconceito, enviesamento e informação ultrapassada, incluindo afirmações de que a homossexualidade é uma doença.
É preciso que os Governos se empenhem em reformas legislativas e na mudança social para permitir que as pessoas LGBT gozem plenamente os direitos humanos universais. É necessária monitorização nacional e internacional, incluindo por órgãos responsáveis pela igualdade e provedorias da Justiça, para avaliar os progressos.
A mudança só será possível se os países europeus mostrarem mais genuína vontade política para lidarem com este problema com uma determinação muito maior do que aquela que têm demonstrado até aqui. Comissário para os Direitos Humanos do Conselho da Europa
Nota: o relatório Discriminação com base na orientação sexual e identidade de género na Europa pode ser encomendado em http://book.coe.int/EN/ ou descarregado em www.coe.int/t/commissioner/default_EN.asp