Ainda o ensino do Português e a literatura

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Não haverá aumento de horas que melhore os resultados, mantendo-se estes programas e esta pedagogia

A presidente da Associação de Professores de Português, Edviges Ferreira [EF], tentou demonstrar no seu artigo (PÚBLICO, 5.8.2011) que a APP sempre defendeu a literatura e a sua inseparabilidade do ensino da língua, acusando de difamatórias as críticas que contrariaram essa pretensa postura. Creio que o meu artigo (PÚBLICO, 26.7.2011) é associado às tais "críticas difamatórias", tanto mais que dele se retirou a expressão "ideologia pedagógica" que, surpreendentemente, EF interpreta como positiva, quando ela traduz a ideia de uma cartilha, distribuída aos professores para seu cumprimento acrítico, logo, obediente.

Durante anos pertenci à APP e discuti com a sua direcção a reforma que se preparava para destruir a disciplina de Português, sendo interlocutores quase exclusivos do ME a própria APP e a Associação Portuguesa de Linguística (APL - a que se associa a TLEBS). A ex-directora do GAVE (Glória Ramalho), a propósito da petição (2005) que lancei sobre o conteúdo dos exames e a interpretação de cruz, testemunha a intervenção destas duas associações nas "orientações programáticas", a que "dava cumprimento", sendo "as propostas de avaliação do GAVE [...] submetidas à apreciação da APP e da APL" e "inequivocamente aprovadas" (Visão, 26.1.2006).

Para que as dúvidas sobre este assunto não subsistam, servir-me-ei apenas, e sem comentários, de intervenções da direcção da APP, nomeadamente do seu ex-presidente (Paulo Feytor Pinto), sendo então vice-presidente Edviges Ferreira, e desta última, na sua qualidade de actual presidente. A propósito da subestimação da literatura e da importância dada ao texto jornalístico no ensino da língua, disse PFP: "[...] A APP fez muita pressão para que assim fosse", considerando suficiente "Luís de Camões e Eça no Ens. Sec.", e não vendo "necessidade" de o ministério emitir uma lista de autores, pois "se os professores têm uma boa formação conseguirão fazer essas escolhas". Tudo com a justificação de que "o apreço pela língua [...] se calhar é muito mais importante do que este ou aquele autor". Quanto à eliminação de Gil Vicente, Camilo, Cesário Verde, e outros, afirmou: "Desde que se dêem bons textos que sirvam para os alunos aprenderem a ler qualquer outro, serve". Nas competências para um 12.º ano: "O fundamental é que eles saibam ouvir, falar, ler e escrever". (PÚBLICO,18.8.2001)

Num debate entre Olga Pombo e Paulo Feytor Pinto sobre o mesmo tema, orientado por Paula Moura Pinheiro, afirmou PFP: "Pode dizer-se que os novos programas de Português tendem a privilegiar a língua em relação à literatura, o que me parece adequado. [...] a flexibilização no que respeita à escolha dos textos é uma forma de permitir que os professores adeqúem o melhor possível os autores às suas salas de aulas". E, retomando o argumento do saudosismo, tão em voga, e tão caro aos defensores do Acordo Ortográfico, referiu que "a deificação do passado, da alta cultura, a reverência para com os valores literários consensuais têm sido parte das causas da inadequação do programa de Português dos últimos 25 anos. O que hoje se propõe é fazer menos para fazer melhor. [...] Quem quiser, pode escolher fazer uma disciplina alternativa que se chama Literatura Portuguesa".

Em 2001 (PÚBLICO, 6 Set.), Maria Helena da Rocha Pereira reagia à "anunciada dissociação língua e literatura": "No ensino, língua e literatura não devem separar-se. Não é a opinião da maioria dos linguistas, mas é a minha". Reacção idêntica a da linguista Fernanda Irene Fonseca, perante o absurdo.

Edviges Ferreira terá de rever o que disse à jornalista Clara Viana (PÚBLICO, 15.7.2011) a propósito dos maus resultados no 12.º ano: "À semelhança do 3.º ciclo, [o programa] é muito extenso e, com o estudo dos autores, não há tempo para treinar a língua, especifica". Não saber distinguir um sujeito de um complemento directo, no 12.º ano, foi justificado como "esquecimento" por EF. Por sua vez, o GAVE culpa a Gramática em vez de se insurgir contra o "disparate" da TLEBS que domina do básico ao secundário. Não haverá aumento de horas que melhore os resultados a Português, mantendo-se estes programas e esta pedagogia.

Em boa hora, Edviges Ferreira cita Camões. Na verdade, "honesto estudo" e "longa experiência misturado" são "cousas que juntas se acham raramente". Muito raramente...

Professora do Ensino Secundário

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