Indisciplina e autoridade
A indisciplina que se verifica em muitas salas de aula do ensino básico e secundário não pode manter-se e exige medidas urgentes.
O número de aulas perturbadas - ou mesmo não concluídas por razões disciplinares - mereceria um estudo pormenorizado, mas não tenho dúvidas de que é muito elevado. Em muitos casos, os professores perdem tempo com medidas de controlo disciplinar, que vão da simples admoestação a gritos ameaçadores, pedidos de intervenção do director ou faltas punitivas. Os alunos perturbam a aula com conversas intermináveis, insultos ou agressões a colegas, ou recusa em participar em trabalhos de grupo. Esses estudantes são muitas vezes expulsos da sala de aula, mas não aceitam sair, permanecendo entre os colegas numa atitude de desafio. Em escolas mais problemáticas, a violência não é rara e é frequente o recurso à intervenção da polícia, numa clara demonstração de que a escola já não consegue resolver o problema.
Os diversos responsáveis do Ministério da Educação adiam as medidas necessárias. Procuram desdramatizar, ao afirmarem que a violência escolar não tem aumentado (o que é verdade). A questão é que a disciplina mantida é o caldo de cultura em que, muitas vezes, se desenvolve a violência. Os comportamentos disruptivos iniciam-se pela recusa no cumprimento das regras banais da sala de aula, caminham pela violência verbal e pelo absentismo, depois pelas ameaças e agressões a colegas, para terminarem em actos delinquentes na escola.
As causas desta grave situação são diversas. Há uma clara falta de autoridade de pais e professores, vivida em casa e na escola. Na primeira metade do século XX, os professores dispunham de uma autoridade baseada no prestígio e reconhecimento social da sua função. Nos tempos de hoje, muitos professores vivem a massificação da escola e a heterogeneidade dos alunos como sinónimo de perda da sua identidade cultural e social.
A verdade é que a autoridade docente não é um dado à partida, pois tem de ser conquistada através de uma formação adequada que permita ao professor lidar com situações difíceis. Essa formação tem de se manifestar por uma atitude docente que contribua para equilibrar a ânsia de liberdade (tão característica dos jovens de hoje) com um sentido moral que institua a noção de dever tão ausente das nossas aulas. Este equilíbrio entre liberdade e dever, entre independência e obrigação, é a base da autoridade docente, só possível de conseguir através da relação pessoal.
O Ministério da Educação é responsável pelo que roubou à autoridade docente, ao colocar a escola no centro de uma burocracia imensa: só através da devolução aos professores de medidas de controlo disciplinar rápidas e eficazes poderá relevar esta falta. As medidas vindas de fora, contudo, nunca serão suficientes. A indisciplina só diminuirá com o combate ao insucesso e com a adequada resposta da escola aos conflitos que dificultam o seu quotidiano.
É uma prioridade responder à indisciplina através de uma pedagogia exigente, que se preocupe com os estudantes com dificuldades de aprendizagem e não esqueça a necessidade de actuar na formação do seu carácter e da sua consciência moral.
Por motivo de férias, a crónica Porque Sim regressa a 21 de Agosto
Psiquiatra
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