Noruega quer o máximo de pena de prisão para Breivik

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Noruega continua a homenagear as 76 pessoas, muitas delas jovens, mortas na sexta-feira por Breivik FABRIZIO BENSCH/REUTERS

Autor dos atentados pode vir a ser acusado de crimes contraa Humanidade. Advogado descreve personalidade "glaciar" e "paranóica"

Ainda em choque, a Noruega procura reagir aos atentados da última sexta-feira, que fizeram 76 mortos e desfizeram muitas das certezas que o país tinha sobre si próprio. Ontem, as autoridades admitiram que Anders Behring Breivik, o autor confesso dos ataques, pode vir a ser acusado de crimes contra a Humanidade, uma disposição que permitiria aumentar para 30 anos a pena máxima de prisão.

"Matar sistematicamente um grupo de civis é um critério básico" para a aplicação da norma introduzida em 2008 no Código Penal norueguês, disse à Reuters Staale Eskeland, professor de Direito Penal da Universidade de Oslo. Foi isso que Breivik fez em Utoya - a ilha onde decorria um acampamento da juventude do Partido Trabalhista e onde morreram 68 pessoas, na maioria adolescentes - e também em Oslo, onde a explosão de uma bomba destruiu vários edifícios governamentais e matou oito pessoas.

Capturado e levado a tribunal, está para já indiciado de "desestabilização grave das funções essenciais da sociedade" e intenção de "semear o medo entre a população", ao abrigo das leis antiterrorismo e a pena máxima não ultrapassa os 21 anos de prisão. Mas ainda que a pena possa ser estendida por períodos de cinco anos (havendo risco de reincidência ou sendo declarada a insanidade do detido), a possibilidade de ver Breivik sair da prisão antes de completar 60 anos é insuportável para o país em luto.

O procurador Christian Hatlo revelou, por isso, ao jornal Aftenposten que está a ser ponderada a hipótese de o acusar por crimes contra a Humanidade (igualmente passível de prolongamento), ainda que se trate apenas de "uma possibilidade". Mesmo tendo confessado, Breivik é tratado como suspeito, já que a lei norueguesa só prevê que a acusação seja formulada no final do inquérito, adianta a AFP.

E são ainda muito poucas as certezas dos investigadores. Segunda-feira, na audiência à porta fechada, o suspeito disse ser membro de uma organização de "cruzados" para salvar a Europa "da invasão muçulmana", que contaria com "duas células na Noruega e várias no estrangeiro", revelou o seu advogado, Geir Lippestad. "Não podemos excluir que mais alguém esteja envolvido", respondeu o procurador, ainda que as pistas apontem no sentido contrário.

No manifesto de 1500 páginas que colocou online antes dos ataques, Breivik defende: "Se queres alguma coisa feita, fá-la tu próprio". No texto - que é ao mesmo tempo um manual para terroristas e um testamento -, deixou ainda escrito que o exagero é uma forma de confundir os investigadores. "Intuitivamente, quando lemos o manifesto sentimos que ele estava sozinho", disse à Reuters Magnus Ranstorp, director do Centro de Estudos de Ameaças Assimétricas sueco, explicando que os assassinos em massa "actuam normalmente sozinhos".

Louco ou radical?

A confirmar-se a teoria do "lobo solitário", investigadores terão de procurar respostas na mente de Breivik.

Ontem, numa primeira conferência de imprensa, o advogado falou de um homem "provavelmente louco", com uma personalidade "glaciar" e paranóica. "Ele vê-se como um guerreiro, alguém que começou uma guerra e tem orgulho nisso", contou Lippestad, explicando que o suspeito "lamenta [as mortes], mas diz que elas eram necessárias". Ainda assim, o advogado - escolhido pelo próprio Breivik para o representar, provavelmente ignorando que é filiado no Partido Trabalhista - diz não ter ainda decidido se vai alegar insanidade mental.

Esta é uma avaliação que divide alguns dos peritos que já olharam para o seu manifesto. Em declarações à BBC, o psicólogo forense Ian Stephen descreveu o documento como "a coisa mais assustadora" que já leu. "Foi escrito por um homem que é absolutamente meticuloso no desenvolvimento da sua filosofia e investigou tudo, claramente isolado durante um longo período, pesquisando na Internet, lendo livros" para formular um plano "para dominar o mundo, totalmente convertido num modo louco e supercomplicado", comentou.

Para o professor de Psiquiatra Forense na Universidade de Londres Jeremy Coid, por detrás desta capa ideológica esconde-se "uma desordem mental" profunda, ainda que "haja tendência para assumir que os doentes mentais são pessoas caóticas e desorganizadas". Apesar de sublinhar que há ainda muitas incógnitas, o perito ouvido pela BBC avança três diagnósticos possíveis - "psicose paranóide, uma grave personalidade narcisista ou transtorno de personalidade esquizóide".

Já Daniel Zagury, o chefe de serviço do centro psiquiátrico de Bois-de-Bondy e que já foi consultado em processos judiciais em França, garante que Breivik "não é um doente mental". "Não é um assassino em série, que vai matando uma pessoa de cada vez por razões que lhe são obscuras. Trata-se de um assassino em massa que executa um grande número de pessoas num espaço de tempo muito curto", explicou no diário Figaro.

No plano médico-legal, explicou Zagury, "trata-se de uma acção que foi longamente preparada e que tem como base uma ideologia odiosa". "O nível de preparação elimina a hipótese de uma acção exclusivamente delirante". Um homem que para a chefe dos serviços secretos noruegueses seria a pura "encarnação do mal". com Maria João Guimarães

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