Linha ferroviária do Alentejo vigiada todo o dia devido a furtos "atípicos" de cobre

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Furtos têm acontecido sobretudo de noite, mas também em pleno dia HELDER OLINO

Nem os fios de alta tensão escapam aos larápios, o que não é habitual. Empresa responsável pela modernização da ferrovia teve de reforçar número de vigilantes no terreno

Fios eléctricos de cobre usados para electrificação da linha e outros metais estão a ser furtados nas obras de modernização da linha ferroviária de Évora. A empresa a quem está adjudicada a requalificação, a Tecnovia - Sociedade de Empreitadas, já apresentou queixa junto das forças policiais, que está a investigar estes crimes. A empresa de vigilância que foi contratada, desde o início da intervenção, teve de reforçar os efectivos dada a dimensão do problema.

Os furtos têm acontecido sobretudo de noite, mas também em pleno dia, sendo difícil aos vigilantes cobrir os cerca de 37 quilómetros de linha entre Bombel, Vidigal, Casa Branca e Évora.

O gabinete de comunicação da Refer considera estes furtos "atípicos". A Refer adianta que, normalmente, "o que é furtado são os fios eléctricos enterrados no solo, não sendo habitual o que está a acontecer neste caso, com os roubos dos fios de electricidade em alta". Também o comandante da PSP de Évora, intendente Raul Glória Dias, confirmou os assaltos, afirmando que os autores do crime parecem ser os mesmos, tendo em conta as viaturas que utilizam. A ideia de que "possa haver um grupo organizado a actuar em concreto nesta linha", como chegou a afirmar a Refer, não é confirmada pela polícia. "Não posso dizer que temos indivíduos sinalizados, apenas posso garantir que estamos atentos", diz o comandante.

Desde o início das obras, a 14 de Junho de 2010, que a linha está a ser vigiada, mas, devido ao número crescente de delitos, a equipa teve de ser reforçada com mais seguranças nos turnos. Fonte da Refer não quis adiantar os quilos de fios que foram furtados, alegando que até ao momento quem está a ser lesado é a empresa a quem foi adjudicada a empreitada".

O intendente Raul Glória Dias chama a atenção para o "nicho de mercado" que existe e garante que a PSP está a investigar o destino dos metais. "Se há estes roubos é porque há quem o compre, por isso, para além dos autores do crime, há ainda mais pessoas envolvidas", vinca.

Apesar de classificar este cenário como atípico, para a Refer o furto de cobre é "o pão nosso de cada dia", nas palavras de um técnico daquela empresa, confrontado sistematicamente com este tipo de incidentes. A maioria dos roubos incide sobre os cabos das telecomunicações, embora já restem poucos quilómetros de rede com os típicos postes e fios telefónicos a acompanhar a via-férrea. A modernização das telecomunicações tem permitido o enterramento deste tipo de equipamentos, muitos dos quais são substituídos por fibra óptica.

Já as catenárias são mais difíceis de roubar porque existe o risco mortal de electrocussão. Mas quando estas não estão em tensão, por motivo de obras ou outro, tem havido tentativas de furto, alguns com êxito, podendo desaparecer vários quilómetros de catenária numa só noite em qualquer região isolada do país.

A Refer Telecom, empresa afiliada da Refer que tem a seu cargo as telecomunicações ferroviárias, sofre sobretudo com o vandalismo provocado com as tentativas - inúteis - de roubo. Inúteis porque esta empresa, reconhecida pela utilização de tecnologia de ponta, já ultrapassou há muito a era do cobre e usa fibra óptica. Esta não tem grande valor comercial, mas ao procurar cobre os assaltantes destroem equipamentos.

30 milhões em França

Recentemente, na Linha da Beira Alta, perto da Guarda, as paredes de instalações da Refer Telecom foram destruídas à marretada para procurarem no interior equipamentos com cobre. Os prejuízos do vandalismo associado ao roubo de cobre são quase maiores do que os resultantes dos próprio material furtado.

Interferências na sinalização provocam atrasos nos comboios e muitos equipamentos com tecnologias caras ficam destruídos. Para combater o roubo das caixas de impedância (componentes de sinalização) a Refer desenvolveu um projecto de blindagem dessas caixas com umas resinas especiais que tem dado bons resultados. Os furtos diminuíram e esta solução interessou a responsáveis franceses, que são também confrontados com um problema idêntico. A RFF (congénere da Refer em França) estimou em 30 milhões de euros os prejuízos causados pelo roubo de cobre na sua rede, incluindo indemnizações por atrasos de comboios e custos administrativos. E na Holanda os caminhos-de-ferro já chegaram a fazer patrulhamentos da via em helicóptero para evitar roubo de cobre.

Em Portugal o problema é extensivo à CP, que tem visto desaparecerem cablagem e peças em cobre e bronze das suas locomotivas e carruagens. O problema é tão grave que a Refer já escreveu ao Ministério da Administração Interna pedindo maior empenhamento para combater as redes de tráfico de cobre. A Refer não dispõe de dados actualizados sobre os furtos, mas existe a percepção de que estes têm vindo a aumentar, fruto do efeito conjugado da crise e da evolução do preço do cobre nos mercados internacionais. Na Bolsa de Londres, entre Julho do ano passado e Junho deste ano (mercado de futuros), o preço deste produto aumentou 33 por cento.

A modernização da Linha do Alentejo foi adjudicada por 48,4 milhões de euros ao consórcio formado pela Somague, Neopul e Tomás de Oliveira Empreiteiros SA. Deveriam ter decorrido entre Maio de 2010 e Maio deste ano, mas o projecto atrasou-se e a linha só irá reabrir a 23 de Julho.

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