Al-Qaeda confirma que Ayman al-Zawahiri é o comandante e sucessor de Bin Laden
O novo líder, que foi o responsável pela filosofia de "terror global" aplicada pelo grupo, prometeu prosseguir a campanha de vingança contra a América e o mundo ocidental
Ayman al-Zawahiri, o veterano militante e principal estratego da Al-Qaeda, que durante décadas foi o braço direito de Osama bin Laden, assumiu a liderança daquela organização terrorista, confirmou ontem um site islamista intitulado Ansar al-Mujahideen (Os Seguidores dos Guerreiros Sagrados).
"A liderança geral da Al-Qaeda anuncia que, depois de completar um processo de consultas, o xeique dr. Ayman al-Zawahiri, assumiu a responsabilidade pelo comando do grupo", lia-se num comunicado da organização ontem publicado online, e que os serviços secretos americanos consideraram genuíno e credível.
Além da formalização da liderança de Zawahiri, o comunicado replicava a tradicional retórica da Al-Qaeda e a sua promessa de prosseguir a campanha terrorista até à derrota de "todos os infiéis, liderados pela América e o seu fantoche Israel, que atacam as casas do islão". "Encorajamos as pessoas do islão a revoltarem-se e prosseguir a luta, com persistência e devoção, até que todos os regimes corruptos e opressivos impostos pelo Ocidente tenham desaparecido", dizia, prometendo apoio aos muçulmanos que atacam os Estados Unidos no Afeganistão e Iraque e também os que se insurgem no Egipto, Tunísia, Iémen, Síria e Líbia.
A mensagem de vingança e terror sobre a América tinha, aliás, sido veiculada pelo próprio Zawahiri num vídeo difundido há cerca de uma semana. "O xeque [Osama bin Laden] partiu, como um mártir", assinalava, "mas hoje a América não enfrenta apenas um indivíduo ou um grupo, mas sim uma nação em revolta, acordada do seu sono num renascimento jihadista."
Ayman al-Zawahiri, um homem oriundo da classe alta egípcia e médico cirurgião de formação, é considerado pela comunidade de especialistas em terrorismo como o responsável pela "globalização" da mensagem e da actividade da Al-Qaeda e como o "cérebro" por detrás das suas maiores operações internacionais, nomeadamente os atentados de 11 de Setembro de 2001 nos Estados Unidos. Foi ele que introduziu o conceito de "células" afiliadas dispersas por diferentes países e que refinou os métodos de ataque da Al-Qaeda, recrutando um pequeno exército de bombistas suicidas.
Apesar da sua preponderância na definição da "filosofia" da organização, Zawahiri permaneceu sempre na sombra do carismático Osama bin Laden, que conheceu (e tratou) na década de 80, nas grutas do Afeganistão que serviam de esconderijo aos militantes islâmicos em guerra contra as forças soviéticas.
Os documentos apreendidos pelas forças americanas no complexo de Bin Laden no Paquistão, no raide militar que culminou com a sua morte, provaram que o seu papel era mais do que cerimonioso ou ornamental: ele era, de facto, o "mentor" dos militantes da Al-Qaeda e estava, realmente, envolvido na gestão da rede terrorista. E esse será, notam vários especialistas, um dos desafios de Zawahiri, que vai ter de passar a ser o líder que define as prioridades e inspira os seguidores e não simplesmente aquele que oferece a táctica.
Um oficial da Administração americana, ontem citado sob anonimato pela Reuters, notava que "em todo o seu tempo na Al-Qaeda [Zawahiri] nunca demonstrou capacidades de organização e liderança" e que, ao contrário de outros dirigentes da organização, nunca teve nenhuma experiência de combate. "Ele sempre foi um general de sofá", referiu.
Um dos homens mais procurados do mundo (os Estados Unidos oferecem uma recompensa de 25 milhões de dólares por informação que leve à sua prisão), por duas vezes Zawahiri conseguiu escapar in extremis à CIA - escapou à captura, em 2003, e a uma tentativa de assassínio um ano mais tarde. O seu paradeiro permanece um mistério. Crê-se que esteja escondido algures nos territórios tribais na fronteira do Afeganistão com o Paquistão - uma possibilidade que se tornou menos plausível depois da descoberta do esconderijo de Bin Laden em Abbotabad.
Na BBC, o especialista em segurança Frank Gardner explicava que a ascensão de Zawahiri à liderança da Al-Qaeda era mais do que esperada. Mas a demora de seis semanas na oficialização do "facto consumado" tem, para ele, uma outra leitura: a de que o desaparecimento de Bin Laden terá posto a nu as cisões na organização e que o reconhecimento de Zawahiri como o sucessor natural não terá sido unânime.
A sua origem egípcia poderá, especulava, estar na base de algumas desconfianças por parte dos operacionais das células da Arábia Saudita e outros países do Golfo Pérsico, e funcionar em seu desfavor na afirmação de autoridade e na união das diferentes facções árabes.