Não é que os dois filmes tenham verdadeiramente muito a ver um com o outro em termos práticos; "Destino de Sangue" é anterior de quase dois anos à "Árvore da Vida" de Terrence Malick, e só agora, com considerável atraso, chega às nossas salas. Mas aproximá-los é inevitável por uma razão muito simples: o filme do dinamarquês Nicolas Winding Refn é, à imagem do cinema de Terrence Malick, uma experiência sensorial que abdica da maior parte das âncoras habituais do cinema narrativo. É um filme que nos imerge num universo e espera que a força das imagens, mais do que a fragilidade da narrativa (assumidamente mitológica no seu arco básico), transporte o espectador.
Não estamos com isto, atenção, a comparar o resultado; quanto muito, "Destino de Sangue" será o "anti-Malick", porque onde o cinema do americano oferece uma transcendência panteísta que literalmente descola da gravidade terrestre, Refn propõe um mergulho sufocante num brutalismo primitivo feito de lama, sangue e suor, aproximando-o mais do olhar desencantado e entrópico de um Werner Herzog do período Kinski, por exemplo.
O cinema imersivo e poderoso do cineasta dinamarquês, vencedor do prémio de realização em Cannes 2011 com "Drive", revelado com o "punch" brutal de "Pusher" (1996), nem sempre é do melhor gosto mas está sempre a tentar sacudir o espectador da sua complacência perante as convenções; goste-se ou não (e Refn é tipo para dividir as opiniões de modo apaixonado), ninguém lhe fica indiferente. "Destino de Sangue" é exemplar disso: conceptual mais do que linear, o filme trabalha a partir de uma série de convenções do filme de aventuras e do "western spaghetti" que esvazia radicalmente de todas as balizas tradicionais, num realismo cuja estilização é levada à fronteira da mitologia.
A história de um guerreiro zarolho e silencioso que acompanha uma tribo de cruzados cristãos numa viagem à Terra Santa que acaba por levá-los ao Novo Mundo desenrola-se por entre visões fantasmagóricas e um paisagismo transcendente sonorizadas pelo noise ambiental de Peter Schneidermann e Peter Kyed, justificando as comparações às colaborações entre Herzog e Florian Fricke dos Popol Vuh em viagens ao "coração das trevas" como "Aguirre, o Aventureiro" ou "Fitzcarraldo".
Nesse processo, "Destino de Sangue" evolui igualmente para uma metáfora das guerras religiosas que, ao mesmo tempo, invoca toda uma série de questões demiúrgicas sobre a fé e a liderança - se, por exemplo, podemos falar da "Árvore da Vida" como um filme em busca de Deus pelo meio da luz, "Destino de Sangue" seria um filme sobre essa mesma busca num universo de escuridão e sofrimento, onde o lirismo é substituído pelo cepticismo.
Pretensioso, dirão alguns - sim, absolutamente, assumidamente. E é legítimo perguntar onde é que Refn define a fronteira entre o lado confrontacional do seu cinema e a estilização gratuita para onde o filme às vezes tomba. O que não deve, nunca, servir de desculpa para perder uma das experiências sensoriais mais desconcertantes que temos visto.