Primeiro-ministro da Hungria acusado de fazer uma Constituição à sua semelhança
Orbán chama aos críticos internos inimigos da nação. Para a oposição, a catadupa de leis, decretos e projectos serão o "funeral da democracia húngara"
De todas as direcções são disparadas críticas - da oposição, dos intelectuais, das instituições internacionais. A nova Constituição da Hungria é conservadora, discriminatória e fortemente apoiada nos princípios da Igreja Católica. Por exemplo, fala da "Santa Coroa", do "Rei Santo Estêvão" (o padroeiro do país), defende a família tradicional e enfatiza a protecção ao feto. Aos que apontam um dedo acusador ao primeiro-ministro, Viktor Orbán, que fez uma lei fundamental à semelhança dos seus princípios, este responde: não é a mim que insultam, é à própria Hungria.
Um exercício de retórica que faz parte da sua imagem e é a origem da sua popularidade - o seu partido, o Fidesz, obteve uma estrondosa vitória nas legislativas do ano passado, domina dois terços do Parlamento. Em cada discurso, esgrima símbolos nacionalistas e religiosos e posiciona-se como salvador da Hungria.
"Ele junta provérbios e promessas nublosas sobre um futuro longínquo" que visam "envolver o Governo na bandeira húngara", explica à AFP Paul Lendvai, jornalista e escritor austríaco de origem húngara. "Assim, todos os que o criticam ou ao Governo são inimigos da nação".
Gabor Filippov, do Instituto de Análise Progressiva de Budapeste, concorda: "Ele fala a linguagem do povo. O seu discurso advém dos mitos nacionais, da glorificação e da ideia de existir um "destino húngaro"".
A maioria parlamentar permitiu a Orbán ignorar os apelos internos e externos e aprovar a Constituição. A polémica imediata centrou-se no papel que a lei fundamental reserva ao Fidesz depois de terminado o seu mandato governativo, em 2014. Permite que representantes do partido se mantenham à frente das instituições-chave financeiras e económicas.
Mas há outras: num país onde o casamento homossexual e o aborto são legais, abre caminho para o fim do casamento gay e para a penalização do aborto; numa terra de minorias, diferencia os húngaros (a nação) dos que apenas lá nasceram.
Orbán, que já fora primeiro-ministro (1998-2002), quer aproveitar a maioria e acabar a revolução, como costuma dizer. Mas, para a oposição ouvida pela Reuters, a catadupa de leis, decretos e projectos vão ser o "funeral da democracia húngara".
"Ele polariza. Conscientemente, provoca a hostilidade para melhor manobrar os seus apoiantes", disse Anton Pelinka, politólogo na Universidade da Europa Central em Budapeste.
Orbán responde: "Costumavam chamar-me Hitler ou Mussolini, mas agora já me comparam a Vladimir Putin, da Rússia. Deixo que sejam vocês a decidir se isso é ou não um progresso".
A retórica vai fazendo o seu efeito. Uma sondagem recente revelou que 46 por cento da opinião pública húngara está com Viktor Orbán.