Há duas maneiras de olhar, finalmente, para a primeira estreia em salas portuguesas de um filme do tailandês Apichatpong Weerasethakul - e ambas são devastadoras para o estado da exibição portuguesa.
Uma: até que enfim que "Joe" chega às salas, mesmo que numa altura em que todo o embalo da Palma de Ouro de Cannes, há um ano, já se dissipou, em que somos dos últimos países a estrear o filme . Outra: até que enfim que "Joe" chega às salas, depois de dois encontros falhados ("Tropical Malady" e "Syndromes and a Century", que estiveram assegurados para Portugal mas nunca passaram do DVD). Em qualquer caso, é triste perceber que um dos cineastas-chave do moderno cinema de autor - e um que já foi alvo de retrospectiva alargada em Vila do Conde, por exemplo - só tardiamente chega à estreia no grande écrã. Felizmente, fá-lo com aquele que é a melhor porta de entrada para o seu universo singular e formalista: "O Tio Boonmee" é filme sereno e contudo tão conturbado como um rio, sonhador e sábio como só os sonhos mais profundos sabem ser.
História de um adeus à vida que, na peculiar mística meditativa de Weerasethakul, não é tanto um fim mas um relançar da viagem, "O Tio Boonmee" é um fogo de artifício de tranquilidade, oásis zen pontuado de humor quase maroto, que responde na perfeição à intenção do cineasta de fazer um filme "para miúdos". Ou como a infantilidade não pode - nem deve - ser imbecil, porque "O Tio Boonmee..." é pequena e sedutora delícia.