Entrevista a Artur Agostinho: "Hoje explora-se mais o espectáculo do que o saber"

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Foto: Daniel Rocha
Qual a diferença entre Quem Sabe, Sabe e os concursos de hoje?

A grande diferença é que hoje, com raras excepções, não se privilegia a cultura geral, mas sim a sorte, a exposição física, a intimidade. Explora-se mais o espectáculo (há outros meios tecnológicos) do que o saber do concorrente. No que vejo do estrangeiro penso que são mais simples e se preocupam sobretudo com a cultura do concorrente. Faz-me impressão ver aquilo a que as pessoas se sacrificam para ganhar mais uns tostões: raparem o cabelo, comerem vermes, coisas incríveis. Por muito que a mentalidade avance, há coisas que tocam muito no íntimo das pessoas.

O tipo de concorrente é também diferente?

Havia gente culta, aventureiros um pouco inconscientes, mas também pessoas que iam só para ver se ganhavam alguma coisa. Hoje, nos concursos que obedecem ao esquema da pergunta-resposta, aparecem pessoas que sabem, mas também alguns cuja ignorância é de bradar aos céus. Nesse aspecto, as coisas não se modificaram.

Quando se diz que Quem Sabe, Sabe foi um êxito, em que indicadores se baseavam para a avaliação? Não havia sondagens, não é?

Primeiro pela correspondência. Segundo, pelos telefonemas. As pessoas usavam muito o telefone nessa altura. Para elogiar, mas sobretudo para criticar. Calinadas... Todos nós demos calinadas na vida. Agora às vezes dizem-se mais, mas enfim... Lembro-me que uma vez que o Olavo D'Eça Leal, na Emissora Nacional, disse "clorofila" em vez de clorofila. Choveram cartas a exigir a demissão do homem.

Nos concursos fui muitas vezes criticado por pessoas que diziam que eu estava combinado com os concorrentes. Lembro-me de um deles em que os meus pigarreies — estava constipado, na altura — foram tidos por indicações aos concorrentes! Até mais recentemente, no início dos anos 80, chegaram a dizer que, no Noves Fora Nada (de Artur Varatojo), havia um anão colocado por debaixo daquilo para parar a roda.

Foi o apresentador de mais concursos na TV. Quais as qualidades ou características que deve ter um apresentador de concursos?

Acho que deve tentar descontrair o mais possível o concorrente. Acho importante ter uma conversa prévia com ele, para lhe conhecer certas reacções. Há pessoas que reagem mal, outras que reajem bem a uma brincadeira. Aí está outro aspecto em que fui criticado. Às vezes brincava um pouco, dando a sensação de que estava gozar. E não era isso. Procurava por o concorrente à vontade. Penso que não se deve gozar com a ignorância. Outra característica: ser completamente transparente no que se está a fazer. Não deixar dúvidas. Bom, mas penso que não se deve ajudar, embora às vezes o sentimento nos leve a isso... [ver histórias de concursos].

Qual o lugar de Quem Sabe, Sabe no "top" de concursos por si apresentados?

Número um "exaequo" com o Ou Sim, ou Não.

E quanto a concursos em que não participou?

A Visita da Cornélia, por exemplo, foi muito importante. Mas mesmo assim colocava o Quem Sabe, Sabe, na sua qualidade de pioneiro, no pódio, entre os primeiros.

A pergunta não tem nada a ver com o tema, mas não consigo resistir: não volta a fazer desporto, na rádio ou na televisão?

Não, não. Foi um ciclo que se fechou. Temos que saber acabar. Continuo interessado pelo fenómeno desportivo, ainda agora no estúdio onde estava a gravar a telenovela lá estive a ver nos intervalos os Campeonatos Europeus de atletismo, gosto de ciclismo, gosto de natação, gosto de basquetebol, gosto de futebol, mas agora só como espectador.

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