Crise? Melancolia? Não com os Cut Copy

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Quatro australianos que tiveram de mudar de vida Timothy Saccenti

Num curto espaço de tempo a vida mudou para os australianos Cut Copy. Em 2004 estrearam-se com "Bright Like Neon Love", registo que passou algo despercebido, mas quatro anos depois tudo mudou com a aclamação em torno de "In Ghost Colours", disco de canções pop electrónicas contendo características imputáveis a linguagens como o house, 'disco' e rock.

Os três membros tinham ocupações paralelas, mas perceberam que tinham que fazer escolhas. O cantor Dan Whitford, por exemplo, gráfico de formação, um dos proprietários da empresa de design Alter, está agora apenas na música. O mesmo acontecendo com os outros. Nos três últimos anos realizaram inúmeros concertos à volta do mundo. Há três semanas regressaram com "Zonoscope", disco que vão apresentar 2ª feira no Hard-Club do Porto e 4ª no Coliseu de Lisboa. Não estarão arrependidos da opção?

"Nem pensar", ri-se Dan Whitford, "as coisas mudaram muito desde o disco anterior. Tocámos para audiências e em locais que nunca imaginámos ser possível e isso é entusiasmante." Mas também pode ter efeitos nocivos, colocando uma pressão adicional nos ombros do grupo. "É verdade", reconhece, "mas quando começámos este novo álbum tentámos ter um olhar fresco. Não nos deixámos melindrar pela expectativa que possamos ter criado. Não pensámos muito nisso. Tentámos fazer qualquer coisa de novo apenas." 

Influenciados e influentes

Não é qualquer coisa de radicalmente novo o que têm agora para oferecer, mas existem diferenças. A maior é que o novo álbum parece ter sido pensado enquanto tal. Não é mero conjunto de temas. Se nos dois primeiros discos as guitarras e as ideias mais clássicas da canção ainda detinham um papel relevante, aproximando o grupo das formações que se situam entre o rock e a dança electrónica, agora a direcção é mais assumidamente dançante.

"Trabalhámos os temas de forma diferente desta vez", reconhece Dan. "Há muitos mais elementos percussivos. Os sintetizadores também acabam por ter maior predominância e soam distintos. Estão mais orgânicos. As guitarras não desapareceram, são é tocadas de maneira diferente. Em vez de soarem a rock, estão mais diluídas, na linha dos Talking Heads, ou qualquer coisa parecida."

Há três anos, quando falámos pela primeira vez com Dan, este discorria sem complexos acerca das influências, dos Beach Boys aos Pixies, dos Daft Punk aos New Order. Na altura houve muita gente a dizer que essa era a principal brecha do grupo: expor as influências à flor da pele. Anos depois do que se fala é de uma série de bandas que terão sido marcados por eles. Um movimento que Dan encara com naturalidade. "Quando se está no início é natural termos imensas influências. De repente, temos uma guitarra na mão e queremos fazer qualquer coisa na linha do que ouvimos. Mas depois essas coisas superam-se. Haver bandas inspiradas por nós é agradável. É óptimo sentir que temos efeito sobre outras pessoas que estão no início." 

A principal influência no novo registo surgiu dos inúmeros espectáculos ao vivo. Nesse sentido acaba por ser também uma obra que reflecte de maneira fidedigna o que são os concertos, festa contagiante, quatro músicos em palco capazes de expressar uma atitude global exuberante. Em vez de amarguras, sonoridades sombrias e letras sobre os conflitos da passagem à idade adulta, uma atitude de celebração da existência. Algo que Dan reporta ao facto de gostarem de música transcendente, capaz de nos fazer descolar da realidade mais quotidiana, e não ao facto de habitarem na Austrália, como não se cansam de ser confrontados.
"As pessoas pensam que passamos o tempo na praia, mas vivemos em Melbourne, numa das partes mais arrefecidas da Austrália. Não é Verão o ano inteiro. Não é assim tão diferente da Europa. Essa atitude afirmativa que a nossa música transporta acaba por ser um reflexo da música de que gostamos."

O facto de habitarem na Austrália tem vantagens e desvantagens, enumera. Entre as vantagens está o facto de terem uma vida tranquila. "Habito numa zona calma dos subúrbios de Melbourne, com a minha mulher. Nada de vida cliché da estrela rock. Café pela manhã e trabalho em estúdio desde muito cedo." O principal inconveniente é o isolamento, mas já foi pior, graceja. "Há anos era muito duro para uma banda australiana sair daqui. A opção era ir e não voltar. Agora é mais fácil, principalmente por causa da internet. As pessoas à volta do mundo podem ter acesso à nossa música. Mas continua a ser muito caro e penoso viajar para algum lado. É um dia inteiro de viagem." Mas sair vale a pena, afirma, principalmente em momentos como este, quando acabaram de criar um novo disco e estão com ansiedade em mostrá-lo em palco. "Depois de se estar tanto tempo em estúdio é excitante ver as pessoas reagirem à nossa música e apropriarem-se dela, em primeira mão."

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