"Quem não tem poder está mais à vontade para falar" no Clube dos Pensadores
Não fosse o problema de saúde e Alberto João Jardim apresentaria hoje, em Gaia, o livro Blogue Clube dos Pensadores, que hoje é posto à venda. Como é seu apanágio, o presidente do Governo Regional da Madeira não teria papas na língua - Jardim é dos poucos que dizem sempre exactamente o que pensam. Mas, por regra, os políticos têm a língua mais solta quando não estão em lugares de poder, reconhece o mentor do Clube dos Pensadores, um espaço de debate político e reflexão que se reúne há vários anos em Gaia.
"Quem não tem poder está muito mais à vontade para falar: estão mais soltos, mais abertos, falam sobre tudo. Quem está no poder mostra-se mais constrangido", afirma Joaquim Jorge. Mesmo apesar de os debates do Clube terem uma metodologia pouco tradicional: cada convidado fala sobre um tema de base, mas pode ser questionado por qualquer pessoa (chegam a ser 200) da assistência, sobre outro tema. E não há hora para acabar.
Joaquim Jorge diz que o Clube dos Pensadores não é apenas mais uma tertúlia, à boa maneira das que se faziam há um século. E nota-se que os políticos bebem ali algum ensinamento para aplicar na sua acção governativa? "Paulo Portas levou apontamentos sobre o que se estava a passar na educação. Pedro Santana Lopes e Carvalho da Silva também tomaram nota da maior parte das intervenções", recorda Joaquim Jorge. Mas, na sua maioria, "os políticos não sabem ouvir, só sabem falar. Legislam sem ouvir as pessoas e fazem lembrar os senhores feudais, que governam fechados no seu castelo. É o maior anátema da política", critica Joaquim Jorge, num característico estilo contundente, que lhe valeu o epíteto de "agitador nortenho" por Marcelo Rebelo de Sousa.
Pelos 50 debates do clube passaram figuras como Paulo Portas, Marinho e Pinto, Manuel Maria Carrilho, Santana Lopes, Luís Filipe Menezes, Carvalho da Silva, Francisco Louçã, Medina Carreira e, recentemente, para discutir as presidenciais, os candidatos Defensor Moura, Francisco Lopes e Manuel Alegre. Faltam os restantes e na lista dos convidados que Joaquim Jorge gostaria de ter contam-se Teixeira dos Santos, Pinto da Costa e Sócrates.
"Não discutimos só política", realça - é política e coisas piores, a acreditar num dos últimos posts no blogue. "Debater é sempre empreendedor. E em Portugal faz falta uma recolha pacífica de ideias. O problema é que pensar dá trabalho", comenta o organizador. "Os portugueses vivem em piloto automático. Em França os sindicatos revoltaram-se. Não teve consequências? De imediato não, mas Sarkozy pode não ser reeleito. Aqui não: já não tenho assim tanta certeza de que Sócrates vá ser substituído por Passos Coelho. Estamos num estado de coma político."
O livro é um repositório de textos do blogue de Setembro de 2009 a Junho de 2010. "Funciona como uma análise crítica do primeiro ano da legislatura de Sócrates sem maioria absoluta - um castigo dado aos socialistas", diz Joaquim Jorge, que previa, em Outubro de 2009, um primeiro-ministro "mais dialogante e humilde. (...) Esta flexibilidade e aparente abertura jogam a favor dele e do seu Governo."