Governador do Punjab assassinado pelo seu guarda por ser contra a lei da blasfémia

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O Governo decretou três dias de luto nacional por Taseer AAMIR QURESHI/AFP

Era um dos políticos mais importantes do Paquistão. Mas Salman Taseer defendeu alterações a uma lei que criminaliza a blasfémia contra Maomé e os islamistas não gostaram

Gostava de polémica e não evitava criticar o islamismo, e isso terá roubado a vida a Salman Taseer, governador do Punjab, assassinado ontem por um dos seus seguranças.

Taseer estava perto de sua casa, num agitado bairro comercial de Islamabad, quando foi baleado. De acordo com uma testemunha, tinha acabado de sair do seu carro no mercado Kohsar, popular entre ocidentais e paquistaneses com dinheiro, quando um dos guarda-costas disparou sobre si.

"O governador caiu e o homem que disparou contra ele baixou a arma e levantou os dois braços", descreveu Ali Imran à Reuters. Foi levado para o hospital, mas não sobreviveu aos ferimentos.

O ministro paquistanês do Interior, Rehman Malik, não tem dúvidas de que o governador - um dos políticos mais importantes do país - morreu pelas suas posições contra a lei da blasfémia, defendida por vários partidos e organizações religiosas. "O guarda policial que o matou disse que fez isto porque o senhor Taseer defendeu recentemente emendas à lei da blasfémia. Foi isto que disse à polícia depois de se entregar", citam as agências.

Ontem houve manifestações em Lahore, capital do Punjab, contra a sua morte, obrigando o Governo a apelar à calma.

Este foi o crime político mais importante depois da morte da antiga primeira-ministra e líder do Partido Popular do Paquistão (PPP), Benazir Bhutto, assassinada em Dezembro de 2007, de quem Taseer foi aliado e cujo assassínio foi atribuído aos taliban.

A polémica à volta da lei contra a blasfémia foi reacendida em Novembro, depois da condenação à morte de Asia Bibi, camponesa mãe de quatro filhos acusada de ter blasfemado contra o profeta Maomé. Asia Bibi recorreu da sentença, devendo o alto tribunal de Lahore pronunciar-se brevemente sobre o assunto.

Não foi só o governador do Punjab que se revoltou contra o caso (visitou Bibi na prisão), que suscitou reacções acesas de vários países e organizações internacionais e paquistanesas. O Presidente foi pressionado a alterar a lei, que é apesar disso popular num país onde apenas três por cento dos 167 milhões de habitantes não são muçulmanos.

De uma elite para a outra

Salman Taseer iniciou-se na literatura marxista enquanto estudou no Reino Unido. Mas foi um empresário de sucesso - director de consultoria, investidor em telecomunicações, media, seguros e imobiliário - antes de se tornar político e veterano da assembleia do Punjab (Centro do Paquistão), aponta a AFP.

Taseer ocupou a pasta da Indústria no Governo do Presidente Pervez Musharraf, entre 2007 e 2008, sendo depois nomeado governador do Punjab pela coligação do PPP.

A sua relação com antigos líderes políticos não se esgota aqui. Cresceu no meio da elite intelectual do país e foi colega de escola do também ex-primeiro-ministro Nawaz Sharif (líder da Liga Muçulmana do Paquistão, PML-N), que acabou por se tornar no seu principal opositor no Punjab.

Foi também preso político do regime ditatorial do general Zia ul-Haq, que entre finais dos anos 1970 e na década seguinte promoveu a islamização do Paquistão.

O primeiro-ministro, Yusuf Raza Gilani, condenou o assassínio e ordenou um inquérito. Anunciou ainda três dias de luto nacional. O PPP - liderado pelo viúvo de Bhutto, Asif Ali Zardari, próximo de Taseer - prolongará esse período por três semanas.

A sua morte não terá um impacto na gestão política central, refere a Reuters, mas vem agudizar o ambiente de crise política que o país vive (ver caixa). E salientar a falta de segurança nas ruas paquistanesas, onde um político tão popular como Taseer é morto em plena luz do dia.

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