Rendeiro nega ser dono da arte apreendida em sua casa
Obras de arte continuam em casa do ex-gestor e no espaço em Cascais, criado para acolher a Colecção Ellipse mas não podem ser vendidas
O advogado de João Rendeiro, José Miguel Júdice, nega que as obras de arte apreendidas numa busca realizada em meados deste mês na casa do ex-administrador do Banco Privado Português, em Cascais, sejam suas. Recusa-se, contudo, a explicar de quem são as obras e porque estão na residência do seu cliente. "Não é nada com ele", afirmou Júdice ao PÚBLICO, referindo-se ao fundador do Banco Privado Português (BPP). As obras continuam na residência de Rendeiro, no luxuoso condomínio da Quinta Patiño, em Cascais, tendo o Ministério Público nomeado um fiel depositário, responsável pelas obras. A sua movimentação não autorizada e a sua alienação estão proibidas.
No mesmo regime estão as obras da Colecção Ellipse, que também foram apreendidas à ordem do mesmo processo, coordenado pela 9ª secção do Departamento de Investigação e Acção Penal (DIAP) de Lisboa.
Já este ano, o novo presidente da Privado Holding, a única accionista do BPP, assegurou que as cerca de 800 obras da mais importante colecção privada de arte contemporânea em Portugal, não iriam ser vendidas, mantendo-se no Alcoitão (Sintra), no espaço criado em 2006 para a acolher e mostrar ao público. Isto apesar de, numa auditoria, a Delloite ter aconselhado a Privado Holding (PH) a dispersar as obras, assinadas por dezenas dos mais importantes nomes a trabalhar no circuito contemporâneo internacional. "É uma boa colecção. E enquanto colecção merece ser preservada", afirmou em Junho, ao PÚBLICO, Diogo Vaz Guedes, líder da PH.
Sobre o valor das obras apreendidas, o Ministério Público não possui qualquer avaliação. Contudo, a Delloite fez uma avaliação em 2008, certificada pelo crítico e comissário independente português Delfim Sardo, segundo a qual a colecção valeria entre 40 e 45 milhões. Menos de três meses depois, outra avaliação, certificada pela norte-americana Susan Feidel, apontava para os 44,8 milhões. E Vaz Guedes aponta ainda uma avaliação de cerca de 23 milhões.
"Até podemos fazer uma avaliação amanhã que nos diz que a colecção vale 15 [milhões]. Mas mesmo que valha 15 [milhões] vamos mantê-la, pois pode valer 50 daqui a cinco anos. Porque se a vendermos por 15 e ela daqui a cinco anos valer 50, vão acusar-nos de má gestão", dizia então.
José Miguel Júdice, advogado de João Rendeiro, continua a repetir que estranha o facto do seu cliente ainda não ter sido ouvido depois de ter sido constituído arguido em Julho de 2009. Há dias, a directora do DIAP, Maria José Morgado, afirmou ao Diário de Notícias que, desde então, João Rendeiro "nunca solicitou uma nova audição nos autos, nem fez nenhum pedido de interrogatório complementar".
Júdice alega que correm dois processos contra Rendeiro e que, relativamente a um deles, "ainda ninguém lhe perguntou nada". "Ouçam-no, por favor", pede, adiantando que as suas respostas poderão esclarecer as dúvidas e evitar "que o Estado perca tempo e dinheiro com uma investigação que provavelmente não levará a lado nenhum".
A tese do Ministério Público é diferente: os dois processos referidos por Júdice - ele próprio ex-presidente da assembleia geral do BPP - foram fundidos, transformando-se num só. Em investigação estão crimes de branqueamento de capitais associados a fraude fiscal, burla e infidelidade.
Um dos arguidos do caso é um advogado do escritório de Júdice, a PLMJ, que já foi alvo de buscas neste processo.
Após as últimas buscas, que apanharam Rendeiro fora do país, o Ministério Público apreendeu o passaporte do ex-administrador, que está sujeito a termo de identidade e residência no âmbito deste inquérito. Esta medida é vista por alguns como um indício de que os procuradores poderão pedir, em breve, uma alteração da medida de coacção do ex-administrador.
No passado dia 12, a Procuradoria-Geral da República confirmou através de uma nota que, no âmbito da investigação em curso no DIAP de Lisboa e na Unidade Nacional de Combate à Corrupção (UNCC) da PJ, relativa à administração do BPP, se procedeu "a um conjunto de diligências de busca que contaram com a participação de magistrado judicial, magistrados do Ministério Público, inspectores da UNCC da Polícia Judiciária e inspectores tributários da Direcção de Serviços de Investigação da Fraude e de Acções Especiais". Não prestou mais esclarecimentos, explicando que "os inquéritos que integram a referida investigação encontram-se sujeitos a segredo de Justiça". com Paula Torres de Carvalho