Expansão de colonatos judaicos desafia processo de paz patrocinado pelos EUA

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Colonos israelitas ocupam terra palestiniana perto do vale do Jordão JAAFAR ASHTIYEH/AFP

Novas construções fazem parte da estratégia para "salvar o carácter judaico de Israel", diz analista. Palestinianos exigem "o reconhecimento internacional imediato" do seu Estado

A última vez que foi feito um anúncio da construção de casas em colonatos judaicos em território ocupado, o vice-presidente Joe Biden visitava Israel e as relações entre a América e o Estado hebraico sofreram uma crise em consequência do que foi visto como "uma provocação". Dois novos anúncios de mais construção em colonatos surgem agora precisamente quando o primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, visita os Estados Unidos.

Coincidência ou não, o timing do anúncio de 1300 novas casas em Jerusalém Oriental (na segunda-feira) e de 800 no grande colonato de Ariel, na Cisjordânia (ontem), poderá prejudicar o primeiro-ministro de Israel durante a sua viagem.

O Presidente dos EUA, Barack Obama, comentou que "acções como esta nunca são úteis quando se fala de negociações de paz" e um porta-voz norte-americano garantiu que a questão seria abordada pela secretária de Estado dos EUA, Hillary Clinton, no seu encontro de amanhã com Netanyahu. Numa reunião com o primeiro-ministro israelita na segunda-feira à noite, o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, expressou "preocupação" com a iniciativa.

Os anúncios do Ministério do Interior israelita surgem seis semanas após o fim de uma moratória à construção em colonatos judaicos - e foi justamente o fim do congelamento da construção que levou os palestinianos a saírem, como tinham ameaçado, das recém-lançadas negociações com Israel.

"Quando esperávamos que Netanyahu anunciasse um congelamento da colonização, ele envia aos palestinianos e à administração norte-americana uma mensagem clara de que Israel escolhe os colonatos, não a paz", criticou o negociador palestiniano Saeb Erekat. O negociador disse ainda que o "unilateralismo de Israel" pede "o reconhecimento internacional imediato do Estado palestiniano". Para Danny Seidmann, especialista em Jerusalém e crítico dos colonatos, o anúncio "é uma mensagem de que a autocontenção que caracterizou os últimos sete, oito meses [em relação à construção em território ocupado] acabou", disse ao jornal australiano Sydney Morning Herald. Em relação aos EUA, o anúncio pode ser um teste ao Presidente americano. "Toda a gente está a tentar testar os limites de quão longe podem ir."

Coincidência ou não?

Gabriel Sheffer, professor de Ciência Política na Universidade hebraica de Jerusalém, acha que a questão do que sabia Netanyahu é pouco importante. "Ele decide sobre tudo, e a continuação da construção é parte da estratégia e táctica de Israel", disse por telefone ao PÚBLICO. A reacção americana foi para já "contida", opina. Mas, ainda assim, "é muito difícil fazer previsões sobre a acção dos EUA" e o que tudo isto significa para o processo de paz.

Já Carlo Strenger, professor na Universidade de Telavive e colunista do diário Ha"aretz, confessa que não sabe o que pensar. "Só tenho palpites", sublinha. Pode ter sido propositado: "Estes anúncios vêm do Ministério do Interior, controlado pelo Shas, um partido ultra-ortodoxo de direita, que gosta de mostrar que não quer saber o que o mundo pensa." Mas também pode ter sido uma coincidência: "Quantas vezes no Governo se vê que a mão direita não sabe o que a esquerda anda a fazer."

Mas, para o colunista, o que é preocupante é o contexto em que surge o anúncio. "Acho que há um enorme problema em Israel agora", diz. "A opinião pública israelita mudou muito para a direita por causa de alguma confusão: muitas pessoas acham agora que o carácter judaico de Israel está ameaçado, e a consequência é esta crescente afirmação do direito dos judeus construírem em qualquer lado." No entanto, Stenger aponta "uma confusão": esta acção só irá destruir o carácter democrático de Israel. "O único modo de garantir o carácter judaico de Israel por meios democráticos é dar um Estado aos palestinianos", garante. "Mas isso - lamenta - é algo que os políticos parecem não atingir".

Assim, para Stenger, a construção nos colonatos é a última de uma série de medidas nesta linha tomadas por Israel, como a obrigação a um juramento de lealdade ao Estado judaico para obtenção da cidadania ou as leis que dificultam a compra de terra aos árabes israelitas, exemplifica o comentador.

Todas estas políticas têm provocado reacções críticas. O colunista do New York Times Thomas Friedman avisou que os judeus americanos - e os americanos em geral - estão a desligar-se de Israel e no Ha"aretz aparecem artigos de opinião como "Israel precisa de uma revolução de esquerda para parar o fascismo".

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