À descoberta das lampreias de Portugal no Fluviário de Mora
Três grandes painéis com desenhos científicos dão a conhecer estes parentes próximos dos peixes, que passam grande parte da vida enterrados no leito dos rios
Conhece as lampreias de Portugal? Elas estão em perigo? E que estudos têm sido feitos para a sua conservação? Os visitantes do Fluviário de Mora têm à espera estas perguntas numa exposição, inaugurada ontem, e podem encontrar as respostas em três painéis com ilustrações científicas.
Vivem no país três espécies. Uma delas, a lampreia-marinha, é um pitéu para muita gente. As outras duas - a lampreia-de-rio e a lampreia-de-riacho, que não se comem - são as mais raras. Estão classificadas como "criticamente em perigo" de extinção, na última versão do Livro Vermelho dos Vertebrados de Portugal.
Tanto a lampreia-de-rio como a lampreia-de-riacho distribuem-se pela Europa, onde abundam, mas na Península Ibérica só vivem em Portugal, realça o biólogo Pedro Raposo de Almeida, do Centro de Oceanografia da Universidade de Évora e da Faculdade de Ciências de Lisboa. Mais: a lampreia-de-rio está confinada à parte portuguesa da bacia do Tejo, enquanto a sua prima vive desde o Douro até ao Sado. "A dimensão populacional não ultrapassará os dez mil indivíduos para cada espécie", diz o biólogo.
Estes dados resultam de um projecto de investigação, coordenado por Pedro Almeida, que em 2008 foi um dos vencedores do Fundo para a Biodiversidade da EDP. Com os 230 mil euros deste prémio, entre 2009 e este ano, a equipa fez o levantamento exaustivo dos locais onde pudessem ocorrer as duas espécies.
Foram amostrados 500 pontos, e aí as duas espécies foram capturadas e medidas e os locais caracterizados numa série de parâmetros, para identificar as variáveis ambientais responsáveis pela sua presença ou ausência. "Esta informação vai servir para a definição de medidas de gestão e conservação, que vamos fornecer à administração local, regional e central."
Uma das fases em que elas estão muito vulneráveis é aquela em que estão enterradas no leito dos rios, como larvas - na verdade, passam cinco anos nisso, filtrando a água para se alimentarem de organismos em suspensão. Na fase larvar, se o leito for regularizado, se houver extracção de areias ou for construída uma barragem na zona onde estão enterradas, uma parte da população é eliminada.
O ciclo de vida das lampreias, a sua distribuição no país e a investigação feita são aspectos retratados nos painéis da exposição, cada um com dois metros de comprimento, da autoria do biólogo e ilustrador científico Ferrando Correia. "O objectivo da exposição é dar a conhecer a ciência sobre a lampreia a um público juvenil", diz Correia. Lampreias ao vivo, porém, não terá, dado serem tão raras e ameaçadas que não é aconselhável tê-las em cativeiro, explica Pedro Almeida.
Decorridos aqueles anos todos entre os sedimentos, elas sofrem uma metamorfose, em que desenvolvem uma boca circular em forma de ventosa. E então seguem caminhos distintos. A lampreia-de-rio, que pode ter 30 centímetros de comprimento, migra para o mar, onde fica um a dois anos, parasitando o sangue de outros peixes, até que volta ao rio para desovar e morrer. Já a lampreia-de-riacho, com 15 centímetros, não come após a metamorfose. Só se reproduz e morre.
Embora abundem no resto da Europa, elas têm o seu quê especial em Portugal. Estudos da equipa de Pedro Almeida mostram que têm cá mais diversidade genética, o que indica serem mais antigas. Na última glaciação, há 17 mil anos, estas espécies recuaram para o Sul, Península Ibérica incluída. Mais tarde, o Norte da Europa foi recolonizado a partir destas populações, daí a importância das lampreias portuguesas: "Estas populações são pequenas, mas têm um valor ecológico muito grande. Temos a responsabilidade acrescida de as preservar."