Mãe soube da morte da filha em directo

Foto
Concetta ficou petrificada quando soube que a filha estava morta - e a câmara fixou-a em grande plano VINCENZO PINTO/AFP

Mais de três milhões de telespectadores assistiram à reacção da mãe de Sarah Scazzi, de 15 anos, ao ser informada de que a filha desaparecida fora assassinada pelo tio

Milhares de pessoas acompanharam ontem o cortejo fúnebre de Sarah Scazzi, uma adolescente italiana de 15 anos cuja morte foi anunciada em directo na televisão, quando a sua mãe participava num programa de busca de pessoas desaparecidas.

Sarah estava sumida desde 26 de Agosto e a sua mãe, Concetta Serrano, aceitara participar no programa Chi l"ha Visto, transmitido no canal 3 da estação pública RAI, que investiga histórias de pessoas desaparecidas, numa tentativa de obter informação sobre o seu paradeiro. Mal sabia ela o desfecho dramático da emissão.

Cerca de 3,5 milhões de telespectadores assistiam ao programa em directo quando a produção decidiu pôr no ar uma notícia acabada de divulgar pela agência estatal Ansa, confirmando o aparecimento do cadáver da rapariga e a detenção do seu tio, alegadamente responsável pelo crime.

Concetta estava sentada precisamente na sala de jantar da casa do seu cunhado Michele Missere, quando a apresentadora leu o despacho da Ansa. Ficou petrificada - a câmara fixou o seu olhar mortiço em grande plano, enquanto do estúdio chegavam mais informações: o dono da casa estava naquele momento na esquadra da polícia, a prestar declarações.

O programa prosseguiu durante oito minutos, sempre fixado na reacção de Concetta, que permanecia imóvel, incapaz sequer de falar. "Não posso acreditar", balbuciou, "o meu cunhado é inocente." A apresentadora perguntou então se Concetta desejava terminar o programa e ir para casa, ao que ela respondeu "acho que é melhor". Mesmo assim, a emissão continuou mais três minutos, até Concetta sair.

Ontem, ela manteve-se ausente das cerimónias fúnebres, que juntaram mais de dez mil pessoas no estádio municipal de Avetrana, no Sul do país.

"O mais delicado possível"

O caso chocou a Itália e provocou uma onda de protestos, com vários editorialistas a censurarem o comportamento da RAI e a denunciarem o aproveitamento sensacionalista do caso. Paolo Ruffini, que dirige o canal, defendeu a opção editorial dos produtores, dizendo que tinham "tentado reagir a uma situação muito trágica da forma mais delicada possível".

A produção reconheceu que deve ter sido horrível para a mãe de Sarah ser informada da morte da filha em directo na televisão. "Isto não é informação, é uma invasão e uma exploração bárbara da fragilidade e dor de uma pessoa", criticou um espectador no website da estação.

Sarah desapareceu no dia em que tinha combinado encontrar-se com a prima Sabrina na casa do tio Michele. As duas planeavam ir para a praia em Puglia. O tio tornou-se suspeito na semana passada, quando foi entregar o telemóvel queimado da sobrinha à esquadra.

Confrontado pela polícia, o tio confessou que estrangulou Sarah por esta resistir aos seus avanços sexuais. O homem levou as autoridades até ao lugar onde se desfez do cadáver da sobrinha: uma cisterna coberta com pedras, terra e folhagem. Aguardam-se os resultados do exame de ADN para confirmar a identidade da vítima. Perícias já realizadas indicaram que a adolescente não sofreu nenhuma agressão sexual antes da morte.

O caso ainda poderá ter outra reviravolta. O procurador da província de Taranto, Martino Rosati, manifestou dúvidas sobre a confissão de Misseri, pondo em causa a sua "reconstituição nebulosa" dos factos, e encara a hipótese de a autoria do crime ter sido assumida para proteger a filha Sabrina e a mulher Cosima, irmã de Concetta.

Apesar de já ter sido deduzida acusação contra o tio de Sarah, o inquérito prossegue. Misseri está detido em isolamento e, segundo as autoridades, terá manifestado tendências suicidas.

Sugerir correcção