Este Outono/Inverno já é do modelo Luís Borges
É o único modelo português na lista dos melhores do site Models.com e conta com quatro grandes campanhas internacionais nesta estação. Na 35.ª ModaLisboa que hoje começa apresentam-se as propostas dos criadores para o próximo Verão, mas este Outono/Inverno já pertence a Luís Borges
Sair. Da passerelle e rumo às lojas. Das imagens lustrosas das revistas em direcção à rua. De Portugal para o mundo. Este é o grande objectivo da moda portuguesa. Luís Borges conseguiu-o em pouco mais de um ano. A sua imagem saúda os viajantes no exterior do Aeroporto de Lisboa, numa das fotografias da campanha Tommy Hilfiger deste Inverno. Não é criador de moda, é manequim. Desfila nesta 35.ª ModaLisboa.
O criador Felipe Oliveira Baptista, baseado em Paris desde cedo e apoiado pelo Portugal Fashion, internacionalizou-se e agora chega à direcção criativa da Lacoste. Fátima Lopes, Ana Salazar, Luís Buchinho, White Tent, Ricardo Dourado, entre outros, vendem ou estão em vias de vender fora de Portugal. Mas o percurso é sempre duro, a concorrência muita e a afirmação difícil. Com os modelos, a história é outra, sobretudo no campo masculino. A imprensa estrangeira que visita a ModaLisboa elogia-os, os directores de casting também. Nesta edição da ModaLisboa participam 35 manequins masculinos e 45 femininos. Entre as mulheres, sobretudo, há um grande número de estrangeiras.
A história de Luís Borges tem elementos típicos: considerava-se um patinho feio, usava óculos, teve de ser convencido pela irmã a participar num concurso de modelos. E atípicos: em menos de um ano de carreira fez os principais desfiles de moda masculina em Paris e Milão e este Outono/Inverno conta com quatro campanhas internacionais de grandes marcas nas ruas e nas revistas. Tommy Hilfiger, Etro, Paul Smith, Benetton. Já desfilou para a Dior Homme, Yves Saint Laurent, Hermés, Iceberg, Costume National, Custo Barcelona. Continua a ficar nervoso antes de cada desfile. Nas duas últimas edições da ModaLisboa fez quase o pleno dos masculinos e mistos. O cabelo no ar e o corpo esguio dão-lhe uma imagem forte e exportável. Luís Borges tem, sem dúvida, uma figura cosmopolita.
É quase demasiado dedicado ao que chama "arte", a moda, porque quando está em Milão, Nova Iorque ou Paris em trabalho acaba por se focar sobretudo nos castings e na sua preparação e pouco se envolve com as cidades que o recebem. No fundo, são as passerelles que o acolhem.
Um look único
"O Luís, além de ter uma personalidade fantástica, o que ajuda muito na relação com os clientes ao ser um bom relações públicas de si próprio, tem um look único", explica o seu booker, que lhe agenda trabalhos e o aconselha, Mário Oliveira, da Central Models. "É um branco afro." Luís Borges, com sangue cabo-verdiano e sueco, é modelo a tempo inteiro há pouco mais de um ano, depois de ter sido semifinalista do Elite Model Look em 2007 e de ter chegado à Central em Março de 2008. Para trás ficava o trabalho num gabinete de contabilidade em Castelo Branco. E os complexos. "Nessa altura achava-me um patinho feio. Usava óculos redondos, era muito magrinho e usava-se o estilo... armário [musculado]", diz ao P2 sentado na sala da Central Models.
Fala pausadamente, mas sem medir as palavras. Sorri com sarcasmo perante o que considera ser o tipicamente português de se dar mais valor ao que é nosso só depois de ter sido validado fora. Luís Borges estreou-se na ModaLisboa há um ano - "é o único evento de moda em Portugal para nos mostrarmos" -, mas antes disso diz que os castings não lhe foram favoráveis na passerelle lisboeta. Só depois da ida para Paris, onde desfilou em nome da Dior Homme ou da Yves Saint Laurent (cujas calças-balão com que desfilou lhe ficaram numa lista de desejos mental), é que ganhou fôlego também em Portugal. "Fui a Paris provar que sabia desfilar."
O manequim sente que começou lá fora. "É importante este lado internacional porque em Portugal não há mercado." Hoje está no caminho de outros colegas portugueses - os gémeos Kevin e Jonathan Sampaio (Central), Armando Cabral (Wilhelmina) ou Ana Sofia (Elite) são alguns dos mais recentes exemplos - que se integram nas campanhas mais cobiçadas e nas revistas mais luxuosas (Luís fez editoriais para a Interview e para a GQ Japão), o que lhes traz mais reconhecimento do grande público, e nos calendários de desfiles internacionais, que lhes dão maior estatuto no sector. Mas são sobretudo os homens a vingar na moda estrangeira. "Há uma vontade maior dos nossos homens do que das mulheres, para quem sair é mais complicado pelos estudos, pelos pais... E a altura é um factor. A altura mínima para fazer carreira na passerelle é de 1,77/8 m", arrisca Mário Oliveira, acrescentando que a mulher portuguesa é mais baixa. "Mas elas já estão a arriscar mais", defende Luís.
Moda pop
Isto de a moda se ter transformado numa coisa de cultura popular, de estar na TV em concursos e reality shows, nas revistas cor-de-rosa, nas listas de certo e errado dos blogues, na imagem de Lady Gaga, agrada-lhe. Mas continua a achar que há mitos da moda: viver sem comer, a vida num eterno spa, o glamour das festas, o fascínio das viagens. "É preciso ser humilde, saber ouvir nãos. Lá fora, sozinhos, sem amigos, é um vazio ouvir nãos. Não é uma profissão assim tão fácil, é um trabalho e temos de nos levantar cedo. Nada de chegar atrasados, apresentarmo-nos bem, sermos responsáveis perante os clientes", explica.
Não está isenta de pressões, a vida de modelo. Aos 22 anos confessa não ter assim muitos cuidados de beleza e manutenção, fora a paixão pela roupa. Mas faz "umas exfoliações" e usa uns cremes de vez em quando porque, suspira sorridente perante a concorrência sempre mais jovem, "há miúdos de 16 anos a chegar". Gosta dos desfiles, por "sentir o calor do público", e da fotografia de moda, onde se consegue "transformar". A música é o que o faz relaxar nas esperas entre desfiles ou fotografias e agora é a ironicamente intitulada Beautiful Monster, de Ne-Yo, que anda no seu leitor mp3.
Luís Borges "adora moda, entrega-se ao trabalho, está sempre muito informado. É um peixe na água", garante o seu booker. "Compro tudo", diz o manequim sobre a sua colecção de revistas. "Faz parte do trabalho de casa, aprende-se muito." No futuro, quer manter-se ligado à indústria e tanto gosta de agências de modelos que passa bastante tempo nos escritórios da Central, na Avenida da Liberdade. "Estou focado a 100 por cento", diz o número 37 do ranking do site de referência Models.com.
Depois de amanhã não sabe ainda o que vai acontecer-lhe. Espera a confirmação para nova campanha mundial, ainda envolta em segredo. Uma certeza: dentro de meses, depois de feita mais uma ronda de trabalhos, virá uma mudança de imagem.