Queiroz diz que Deco devia pedir desculpas aos portugueses por se ter apresentado "em forma miserável"
"Uma das piores coisas que existem no futebol e na vida de um treinador e de uma equipa é quando nos cruzamos com um ex-jogador em actividade profissional de carácter duvidoso", disse à agência Lusa Carlos Queiroz, reagindo às declarações de Deco numa entrevista publicada na sexta-feira no jornal "Record", na qual o jogador o acusa de ser "uma pessoa falsa".
Para Carlos Queiroz, as opiniões de Deco a respeito do seu carácter, "sobretudo quando as compara com o anterior selecionador", [Luiz Felipe Scolari], são, para si, "um elogio" e considera que o jogador "devia preocupar-se, em primeiro lugar e por honestidade intelectual, em dar uma resposta aos adeptos do Fluminense", seu actual clube.
O ex-seleccionador, que se encontra no Brasil há mais de uma semana, sustenta que "é perante esses adeptos" que devia assumir a sua responsabilidade profissional: "Isto para evitar o que oiço dizer no dia a dia por parte deles em relação ao seu rendimento, tendo em atenção o salário que aqui veio desfrutar".
Virando a agulha para os adeptos portugueses, Carlos Queiroz, entende que Deco também deveria pedir-lhes desculpa por "se ter apresentado no estágio da selecção nacional numa forma miserável", não estando "à altura das responsabilidades de um campeonato do mundo e do jogador que foi".
Apesar de Deco ter dito que "não queria bater em mortos", numa referência ao ex-seleccionador, acusou Queiroz de ter querido mandá-lo embora do estágio durante o Mundial da África do Sul, intenção que não foi avante porque os responsáveis da FPF não o terão permitido, depois de o médio ter questionado as opções tácticas do treinador no jogo com a Costa do Marfim.
"É curioso que saiba tanto sobre o que se passou, sem estar presente e sem ter participado em qualquer decisão, mas talvez os adeptos e alguma imprensa percebam agora de onde surgiram as intrigas em torno do seleccionador nacional", observou Queiroz, para quem Deco "procurou desculpar-se da exibição comprometedora" que realizou frente à Costa do Marfim, a qual "o treinador do Benfica classificou de forma apropriada", referindo-se à afirmação proferida então por Jorge Jesus: "Deco anda a gasóleo".
O anterior seleccionador aludiu ainda a uma "lesão conveniente" contraída pelo médio antes do jogo com o Brasil, acrescentando: "Se pensava que tinha lugar garantido por se chamar Deco, enganou-se rotundamente. Desejo-lhe felicidades, sobretudo ao Fluminense".
Problemas no Mundial podiam ter sido evitados "se Amândio de Carvalho tivesse agido"Carlos Queiroz considera que os problemas que surgiram no Mundial 2010 "poderiam ter sido evitados se o chefe da delegação [Amândio de Carvalho] tivesse agido em conformidade" depois das declarações de Deco.
"Não deveria ter sido o selecionador nacional a considerar os efeitos disciplinares e efectivos da conduta inaceitável de Deco, comprometendo o ambiente da selecção com as declarações que fez a seguir ao jogo com a Costa do Marfim", argumentou Queiroz.
O ex-seleccionador diz que, apesar da "gravidade" dessas declarações, "vindas de um jogador com a idade e experiência de Deco", recorda "não ter visto o senhor Amândio de Carvalho [vice-presidente da federação] indignado com aquelas ou tão pouco preocupado em participar ao Conselho de Disciplina [CD] da FPF ou em agir quando estiveram em causa os interesses da selecção".
Lembra que "houve muita pressa em apresentarem uma queixa junto do CD" em relação a uma entrevista sua ao semanário Expresso, mas constata que "ainda não houve tempo para aplicarem a multa pecuniária que o presidente da FPF, Gilberto Madail, e o chefe da delegação determinaram para o jogador Deco".
"Se o tivessem feito na devida altura, a opinião pública e alguma imprensa teriam tirado conclusões bem diferentes daquelas que eu tenho vindo a suportar", referiu o ex-seleccionador, manifestando-se curioso em observar "qual vai ser o tempo que medeia entre a sanção disciplinar" que lhe vai ser aplicada e a "elevada sanção pecuniária que a FPF determinou para Deco", esperando que não o façam "depois de serem pagos os últimos prémios do Mundial".
Carlos Queiroz diz também que o ex-presidente da FPF João Rodrigues sabe "das intrigas que foram montadas e estruturadas" à sua volta. "Disseram-lhe que eu o corri do hotel onde a selecção estava hospedada no Mundial, apesar de ele saber que tinha a minha casa pessoal na África do Sul e familiares meus à sua disposição para tudo o que ele precisasse para o congresso da FIFA".
Alega que João Rodrigues "preferiu calar-se sobre quem realmente o expulsou do hotel" e que algumas dessas intrigas "conduziram ao desgaste" do ex-seleccionador.
"O ex-presidente da FPF sabe bem que as pessoas que o correram do hotel do estágio da selecção são as mesmas com quem ele agora anda de mão dada, alguns dos quais o acusaram, há alguns anos, de ter desviado 100 mil contos das contas que não apresentou na FIFA", rematou, numa alusão ao Mundial de sub-20 de 1991, realizado em Portugal.
Queiroz, entretanto substituído por Paulo Bento, foi despedido pela Federação Portuguesa de Futebol na sequência da suspensão de seis meses imposta pela Autoridade Antidopagem de Portugal, sob a acusação de ter perturbado uma acção de controlo à selecção no estágio da Covilhã, antes do Mundial 2010, depois de ter sido ilibado pelo Conselho de Disciplina da FPF.