Igreja não foi suficientemente vigilante com pedofilia, diz o Papa
No voo que o levou de Roma para Edimburgo, Bento XVI fez uma crítica pública à atitude da hierarquia católica nos casos de abusos sexuais
O Papa Bento XVI criticou ontem a hierarquia da Igreja Católica por não ter estado suficientemente vigilante em relação aos casos de abusos e violência sexuais durante várias décadas. Na viagem para o Reino Unido, onde permanece até domingo, o Papa repetiu o que já fizera no voo que o trouxe a Portugal, em Maio, mas desta vez com uma crítica à atitude dos responsáveis católicos.
"A autoridade da Igreja não foi suficientemente vigilante", afirmou o Papa aos jornalistas, durante o voo que o levou de Roma para Edimburgo, na Escócia. "A Igreja não foi suficientemente rápida e firme a tomar as medidas necessárias", acrescentou, pedindo "uma pena justa" para os culpados destes casos.
As declarações do Papa surgem também num momento em que mais um conjunto de abusos foi divulgado. Na semana passada, os bispos católicos da Bélgica divulgaram um relatório onde são registados cerca de 500 casos.
No avião, de acordo com a Reuters, o Papa manifestou-se chocado com o que considerou uma "perversão" do sacerdócio católico. "Estas revelações foram um choque para mim, uma grande tristeza. É difícil entender como é que esta perversão do sacerdócio ministerial foi possível." E a insuficiente vigilância dos responsáveis também foi motivo de grande tristeza, acrescentou.
As declarações do Papa não são, no entanto, suficientes, no entender da SNAP, rede norte-americana de vítimas de abusos por parte de padres. "É desonesto dizer que a autoridade da Igreja foi lenta e que lhe faltou vigilância" perante os actos de pedofilia do clero, afirmou Joelle Casteix, da SNAP. "Pelo contrário, ela foi rápida e vigilante, mas para esconder e não para prevenir estes horrores."
Num comunicado, citado pela AFP, a responsável acrescenta: "Os bispos do mundo inteiro continuam deliberadamente a escolher o segredo e a mentira em detrimento da segurança [das crianças] e da honestidade nos casos de pedofilia."
A publicação de um relatório na Irlanda, em Novembro do ano passado, revelando centenas de casos de menores abusados por padres, provocou a mais grave crise dos últimos anos na Igreja. Depois da Irlanda, foram divulgados casos na Alemanha e, na semana passada, na Bélgica, além de continuarem a resolver-se casos diversos nos Estados Unidos, conhecidos nos últimos anos.
Para o Papa, que escreveu uma carta aos bispos irlandeses, onde também os admoestava pela atitude negligente, há "três coisas importantes" a fazer: "o compromisso em favor das vítimas graças à ajuda psicológica e espiritual"; a necessidade de "dar às pessoas culpadas a pena justa"; e a "prevenção na escolha dos futuros padres".
Na viagem que o trouxe de Roma a Lisboa, Bento XVI afirmara que a "maior perseguição à Igreja" não vem de "inimigos de fora, mas nasce do pecado da Igreja". E acrescentara que a Igreja tem uma "profunda necessidade" de "aprender o perdão e a necessidade da justiça".