Grandes vinhos tem o Dão

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Do Dão saem vinhos com grande potencial, consideram os especialistas ADRIANO MIRANDA

Iguais aos melhores e mais bem pagos do mundo, diz que sabe a propósito do enorme potencial dos vinhos do Dão. A par do reconhecimento das qualidades dos tourigas, também os brancos e a sua capacidade de envelhecimento estão agora na linha da frente, como constatou José Augusto Moreira

Há vinhos que são como os monumentos e deveriam fazer parte da história vitícola do país. É claro que não estamos a falar desta ou daquela garrafa, de uma qualquer colheita em particular, mas antes de um perfil, um estilo de fazer vinhos, que lhes confere qualidades e características que são a sua marca identitária. Falamos do Dão e de vinhos com uma extraordinária capacidade de evolução e envelhecimento, capaz de os tornar idênticos aos melhores e mais conceituados de todo o mundo.

Isto mesmo foi afirmado por Charles Metcalfe, um senhor do universo do vinho que sabe bem do que fala, opinião corroborada por Paul White, o australiano que é uma espécie de globetrotter da vinha e analisa e classifica o que se faz em todas as regiões de todos os continentes. Estiveram há duas semanas no Dão, na companhia de outros importantes críticos e fazedores de opinião de outros países ligados ao sector, numa jornada que nos dias finais juntou também jornalistas portugueses.

Chamaram-lhe os promotores Dão: The Next Big Thing, uma expressão que diz bem do potencial em que acreditam para a região e do espírito com que encaram o futuro. A iniciativa foi coordenada pelo irreverente e irrequieto João Tavares de Pina e juntou duas dezenas dos mais representativos produtores da região - mas estranhamente não se viu ou sentiu o rasto das estruturas e autoridades oficiais do sector, que são, afinal, quem tem a incumbência de promover e afirmar os vinho do Dão.

Depois de um périplo de visitas e provas pela região, a jornada envolvendo já os jornalistas portugueses concentrou-se numa prova no Solar do Vinho do Dão, onde os produtores Casa de Mouraz, Quinta do Perdigão, Quinta da Vegia, Quinta do Cerrado, Vinha Paz e Vinícola de Nelas colocaram três dos seus vinhos. Um excelente exemplo do universo do Dão e da diversidade de oferta que tanto compreende o complexo e prometedor Touriga Nacional 2006 da casa Perdigão, como do Status branco da Vinícola de Nelas, um surpreendente vinho de entrada de Gama (a rondar os dois euros), com um atractivo perfil fresco e floral, passando pelos biológicos da pioneira Casa de Mouraz.

O ponto alto da iniciativa foi a prova com harmonização gastronómica, que contou com diferentes vinhos de oito produtores aos quais se associaram algumas das relíquias históricas do Centro de Estudos Vinícolas (CEV), uma espécie de legado do extraordinário trabalho de pesquisa ali desenvolvido sob a liderança do saudoso Alberto Vilhena e verdadeiro repositório do enorme potencial da região.

Além de vinhos únicos e absolutamente extraordinários, o evento foi também de descoberta de cozinheiro de elevado gabarito. De seu nome Rodion Birca, que, a par de uma cozinha segura, consistente e criativa, apresentou pratos com base nas mais profundas tradições gastronómicas beirãs e capazes de fazer "vergar" mesmo o mais feroz dos puritanos.

No confronto, ou emparelhamento, se preferirem, entre brancos, começou-se com o Primus 2007 e o Quinta das Maias Verdelho 2007, o primeiro a prometer bem mais do que aquilo que já mostra, em contraste com a fina frescura do Verdelho. Uma das agradáveis surpresas veio do Casa de Darei Grande Escolha 2007, que, apesar da diferença de perfis, em nada desmereceu o Encruzado Quinta dos Carvalhais 1998.

Encerraram o ciclo os brancos do CEV de 1992, 1980 e 1971. "Iguais aos melhores do mundo", exclamou Metcalf, referindo-se ao estilo dos clássicos brancos do Dão, que caracterizou como austeros em jovens e que aos 10 anos mostram um enorme potencial de evolução. "Não os deixem morrer, por favor", disse ainda, a propósito do debate que se gerou em torno das dificuldades em colocar no mercado estes vinhos de áspera juventude e a tendência de os tornar mais frutados e macios para atrair o consumidor. O ideal seria mesmo, como ironizou Metclafe, educar os consumidores, explicando-lhes que os devem guardar 10 anos antes de abrirem as garrafas.

Nos tintos, a discussão saltou logo à primeira dupla com o Touriga Nacional Quinta Fonte do Ouro 2008 e o Quinta da Bica Reserva 2005. Dois perfis contrastantes para diferentes objectivos de mercado. Ou seja, a diferença entre o mercado e o gosto, entre vinhos modernos e tecnológicos e vinho de perfil tradicional, como certeiramente disse Nuno Cancela de Abreu, criador do primeiro. A conclusão é que, à medida que envelhecem, os típicos vinhos do Dão tornam-se elegantes, delicados e aromáticos, assemelhando-se grandes Pinot da Borgonha, como lembrou Paul White.

A par dos vinhos para o negócio, aqueles que vão ao encontro do mercado, "tentem fazer pequenos lotes ao estilo tradicional e vendam-nos mais tarde a preços loucos. A ver...", atirou Metclafe. Uma ideia que retomaria já no final do repasto, quando foi servido o Touriga Nacional de 1963 da CEV, que alguns já classificaram como um dos vinhos do século XX. "Um monumento", exclamou o conceituado crítico, acrescentando algumas mensagens. "É um vinho de que têm que ficar orgulhosos, mas têm que ficar ainda mais orgulhosos se conseguirem vender vinhos com este perfil". E lá voltou a ideia dos preços loucos: "É um vinho com 50 anos. Um privilégio. Tem que estar acessível só aos verdadeiros amantes do vinho. Guardem-no para momentos especiais, para amantes especiais".

Antes já também todos tinham estado de acordo na exaltação das extraordinárias qualidades do Quinta da Falorca Garrafeira 2003 - um vinho que faz jus ao velho conceito de garrafeira juntando tourigas de vários anos - e do Terras de Tavares Reserva 2003, que é o espelho do estilo, rústico, austero e tenaz de Tavares de Pina e que promete ainda reforçar as alegrias com o andar do tempo.

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