Paquistão receia catástrofe sanitária
Unicef calcula que piores cheias dos últimos 80 anos tenham afectado 3,2 milhões de pessoas. Programa Alimentar diz que é preciso dar de comer a 1,8 milhões
O Paquistão teme uma catástrofe sanitária devido às piores inundações dos últimos 80 anos, que já mataram perto de 1.500 pessoas e afectaram mais de três milhões. As autoridades lançaram um novo alerta de cheias na região de Peshawar, no Noroeste, e o Governo deve reunir-se hoje de urgência para avaliar os estragos e acelerar as operações de socorro.
As autoridades alertaram ontem as populações que residem nas imediações da barragem de Warsak, a terceira maior do país, para a eventualidade de terem de abandonar as suas casas. "Se for preciso, será feita uma evacuação forçada", disse Adnan Khan, do serviço de gestão de catástrofes da província de Khyber Pakhtunkwa, citado pelo Guardian.
"Fornecer água potável e ajuda sanitária é a prioridade absoluta se quisermos evitar uma catástrofe sanitária", preveniu Ateeb Siddiqui, director de operações do Crescente Vermelho paquistanês, citado pela AFP. Fadela Chaïb, porta-voz da Organização Mundial de Saúde, afastou o cenário de uma epidemia, pelo menos no imediato, mas disse que há "centenas de pessoas feridas que aguardam tratamento". "É uma verdadeira catástrofe", referiu o coordenador da ajuda humanitária da ONU ao Paquistão, Martin Ogwanja.
Um balanço da Unicef, Fundo das Nações Unidas para a Infância, calculava ontem em "cerca de 3,2 milhões [o número de] pessoas afectadas pelas inundações, 1,4 milhões das quais crianças". As Nações Unidas consideram que um milhão de pessoas precisa de ajuda de emergência devido aos deslizamentos de terras e inundações, as maiores desde 1929.
O Programa Alimentar Mundial reviu em alta as suas estimativas e calcula agora em 1,8 milhões o número de pessoas necessitadas de comida contra os 700 mil adiantados inicialmente. O número de desalojados está quantificado em perto de um milhão.
Críticas a Zardari
As organizações humanitárias que pretendem socorrer os sinistrados deparam-se com dificuldades de acesso, devido à destruição de estradas e pontes. O Governo deslocou socorristas do Exército para as zonas mais afectadas, mas a limitação da resposta das autoridades está a motivar desagrado e críticas e a permitir um maior protagonismo de organizações islâmicas nas operações de auxílio. "Zardari devia vir cá e tomar medidas, em vez de se ir divertir em França e no Reino Unido", disse à AFP, na aldeia de Majuky Faqirabad, Sher Khan, de 40 anos. Zardari, em visita a Londres, foi igualmente criticado por deputados britânicos de origem paquistanesa, que questionaram a sua deslocação numa altura tão delicada. "Não vou encontrar o Presidente porque penso que, quando há uma situação de urgência, o lugar de um chefe de Estado é no seu país", disse lorde Nazir Ahmed, um dos que recusaram um convite para almoçar com Zardari.
No terreno, o descontentamento nota-se também na distribuição de alimentos, com acusações de favorecimento de familiares e amigos. "Vim para aqui às cinco da manhã. Pedi e esforcei-me, mas não consegui nada. Eles deram [ajuda] aos deles", disse à Reuters Bistma Bibi, de 65 anos, que perdeu dois netos nas cheias. Um repórter da agência viu populares atacarem um camião com mantimentos na cidade de Charssada, antes de serem repelidos pela polícia com bastões.
A União Europeia anunciou 30 milhões de euros de auxílio. A embaixada norte-americana avançou com dez milhões de dólares de emergência e a Casa Branca anunciou já ontem o envio de 300 mil refeições e equipamento, como pontes prefabricadas e unidades de tratamento de água. A China anunciou dez milhões de yuan (cerca de 1,48 milhões de dólares). Muito pouco, face às necessidades, como referiu Amir Khan Hoti, ministro-chefe de Khyber Pakhtunkwa, que agradeceu a ajuda, mas disse que "devia ser maior, por os estragos e as perdas serem tão elevados".
O regresso da chuva ao Norte e o alargamento das cheias ao Sul aumentavam ontem as preocupações. Os serviços meteorológicos previam precipitação nos próximos dias nas províncias de Sindh, no Sul, Pundjab, no Norte, no Cachemira paquistanês, bem como em regiões do Nordeste e do Sudoeste do Baluchistão. Eram também esperadas inundações em algumas áreas da já fustigada província de Khyber Pakhtunkhwa e nos estados do Pundjab e do Baluchistão, enquanto em Islamabad se aguardavam fortes tempestades.