Al-Qaeda perde um dos fundadores mas o seu lugar não ficará vago muito tempo
Organização anunciou a morte de Said al-Masri, chefe das operações no Afeganistão. Terá sido morto num ataque de aviões americanos não-tripulados nas regiões tribais paquistanesas
Era um dos fundadores da Al-Qaeda e um dos homens de maior confiança de Osama bin Laden. A morte de Said al-Masri, há duas semanas no Paquistão, foi anunciada pela propaganda do grupo e a Casa Branca disse que o seu desaparecimento será um "golpe duro incontestável" para a organização - talvez o maior infligido desde o início da presidência de Barack Obama. Mas os analistas avisam que a rede terrorista mantém intacta a capacidade de actuação e será rápida a preencher o lugar deixado vago.
"A sua morte será apenas uma maldição sobre a vida dos infiéis", avisou a Al-Shahab (o braço de comunicação da Al-Qaeda) num comunicado captado segunda-feira à noite pelo SITE, instituto norte-americano que monitoriza fóruns islamistas. Segundo o Washington Post, a informação circulava há dias "entre os círculos extremistas", mas o Paquistão e os EUA optaram pela prudência depois de, em 2008, terem anunciado a sua morte antes de ele reaparecer num vídeo da organização.
Ontem, porém, um responsável americano disse que "há fortes razões para acreditar que Said al-Masri foi morto recentemente nas áreas tribais". E um chefe da segurança paquistanesa disse à Reuters que ele terá sido morto num ataque dos aviões não-pilotados da CIA contra uma aldeia do Waziristão do Norte, na noite de 21 de Maio. "Na altura soubemos que um árabe tinha sido morto com alguns membros da sua família", recordou. A Al-Shahab não explicou as circunstâncias da morte de Masri, dizendo apenas que também a mulher, três filhas e uma neta foram mortas.
Desde a tomada de posse de Obama, a CIA reforçou o uso dos drones, numa estratégia para mostrar que as regiões tribais já não são o refúgio a que a Al-Qaeda se habituou, apesar do elevado risco que as missões têm para a população local (Islamabad fala num milhar de mortos só desde 2008).
A morte de Masri é, por isso, um importante trunfo para Washington."Ele era o principal chefe operacional do grupo, envolvido em tudo, desde as finanças ao planeamento de operações, e era também o principal canal de acesso a Bin Laden e Ayman al-Zawahri" garantiu o dirigente americano, explicando que o egípcio, de 55 anos, era amplamente reconhecido como "número três" da organização.
Um sucesso que os analistas não põem em causa. Admitem que será difícil a Al-Qaeda encontrar alguém com a sua experiência - Masri passou três décadas em grupos extremistas e esteve com Bin Laden desde a guerra do Afeganistão - e sem ele pode ser mais difícil angariar e distribuir os fundos de que a organização precisa.
"Mas a rede parece estar a atravessar uma mudança geracional, com operacionais mais novos a substituir" os que foram capturados ou mortos, explicou à Reuters o jornalista paquistanês Rahimullah Yusufzai, notando que até agora não se assistiu a "uma diminuição do seu empenho". E um responsável das secretas ocidentais garantiu à AFP que, mais do que um operacional, Masri "era um histórico" da Al-Qaeda, pelo que o triunfo da CIA é sobretudo "simbólico".
Três décadas de jihad
É longo o currículo jihadista de Masri, cujo nome verdadeiro era Mustafa Abu al-Yazid. Ainda na juventude, aderiu aos movimentos islamistas em que militava já Zawahiri. Os dois foram presos na repressão que se seguiu ao assassinato do Presidente Anwar al-Sadat, em 1981, e ambos se juntaram depois aos mujahedin que combatiam as tropas soviéticas no Afeganistão, na génese do que viria a ser a Al-Qaeda.
Masri seguiu Bin Laden no exílio no Sudão, gerindo dali os negócios do saudita, e regressou com ele ao Afeganistão, em 1996. Segundo o FBI, foi ele quem transferiu os fundos para Mohammed Atta e os outros operacionais que, na manhã de 11 de Setembro de 2001, lançaram os aviões contra o Pentágono e o World Trade Center. Sabe-se, contudo, que não terá concordado com a iniciativa, por recear a retaliação americana.
Mas a sua fidelidade manteve-se intacta e, em 2007, Bin Laden escolheu-o para chefe de operações no Afeganistão. Não tinha a experiência militar dos antecessores, mas gozava de boas relações com os taliban. Desde então, surgiu várias vezes em vídeos da Al-Qaeda, multiplicando ameaças contra os países que via envolvidos "na cruzada contra o Islão". Uma retórica que contrastava com a sua personalidade "amigável", recordou Yasser al-Sirri, director do Observatório Islâmico. "Quem o visse, não acreditaria que era um militante. Era uma pessoa mesmo muito calma", contou à AFP.