Sem eles, estamos perdidos
Nesta década, um dos grandes desafios para a ficção é o telemóvel - ajuda nuns contextos, mas prejudica noutros. Na sitcom, tira a surpresa; no drama, diminui os longos suspenses da era das cabines. E se toda uma série, em plena idade das ligações, se baseasse na ausência de contexto, no segredo, no corte? E se ela nos desse três FF: Flannery O"Connor, frango frito e fãs? E o que fazer se a nossa filha se casar no dia do final televisivo mais aguardado dos últimos anos?
Todos os homens (e mulheres) são uma ilha nesta ilha que é Perdidos. É uma série sobre grupos de pessoas ligados a uma ilha misteriosa onde se mistura o imaginário Robinson Crusoé com o de Stephen Hawking. Os protagonistas não partilham segredos, não vêem os episódios para saber o que dos outros nos foi dito pelos flashbacks, forwards e sideways (sim, flashsideways). E hoje é o seu fim.
Alguns de nós, espectadores, estão muito preocupados. Mesmo depois de termos lido Flannery O"Connor a conselho da personagem Jacob, de termos apreciado o amor de outra personagem pelo frango frito ou ainda de nos assumirmos como fãs. Do que somos fãs? De uma série maravilhosamente complexa e paradoxal: baseia-se numa bolha fora dos tempos modernos e só é o que é através dos recursos dos tempos modernos (leia-se a interacção na Web).
Um grupo de aparentes desconhecidos entre si sobrevive numa ilha após a queda do seu avião. Já lá estão desde 2004. Ao longo destes seis anos, mais de cem horas e outras tantas de extras de DVD e conteúdos paralelos, dificilmente podemos dizer qual é o tema de Perdidos. "Esta série tem tanto investido no seu final. A sua única razão de existência em seis anos é provocar-nos e levar-nos até um certo tipo de solução", resume Robert Thompson, director do Centro Bleier de Televisão e Cultura Popular da Universidade de Syracuse.
Podemos dizer quem está do lado de quem, que há grupos, que há desígnios. Quais? Bom, é ver as próximas duas horas e meia de série, mais duas horas de recapitulação e, nos EUA e na ABC, um Jimmy Kimmel especial com o elenco a seguir ao final de The End, passe a redundância. Em Portugal, passa às 05h00 no primeiro directo de uma série a partir dos EUA no Fox do Meo, em que também está disponível o final no VideoClube nos próximos sete dias. Ou então no Fox a 1 de Junho. A RTP1 passa a penúltima temporada aos sábados.
Fora da série, também se forjaram alianças. Perfeitos desconhecidos trocam impressões sobre um livro de Stephen King e uma pista sobre o panóptico de Jeremy Bentham. Longas conversas intercontinentais aproximaram gente de idades e origens díspares cujas vidas se cruzaram por causa da queda ficcional de um avião numa ilha algures no Pacífico Sul (apostamos em Tonga e no Triângulo das Bermudas desde o início, mas quem está a apontar tais minudências?). Falemos, mero exemplo, de um entrevistado regular e de uma jornalista que ainda não se conhecem pessoalmente depois de tantas conversas sobre cultura popular, a vida, a América, livros, filmes e TV. "Sinais dos tempos", diz-nos ele.
David Lavery foi ouvido em 2006 para um artigo da Time que se propunha a enunciar "Por que é que o futuro da televisão é Perdidos". Vivia em Londres, leccionando na Universidade de Brunel e já tinha escrito Unlocking the Meaning of Lost. Na altura despontavam em Portugal as séries da terceira era dourada da TV americana que nos espantavam. Dexter, Perdidos, Donas de Casa Desesperadas, Prison Break, Sob Escuta, 24...
Lavery via toda a sua televisão made in America em diferentes suportes. "Assim que desligar esta chamada, vou ver oPerdidos de ontem à noite. Desde que a Sky comprou a série, só temos de esperar até domingo. E o 24 tem só uma semana de diferença", contava-nos na altura, a propósito de um texto para o Ípsilon. O resto apanhava no iTunes e só Os Sopranos lhe escapavam - "A minha filha está a copiá-los em casa e vai enviá-los pelo correio a cada duas semanas."
O dilemaQuatro anos e muitas conversas mais tarde, já a viver e a leccionar no Tennessee, a mesma filha, Sarah, vai casar-se. Este domingo. Ao fim do dia. O problema foi discutido em família. É que hoje também se vive o acontecimento televisivo do ano, postula a imprensa americana, com 30 segundos de publicidade nos intervalos das cinco horas e meia de programação especial a custar 725 mil euros (só suplantado em valores pelas tabelas praticadas nos Óscares e no Superbowl). "Não seria capaz de o dizer à minha mulher, mas como vai ser escrito em português, posso ser citado: a importância do casamento da minha filha não é comparável com a do final de Perdidos - mas está lá muito perto!", ria-se Lavery, 60 anos, ao telefone depois de ultrapassadas as perguntas sobre as vidas de cada lado da linha telefónica.
A solução vai ser ver em diferido - e para Sarah vai ser ainda pior, porque parte imediatamente para lua-de-mel. Pior porque também é fanática da série - mas está em paz com as suas prioridades. Perdidos foi um dos primeiros êxitos watercooler da ABC numa década - traduzindo para português, é daquelas séries que juntam as pessoas a trocar ideias ao pé da máquina do café do emprego ou no seu equivalente virtual. Nos fóruns da Lostpedia ou no oficial The Fuselage. Trocam-se dúvidas. Eternas dúvidas.
Como dizia a misteriosa Mulher do episódio que os canais Fox exibiram na semana passada, "cada pergunta a que eu responda apenas levará a novas perguntas". É um piscar de olho aos fãs de Perdidos e simultaneamente um dos seus truques mais típicos - como um videojogo que nunca acaba, como uma criança na idade dos porquês, como um epistemólogo com distúrbio obsessivo-compulsivo, como um daqueles truques de magia em que os lenços coloridos não param de sair do chapéu (pedimos desculpa pela sofreguidão da enunciação, a culpa é da iminência do fim), só nos traz mais perguntas.
"Não me lembro de alguma vez ter estado tão ansioso por um episódio final de uma série", diz-nos Robert Thompson. E ele já viu umas quantas - nomeadamente, escreveu o livro Television"s Second Golden Age. Para Thompson, nunca é demais frisar como tudo, tudo está em jogo naquilo que se vai passar esta noite. Especialmente porque os próprios criadores admitem que umas 15 horas desta viagem foram... mazinhas. Não é uma série perfeita.
"Nunca uma série adiou tanto as suas respostas. Esta não é a melhor série alguma vez feita neste país - mas é definitivamente a série mais complexa, em termos de narrativa, de sempre", garante. "Claro que há outros exemplos: Twin Peaks, Ficheiros Secretos, a ultima temporada de Praia da China, que se movia entre quatro décadas diferentes. Mas nada se aproxima da complexidade narrativa de Perdidos. E o facto de não ter sido feita num canal de cabo, mas num generalista é significativo."
Romance modernoNão haja dúvidas: há aqui uma história de amor com Perdidos, um romance moderno à laYeah Yeah Yeahs, em que o tempo desaparece, pára quem quiser e em que nada dura para sempre. O contacto mais recente com Thompson, a troca de pistas e ideias com Lavery, tudo mimetiza o que se passa com milhões de outras pessoas mais ou menos empenhadas, de anónimos a Stephen King, George Lucas ou Marilyn Manson. Uma imensa minoria de espectadores (caiu para uma média de 11 milhões de espectadores nos EUA) à luz de gigantes como CSI, House ou Investigação Criminal. Mas ainda assim um culto de massas - pelos temas, pelos seguidores. "Nem sempre o culto é uma questão de número", lembra Lavery.
O professor universitário, que entretanto já co-assinou mais um livro sobre Perdidos, admite ficar emocionado ao pensar no dia de hoje. Há o casamento da filha, sim. Mas ele refere-se mesmo a Perdidos, tal como o crítico da Time James Poniewozick assume ter ficado de olhos enevoados na reportagem durante as filmagens do último episódio. Lavery está a rever os mais de cem episódios que ficaram para trás ("Quero saber quase tudo sobre Perdidos, mas acho que estou nas ligas amadoras") e usa a série como exemplo para convencer os seus alunos de Literatura Inglesa da actualidade dos clássicos. "Este semestre ensinei Édipo e estava a tentar explicar o conceito de ironia dramática. Sugeri-lhes que vissem Perdidos - deve ser a versão mais épica da ironia dramática!"
Do lado de cá desta página, a solução para a terrível percepção da iminência do fim (da série) foi o prolongamento da experiência de cada episódio com a leitura do maior número possível de recapitulações de qualidade ou de comédia (altamente recomendáveis para relativizar tudo isto), cada podcast relevante e notas inúteis em caderninhos ou envelopes rasgados. E muitas buscas na Lostpedia.
E o prazer dos livros, claro, porque, como nos recorda Thompson, esta série transcendeu a televisão não só porque está na Web, mas também porque alguns de nós andaram a reler Flannery O"Connor ou Steinbeck ou Carroll ou a Odisseia - que surgem na série, que parecem relevantes para a dita e que fazem Lavery regozijar-se porque estudou Ulisses e a Bíblia e sabe que o episódio 3:16 tem tudo a ver com isso.
E voltando a este lado da página, houve incursões pelo desconhecido com, por exemplo, Thomas Mann e um noutras circunstâncias intocado José e Seus Irmãos. Porque se há um Jacob nesta temporada de temática tão bíblica, também tem de haver um Esaú. E que um monstro de fumo nos engula se isto não será útil nas derradeiras horas de Perdidos. Ou não... Ah, a dúvida. Deveríamos ter ido pelo lado Caim e Abel?
(Abrimos parêntesis para dizer que os criadores explicam que o baptismo de personagens e os livros que saltam de uma qualquer escotilha ou tenda improvisada na praia são tributos às suas influências, aos produtos culturais que engoliram. "Mencionar apenas um livro influente na série seria injusto, mas em termos temáticos estamos sempre a voltar a Alice no País das Maravilhas", admite Lindelof ao Los Angeles Times. Cuse considera Flannery O"Connor a sua maior influência pelos temas religiosos e violência acutilante que perpassam Perdidos e em que a escritora sulista era mestra. E, claro, a Bíblia.
Um molho de arquétipos que muitas vezes parece um molho de brócolos e que nos faz mandar os caderninhos com notas às malvas, mas cuja intenção maior é pôr-nos a pensar. Se quisermos apenas afundar-nos no sofá, também pode ser. Perdidos não discrimina. Sugere. Fim de parêntesis.)
Seis anos de relaçãoMas talvez seja Thompson quem melhor espelha esta relação tumultuosa dos fãs com esta série especial, ao mesmo tempo que nos garante que o espaço pedido nesta revista junto dos editores é justificado, e que simultaneamente nos diz que é normal ter abandonado ou questionado Perdidos nestes seis anos - o que em nada diminui a sua relevância. "Esta série exige uma atenção extraordinária, requer entrar numa relação com ela. Praticamente tínhamos de comprar-lhe flores e levá-la a jantar", ri-se. Também está a rever a série toda. "Tal como quando acabei Moby Dick, que reli para ver como as peças se encaixavam."
Porquê? Ele explica o "seu" namoro: "É uma relação disfuncional, amo-a terrivelmente no início, depois frustra-me ao ponto de querer mandar algo à televisão, a meio prometo acabar com aquilo e nunca mais a ver e depois, claro, como um cachorrinho, volto a pedir-lhe que volte a amar-me. O que o Perdidos consegue fazer, e que Twin Peaks não conseguiu, é dar-nos um daqueles episódios de fazer cair o queixo e... voltamos a bordo de corpo e alma. É a série com que não conseguimos acabar - provoca-nos constantemente e depois dá-nos algo que nos obriga a ficar com ela."
Mas tudo isto é demasiado pessoal, irrita-se o prezado leitor (muito prezado, que nestes tempos de crise dos velhos media, e com gente como o guru Mike Walsh a dizer que "um jornal é uma mão-cheia de árvores mortas", não se deve arriscar enervá-lo sem motivo). Sim, mas também é global. Há milhões de leitores, de jogadores, de investigadores ou, e sem qualquer desprimor, meros espectadores em torno desta série. A tal que levou ao limite a noção de jogo, a provocação.
Tudo culpa do "génio de Carlton Cuse e Damon Lindelof", a dupla de responsáveis pela série desde meados da primeira temporada, diz Lavery. Deste lado do Atlântico, isto parece-nos um mash-up de guloseimas da cultura pop do século XX, empacotadas e enviadas em attachment para a audiência televisiva do século XXI. As personagens com nomes evocativos (Locke, Hume, Rousseau, Shephard, Lapidus), uma "infecção", momentos Shyamalan "Eu vejo gente morta" e os elementos tipicamente coleccionáveis, essenciais numa mitologia (seja ela à moda de Indiana Jones, Tolkien, Os Cinco, Joseph Campbell ou Fox Mulder): os símbolos, que surgem sorrateiramente em revistas de moda ou noutras séries como prova da sua penetração cultural, os números, os livros, os coelhos e os espelhos recorrentes, a ideia de um mapa, de uma caça ao tesouro.
E sim, você que não viu Perdidos sabe o que é Perdidos. Para o bem e para o mal. A Fox Portugal disse à Pública, sem avançar números, que as audiências no país são diferentes das do resto da Europa - "a série nunca teve um consumo maciço. Esta aproximação à emissão americana ajudou a subir os resultados, embora Perdidos não esteja no top 3 das mais vistas do canal. Ainda assim, a massa de seguidores é fiel e muito estável".
Uma coisa culturalParalelo com os EUA, onde a série passa num canal generalista às terças em horário nobre: "Não há 300 milhões de pessoas a ver Perdidos. Mas há certos fenómenos culturais, que acontecem de tanto em tanto tempo, cuja penetração cultural e importância excedem em muito o seu público - Perdidos é um deles. A sua penetração cultural, especialmente nas últimas semanas, é enorme - as pessoas falam disso, os pivots de telejornal mencionam-no", relata Robert Thompson.
Exemplo: o site do Discovery Channel aborda a possibilidade de o satélite Galaxy 15, afectado em Abril por uma tempestade solar e em estado pouco recomendável a vaguear no espaço, interferir este fim-de-semana com o funcionamento de outros satélites. O título da notícia: "Satélite pode interromper o final de Perdidos". Este "é um daqueles momentos de cultura popular que costumávamos ter a toda a hora, antes da era de fragmentação do cabo, do satélite e da Internet."
Um momento que faz alguém interromper uma conversa de espectadores de Perdidos (que sim, estão frenéticos, confusos e sempre a falar em código binário aos ouvidos de leigos) e lançar a sacramental e seminal questão: "Mas eles não sabiam como iam acabar isto, pois não? Estão a inventar", para enfado dos mais acríticos, daqueles que põem o "fã" em "fanático" (e não revelaremos se algum dos intervenientes neste texto pertence a esta digna categoria). Versão oficial: os criadores dizem que sabiam o que era a cena final desde 2004, mas que os acontecimentos que lá desaguam obviamente foram sendo construídos ao longo dos anos.
E esta é uma série que transcendeu a televisão, repetimos. "A Fox, a determinada altura [meados dos anos 1990], foi tão estúpida que processou toda a gente que tinha um site a falar dos Ficheiros Secretos. Os canais podem ser muito densos nestas coisas", recuperamos da conversa com Lavery nos idos de 2006. E agora, o que mudou?
Tudo. Em 2004, o MySpace era "o" fenómeno e o Second Life o local onde a abertura de uma agência de publicidade virtual era notícia. Quando em Novembro de 2004 esse núcleo de cultura pop que é Times Square exibia anúncios gigantes de Perdidos e Donas de Casa Desesperadas, as prateleiras de DVD de séries nas lojas ainda eram diminutas. E "as duas coisas que não se podia fazer em 2004 na TV eram programas serializados e ficção científica", recorda Bryan Burk, produtor executivo de Perdidos, na Time. O streaming ainda não era o que é hoje, a pirataria começava a voltar-se para a TV e esperávamos. As séries chegavam tarde, nos canais abertos ou de cabo. Meses depois. Em Portugal, o canal Fox tinha um ano de vida e a RTP esperaria até estrear Perdidos.
Hoje, no átrio da era da Cultura de Convergência de Henry Jenkins (que prevê que novos e velhos media se integrem, sobretudo ao nível do hardware), o Second Life parece tão ultrapassado quanto um Tamagotchi e Perdidos passa na Fox uma semana depois de ser exibida nos EUA e está no VideoClube do Meo 24 horas depois. A retrospectiva de meros seis anos e as mudanças que eles trouxeram provam como já não estamos no Kansas - nem sequer no Havai. A evolução tecnológica (o HD, a TDT) não influenciou o acto de ver televisão - foi a atitude dos espectadores, que partilham, criticam, fazem pausa na TV em directo, diz-nos Mike Walsh em Futuretainment. Isso mudou a televisão.
A importância da NetA Internet permite toda uma outra actualização dos conteúdos made in America e "desde os anos 1980 que os dramas americanos não dominavam o mundo desta maneira. A sua criação foi uma resposta ao domínio europeu de formatos como Quem Quer Ser Milionário ou X-Factor", acrescenta Peter Bazalgette, antigo director criativo da Endemol ao Independent.
No ano passado, FlashForward foi vendida (não oficialmente) pela ABC como "o novo Perdidos" e estreitou ainda mais o intervalo das séries que nos chegam dos EUA. Mas Heróis e FlashForward, canceladas na semana passada, são também exemplos de como o legado de Perdidos não será visível tão cedo.
É preciso que as séries sejam boas e inteligentes, avisa Lavery. E "a televisão mudou muito. O que vende hoje: procedurals policiais episódicos", suspira Lavery - coisas rentáveis no mercado de syndication (repetição), cheios de episódios independentes entre si. "Será difícil vender Perdidos assim, e neste mercado...", atenta Lavery, que aposta mais na sua influência nos futuros criadores, tornando-se o Twin Peaks inspirador de outra geração.
Robert Thompson mistura a intriga com o contexto audiovisual para pensar na herança de Perdidos. "A forma como acabar vai ter um grande impacto na forma como a série permanecerá na consciência pública. É muito difícil julgar esta série antes de ver o fim. Com Seinfeld ou Friends não interessava muito o que acontecia nos últimos episódios." Se correr bem, abrirá as mentes dos futuros programadores. Se não...
Cuse e Lindelof também não fogem ao tema, numa das muitas entrevistas antes de emudecerem a partir de hoje. E pensam em cifrões. "É o fim de uma era. A paisagem mediática mudou de forma dramática desde que estamos a fazer esta série. Esta é a série mais cara do mundo. E, nesta paisagem mediática, é incrivelmente difícil capitalizar algo como Perdidos capitalizou. Temos um ambiente mediático fracturado (...) e menores recursos para cada série, por isso sentimo-nos um pouco os ferreiros na era da Internet." O episódio-piloto custou perto de dez milhões de euros, há quase 500 pessoas envolvidas, um elenco principal multirracial, viagens, película, HD...
"Três [Perdidos, 24 e Heróis] das cinco ou seis séries dramáticas norte-americanas mais emblemáticas estão a acabar e não é claro o que as vai substituir, porque o investimento [no sector] caiu qualquer coisa como metade ou um terço", firma Peter Bazalgette.
O Independent previa na semana passada que a partir de hoje "a Internet ficará um pouco mais silenciosa e que as conversas junto à máquina do café do emprego de todo o mundo serão um pouco afectadas". A ideia base está certa - Perdidos ocupou muita largura de banda. A sua importância é palpável na Web: escolha-se um qualquer site com crítica e recapitulação de episódios, do Chicago Tribune ao AV Club. Compare-se o número de comentários. É qualquer coisa como Anatomia de Grey 20 - Perdidos 1200.
Mas quem pensa que tudo isto acaba hoje engana-se. Nas próximas semanas há muito para discutir. Sobre um final que pode ser falhado (por favor não), incompleto (aposta mais segura e que os próprios deixam antever, convidando-nos a "interpretar") ou tão perfeito que a catapulte para os anais da história (altamente improvável, mas Cuse e Lindelof definem-se como "espectadores com controlo" e, por isso, enquanto há fandom/culto há esperança). Thompson, Lavery e esta página têm medo, muito medo. Agora é esperar que a noite caia, que a madrugada se levante e que um ecrã, alimentado por uma qualquer fonte mítica (com ou sem brilho dourado e conotações freudianas), forneça o capítulo final. Por enquanto, em tributo a David Chase e em contraciclo (figas, figas) com o final de Perdidos, fade to black.