Portugal com bom acesso a opióides para tratar a dor
Numa lista de 41 países europeus, Portugal surge em quarto lugar no consumo de morfina (derivado do ópio) no tratamento da dor, a seguir a Áustria, Dinamarca e França, revela um estudo publicado na revista científica Annals of Oncology. Dois especialistas nacionais consideram que esta é uma boa notícia, mas um deles afirma que é preciso avaliar se está a haver uma prescrição adequada.
"O alívio da dor é considerado como um direito do doente", escrevem os quatro autores do estudo da Sociedade Europeia de Oncologia Médica e Associação Europeia para os Cuidados Paliativos, que vai ser publicado na edição de Março da publicação. Mas ainda há muitas barreiras no acesso a analgésicos opióides, conclui a investigação que estuda as barreiras legais e a acessibilidade a estas substâncias (derivadas do ópio, como a codeína e a metadona) no tratamento da dor em doentes com cancro.
Os dados, recolhidos em 2007 e 2008, dão conta de um bom acesso na maior parte dos países da Europa Ocidental, estando muitos dos problemas de acesso na zona oriental da Europa, que neste estudo inclui países como a Rússia, a Ucrânia, a Geórgia e a Turquia.
Tal como em Portugal, em muitos países a prescrição de opióides exige uma receita especial em duplicado ou triplicado, mas nalguns deles o acesso ao documento é difícil (Bulgária, Moldávia e Macedónia) e noutros os médicos precisam mesmo de as comprar (Letónia, Estónia e Dinamarca).
No caso português, o quarto lugar no consumo da morfina "é uma boa notícia", afirma Jorge Espírito Santo, presidente do Colégio da Especialidade de Oncologia Médica da Ordem dos Médicos - sinal de que "houve uma evolução na forma como os médicos encaram a dor e o seu manejo. Aqui há dez anos não havia muita sensibilidade para o alívio da dor".
Espírito Santo refere que há muito que a OMS recomenda que "se liberte a morfina da sua conotação de droga de dependência". Muito do seu uso é resultado de "uma rede razoável de tratamento da dor", sublinhando que em regra é feita ao nível hospitalar para o fim a que se destina - alívio da dor crónica e terminal.
João Oliveira, director do Serviço de Oncologia Médica do Instituto Português de Oncologia de Lisboa, diz que o quarto lugar de Portugal é, à partida, um bom indicador, mas sublinha que nada diz sobre se está a ser bem prescrita. "É fácil aceder a morfina e opióides em hospitais e não tenho garantia que estejam a ser bem usados", por isso pensa que seria necessária "auditar a sua prescrição".
"Durante muito tempo pecámos por prescrever pouco", diz o médico, esperando que não se tenha passado para uma situação "em que se prescreva com demasiada ligeireza e para outros fins", dando o exemplo do seu uso não para aliviar a dor mas "para sedar ou acalmar doentes oncológicos".