A mão de Sarkozy está a manipular a justiça contra Villepin... ou são tudo intrigas?

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Villepin voltará a ser julgado, apresentando-se como vítima de perseguição política CHARLES PLATIAU/Reuters

Dominique de Villepin voltará a ser julgado no processo Clearstream, porque o Ministério Público pediu recurso, um dia depois de ser conhecida a sentença

Quando Nicolas Sarkozy disse que não ia recorrer da sentença que na quinta-feira ilibou o seu rival político Dominique de Villepin no caso Clearstream, os media franceses consideraram as suas declarações uma gaffe: como ele era parte civil no processo, não poderia recorrer, apenas teria direito a indemnizações, se Villepin fosse condenado. Mas ontem, quando o procurador de Paris anunciou que ia recorrer da sentença, por parte do Ministério Público, arrastando para novo julgamento o ex-primeiro-ministro francês e possível rival de Sarkozy nas presidenciais de 2012, a gaffe já não era vista como tal: falava-se num "truque", numa "manobra política" do Presidente para o fazer parecer magnânimo mas continuar a perseguir o seu arqui-inimigo.

"Não creio, nem por um segundo, que Sarkozy, advogado de profissão e rodeado por uma armada de conselheiros jurídicos, possa ter cometido tal erro de Direito", disse ao Libération Dominique Barella, ex-membro do Conselho Superior da Magistratura. "É uma manobra tão grosseira... Anunciou ontem [quinta-feira] que não pediria recurso - quando não o poderia fazer, insisto - para fazer pensar que não havia encarniçamento. E, como por acaso, 24 horas depois, o procurador pede recurso."

O procurador de Paris, Jean-Claude Marin, tinha pedido uma pena de 18 meses de prisão e 45 mil euros de multa para Villepin - por "cumplicidade de denúncia caluniosa por abstenção". É um crime de nome complicado para um caso confuso, relativo a uma falsa lista de personalidades que teriam contas em bancos estrangeiros, para receber dinheiro de negócios corruptos, entre as quais estava Sarkozy. A lista foi dada a conhecer a Villepin por um dos outros quatro réus (dois condenados a penas de prisão) e este lançou várias investigações, apesar de logo a primeira ter revelado que era falsa.

Em causa estava o bom nome de Sarkozy, rival político de Villepin na sucessão de Jacques Chirac, o anterior Presidente da República. Villepin continua próximo de Chirac, Sarkozy afastou-se dele e conquistou a liderança da direita e a presidência da República. E jurou vingar-se do autor da lista e da sua divulgação - pendurar "o responsável de um gancho de talhante" foi a frase que usou.

Jean-Claude Marin confessou à rádio Europe 1 estar "surpreendido" com a decisão do tribunal. Ainda não se fez justiça", afirmou, dizendo não ter "necessidade de receber instruções seja de quem for para pedir recurso". A "decisão foi minha", martelou. "Pedi a condenação de Villepin por convicção."

Villepin entrincheira-se no papel da vítima de perseguição política: "O Presidente prefere perseverar no seu ódio do que ser o garante das instituições". O novo julgamento deverá começar em 2011, e durar até 2012 - ano das eleições presidenciais, influindo directamente nas eleições.

Mas a decisão do procurador está a causar incomodidade mesmo entre os magistrados. "O que é grave é que ninguém acreditará que Marin agiu livre e espontaneamente", comentou ao Le Figaro Philippe Bilger, do Ministério Público, que considera este recurso "uma imprudência judicial para o futuro".

"É deprimente, porque é a imagem da justiça que fica feita em estilhaços. É preciso cortar os laços entre os tribunais e os poder político", comentou Christophe Régnard, presidente da União Sindical dos Magistrados.

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