O Benfica não foi o único a beneficiar dos dinheiros camarários no âmbito da construção dos estádios do Euro. O Sporting também recebeu apoios, nomeadamente verbas relativas a futuros lucros provenientes da construção de prédios em terrenos camarários. Tal como no caso do Benfica, as casas continuam por fazer, mas o dinheiro transitou há muito para as mãos do clube. “O município de Lisboa (...) concedeu apoios que se consubstanciaram na compra e doação de imóveis e equipamentos, considerados avultados, que se traduziram num desequilíbrio a favor dos clubes”, descreve uma auditoria do Tribunal de Contas de 2005. Até este ano, os financiamentos somavam perto de 60 milhões de euros, dos quais 50 tinham sido entregues ao clube “encarnado”. Os restantes dez milhões foram para Alvalade. A isto há ainda que somar as autorizações de construção em grande escala dadas ao Sporting, em terrenos em redor do estádio, um processo que a autarquia só agora está a terminar. Fora deste pacote de apoios, os “leões” beneficiaram ainda do facto de a Empresa Pública de Urbanização de Lisboa ter abandonado em 2003 a sua sede no Lumiar, de que era proprietária, para se mudar para o edifício Visconde de Alvalade, do Sporting, que lhe custava 700 mil euros por ano - isto é, dois mil euros dia. Ficou por lá seis anos. Ontem o assessor de imprensa do Sporting não quis comentar estes factos. Ana Henriques
Comissão criada pela Câmara de Lisboa nunca fiscalizou contrato com o Benfica
Isso mesmo resulta do relatório final que a Polícia Judiciária enviou para o Ministério Público, com as conclusões do inquérito que teve origem numa denúncia do vereador José Sá Fernandes, precisamente em Novembro de 2006. Nessa altura, Sá Fernandes acusava o então presidente da autarquia, Carmona Rodrigues -um dos arguidos no processo - de ter entregue ao Benfica 8,1 milhões de euros sem autorização do Executivo e da Assembleia Municipal (AM).
Em causa estava uma das cláusulas do contrato-programa que previa que a câmara, através da Empresa Pública de Urbanização de Lisboa (EPUL), assegurasse “a construção dos ramais de ligações às infra-estruturas de subsolo para o novo estádio, bem como a fiscalização e consultoria da obra”.
Em 2002, antes da assinatura do contrato, Pedro Santana Lopes, então presidente da autarquia, disse na AM que o clube tinha pedido cinco milhões de euros para a realização desses trabalhos. Mas Santana preferiu ficar com o encargo e explicou ter tomado essa opção porque contava que a despesa ficasse por menos de um quinto aos cofres do município.
Em Fevereiro de 2003, Carmona Rodrigues, então vice-presidente da câmara, enviou um fax à EPUL com a minuta do contrato de execução que viria a ser assinado por essa empresa e pelo Benfica. O texto alargava o âmbito de participação da câmara/EPUL nas obras e previa a atribuição de uma comparticipação financeira de 6,8 milhões de euros, em contradição com o que tinha sido assinado no contrato-programa. Na realidade, a EPUL pagou 8,1 milhões de euros ao clube, justificando o excesso com o pagamento do IVA.
Um inquérito feito por um outra administração da própria EPUL detectou mais irregularidades. A empresa pagou inúmeras despesas realizadas antes da assinatura do contrato-programa, em Julho de 2002. Além disso, 80 por cento das que respeitavam o prazo diziam respeito a “assessorias e consultorias”.
Outra anomalia detectada foi o pagamento de 9,975 milhões de euros pela EPUL ao Benfica em 31 de Dezembro de 2004, pelos eventuais lucros da construção de 200 fogos num terreno no Vale de Santo António, habitações essas que até hoje ainda não foram construídas. Em violação do contrato de execução, a EPUL pagou ainda 32,4 milhões de euros do terreno que o Benfica vendeu (imóvel este doado ao clube pela câmara) entre Janeiro e Novembro de 2003, apesar da escritura de compra e venda ter sido realizada só em Setembro de 2004.