Um disparate de filme

Para quem for fã de longa data do lendário detective ficcional criado por Arthur Conan Doyle e, sobretudo, da sua encarnação quase perfeita por Jeremy Brett na série televisiva da década de 1980, esta "reinvenção" da personagem às mãos de Guy Ritchie (o ex-sr. Madonna) e do produtor Joel Silver é nada menos que sacrílega. Por uma razão simples: esta história original que lança Holmes e o seu companheiro Watson nas pegadas de um nobre dedicado à magia negra é uma aventura esquizofrénica que, na sua ânsia de agradar a um público mais jovem, acaba por ser um monstro de Frankenstein criado em função do "marketing" mais do que uma tentativa sincera de actualizar a personagem.


Trocando por miúdos: ver Holmes a jogar boxe? Tudo bem. Atirá-lo para o meio de uma sequência de efeitos visuais centrada numa luta com um colosso musculado francês num estaleiro com um navio à beira de ser lançado à água? Francamente idiota, e com pouco ou nada a ver com a pacatez vitoriana da personagem. É uma ideia "americana" e filisteia do que uma actualização da personagem deve ser, mais próximo dos "serials" ou das adaptações livres da Hollywood clássica, e não ajuda nada que Ritchie dirija a coisa como se estivesse a fazer uma comédia de acção moderna, com diálogo de sitcom e cenas de pancadaria a intervalos regulares.

Referidas estas reservas, também é verdade que este "Sherlock Holmes" acaba por se ver sem fastio. Houve a inteligência de reter muitas das idiossincrasias e excentricidades da personagem original, que Robert Downey Jr. faz sua com truculência e respeito. Depois, há verdadeira química entre Downey Jr e Jude Law como Watson, respeitando o "caderno de encargos" sem trair o espírito das histórias originais. E, finalmente, porque a coisa se mexe depressa e não chateia. Não deixa por isso de ser um disparate de filme - mas disparate por disparate antes isto que os "Transformers".

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