Maiores economias chegam a acordo não vinculativo que deixa muitos insatisfeitos
Estados Unidos, China, União Europeia, Japão, Brasil, Índia, África do Sul e outros países subscrevem o acordo, que deveria ainda ser submetido ao plenário da cimeira do clima, durante a madrugada ou manhã de hoje. Mas alguns países em desenvolvimento não estão satisfeitos. Basta um voto contra para o acordo ser chumbado e pelo menos o Sudão deu já a indicação de que não votará a favor.
Depois de duas semanas infrutíferas de discussões na capital dinamarquesa, a cimeira de Copenhaga, que deveria acabar ontem, ganhou fôlego com a presença de líderes mundiais nos últimos dois dias. Sem perspectivas de progresso conclusivo na linha de negociação que vinha sendo conduzida desde a conferência climática de Bali, há dois anos, ontem vários textos para um acordo-chapéu foram debatidos.
O último, que acabou por desbloquear as resistências entre as maiores economias, é o que menos compromissos e metas contém. Países desenvolvidos e em desenvolvimento apresentarão listas do que prometem fazer. Mas, por ora, ninguém será obrigado a cumpri-las.
O presidente norte-americano Barack Obama disse, numa conferência de imprensa, que o Protocolo de Quioto tinha metas vinculativas, mas que não estão a ser cumpridas. E acrescentou que, dados os diferendos entre os países desenvolvidos e em desenvolvimento, é melhor dar um passo em frente, mesmo que menor, do que dois atrás.
"Eu sou favorável a um tratado vinculativo, mas se apenas esperássemos por isso, não faríamos nenhum progresso", afirmou. "Ser legalmente vinculativo é importante, mas não era tangível nesta conferência", acrescentou.
"Em lugar de colocarmos um monte de palavras numa página, que depois não seriam cumpridas, devemos dar passos firmes à medida que possamos fazê-lo", disse ainda Obama.
O acordo fixa em dois graus o limite máximo desejável para o aumento da temperatura da Terra no futuro. Mas não traz números de objectivos de redução a médio e longo prazo, nem globais, nem para os países desenvolvidos em particular.
Apesar de as maiores economias do mundo em desenvolvimento subscreverem o texto, alguns países manifestaram-se logo contra. O chefe da delegação sudanesa, Lumumba Di-Aping - coordenador do G77, o grupo dos países em desenvolvimento nas negociações, disse que o acordo é inaceitável, classificando-o como uma tentativa de imposição dos Estados Unidos às nações pobres.
Di-Aping criticou, em particular, a promessa de 100 mil milhões de dólares (70 mil milhões de euros) anuais, a partir de 2020, dos países desenvolvidos, para ajudar o resto do mundo a enfrentar o desafio do aquecimento global. O dinheiro, disse o negociador sudanês, é insuficiente e não há qualquer garantia de onde virá nem como.
Dez mil milhões por anoA única garantia firme são 30 mil milhões de dólares (21 mil milhões de euros) entre 2010 e 2012 - ou seja, dez mil milhões de dólares por ano. Para este montante, a UE comprometeu-se com 10,6 mil milhões de dólares, o Japão com 11 mil milhões e os Estados Unidos com 3,6 mil milhões.
"Este é o preço deste acordo", afirmou Di-Aping, dizendo que nada estava decidido: "Este acordo permanece como uma ideia". Di-Aping afirmou que "o Sudão não vai assinar um acordo que destruirá África".
À hora do fecho desta edição, ainda não estava claro se o texto seria apresentado como tal ao plenário da cimeira de Copenhaga ou se haveria ainda alguma tentativa de o modificar, para satisfazer os interesses dos países mais pobres.
A divulgação do acordo, ontem à noite, culminou um dia em que as expectativas de um resultado ambicioso em Copenhaga se foram deteriorando. "A ideia era termos um começo marcante para o pós-2012 [quando termina o primeiro período do Protocolo de Quioto] e, neste momento, isto está fora de questão", disse Francisco Ferreira, da associação ambientalista Quercus, que acompanhou as duas semanas de negociações em Copenhaga.
"Copenhaga foi um fracasso abjecto", comentou Nnimmo Bassey, presidente da organização internacional Amigos da Terra, num comunicado. "Não foi feita justiça", acrescentou.
"A cidade de Copenhaga é hoje cena de um crime, com os culpados e culpadas a fugir de vergonha para o aeroporto", afirma Kumi Naidoo, da Greenpeace Internacional, também num comunicado.
Muitos líderes mundiais deixaram ontem a capital dinamarquesa. A conferência climática deverá ser encerrada por outros representantes nacionais.