Bacalhau da Consoada: Como escolher os melhores?

Quer-se bem seco. E de cor amarela palha. Deve ter a forma de uma asa e o tradicional corte em três bicos que mostra que a cabeça lhe foi retirada mal foi pescado. Segredos para escolher o bacalhau

Bacalhau para nós, portugueses, é de todas as maneiras: cru, frito, cozido, assado nas brasas ou no forno. Tem é que ser do salgado e seco. O fresco que o comam outros, pois não nos serve para a noite da Consoada, a refeição das refeições das famílias portuguesas. Por isso, o bacalhau é, entre nós, um assunto muito sério. A tal ponto que, um chefe de família minhoto, cioso da paz entre os seus, mandava que, "à mesa", não se discutisse "política, religião e bacalhau". Faz, então, todo o sentido informarmo-nos sobre como escolher o melhor.

Não há grandes dúvidas sobre o tema entre cozinheiras e cozinheiros de restaurantes, mães de família ou apreciadores em geral: o bacalhau quer-se bem seco, o que implica que, à vista, nos surja largo, em forma de asa, com a cor amarela palha e uniforme, sem manchas escuras, que indicam que o peixe foi mal sangrado; ou cor-de-rosa, que revelam que o excesso de humidade e o mau armazenamento o tornaram defeituoso.

Também é essencial que o seu cheiro característico seja limpo e não desagradável. Será ainda vantajoso para o comprador pegar no bacalhau pelo lado do lombo e testar-lhe a horizontalidade. Não é necessário que fique, como diz o outro, "firme e hirto". Admite-se que vergue ligeiramente, ficando, no entanto, quase direito. Este é outro sinal iniludível que estamos perante um bacalhau bem curado e bem seco.

Do rifoneiro existente sobre o tema, vale a pena reter o dito que ensina que "bacalhau bom não é o que é mole, antes o que se mete nos dentes". Daí que os apreciadores mais exigentes, alguns dos quais se dão ao requinte de terminar a cura dos bacalhaus em suas casas, afirmem que, quanto mais desidratado, melhor é o bacalhau, o qual não deverá exceder os 30 por cento de humidade - embora as normas comunitárias europeias admitam teores de humidades mais elevados.

Percebe-se, assim, por que é que a cura e a secagem são dois momentos essenciais para conferir ao bacalhau as qualidades que lhe reconhecemos e exigimos. O sal e o sol são ingredientes imprescindíveis nestas operações, embora, nos dias de hoje, a cura quase tenha deixado o ar livre, transferindo-se para estufas.

Cura amarela

A secagem é uma operação de desidratação, designando-se "quebra" a diferença de peso entre o "bacalhau verde" - assim se designa o peixe salgado no momento do desembarque - e o bacalhau seco tal como o adquirimos. Quando os nossos lugres iam pescar nos mares da Terra Nova e da Gronelândia, ao fundearem, no regresso, junto das secas, nos portos de Viana do Castelo, Aveiro, Figueira da Foz e Setúbal, o "bacalhau verde" era metido em grandes tinas, onde era escovado para lhe retirarem o sal. Depois, os peixes eram dispostos sobre tabuleiros de grade montados em cavaletes, inclinados na direcção do sol, para que secassem. Ao fim da tarde, recolhia-se o peixe, que era prensado sob uma grande rodela de madeira, virado com a pele para baixo. A operação repetia-se tantas vezes quantas as necessárias a uma boa cura.

Chamava-se cura normal à que era feita, de forma intensiva, durante todo o dia, excepto nas duas horas e meia do meio-dia, por causa da intensidade do sol. Actualmente, este tipo de cura é feita sobretudo em estufas a temperatura uniforme e sempre com muita ventilação, para que o ar quente circule. Podem secar-se até 300 quintais (medida de peso correspondente aproximadamente a 60 kg) de bacalhau por dia.

Quanto à chamada cura amarela, a mais desejada pelos apreciadores, é aquela em que o bacalhau é seco sem ser colocado directamente ao sol. Por isso, sempre que o sol está muito intenso, ele é recolhido. O mesmo sucede quando está nevoeiro. Antigamente, os peixes assim curados eram chamados bacalhau inglês. Hoje, noruegueses e ingleses ainda utilizam este método. Em Portugal é raro porque é mais exigente e mais caro.

Um bacalhau de cura normal fica com a superfície coberta por uma camada fininha de sal com aspecto de algodão; um de cura amarela, além de mais duro, ostenta uma cor amarela acastanhada, dando ideia que o peixe esteve exposto ao fumo, embora o não tenha estado.

Fresco ou congelado?

Quando olhamos para um bacalhau seco exposto numa banca também podemos saber se ele foi ou não amanhado, limpo e salgado mal foi pescado. Se foi, revela o tradicional corte em três bicos na sua parte mais larga. Isto porque, mal o peixe é capturado, é-lhe retirada a cabeça, sendo o corte feito à faca ao longo da abertura das guelras, mantendo o lombo que termina junto à parte posterior da cabeça. O peixe está fresco e permite esta operação.

Já se o bacalhau é capturado por navios-fábrica, lê-se no site do bacalhau da Noruega (www.mardanoruega.com), o peixe é congelado de imediato. Ao chegar às fábricas em terra, devido ao estado de rigidez, separar a cabeça só se torna possível com um corte a direito, feito habitualmente com serra.

Acrescenta a mesma fonte que "para voltar a conseguir um estado de maleabilidade que permita o corte à faca, é necessário descongelar o bacalhau em água do mar purificada por ionizador e com temperatura controlada". Mas a maior parte das fábricas de transformação não possui este tipo de tanques de descongelação.

Como reconhecer se um peixe foi mal descongelado para ser transformado em salgado seco? Segundo o mesmo site, parece simples: "Apresenta normalmente algumas mazelas na carne ao longo da zona da espinha". A todas estas informações disponibilizadas pelo organismo oficial norueguês não é estranha a circunstância de sermos os maiores consumidores de bacalhau da actualidade.

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