Natália Correia Guedes defende recuperação de peças roubadas nas invasões napoleónicas
Museóloga acredita que o Governo francês estaria disponível para a devolução deste património
Este é o "momento certo" para Portugal tentar recuperar peças do seu património que se encontram em França, para onde foram levadas pelo cientista francês Geoffroy Saint Hilaire durante as invasões francesas, defendeu ontem Natália Correia Guedes, antiga directora do Museu do Oriente e, antes disso, do Museu dos Coches.
"Saint Hilaire era um cientista muito conceituado e Napoleão disse-lhe que levasse o que entendesse", explicou ao PÚBLICO a museóloga no final da apresentação do terceiro número da revista Museologia.pt e do livro Museus e Património Imaterial, no Museu Nacional de Arte Antiga. "Foram carros de bois cheios de peças e é por isso que hoje há colchas indo-portuguesas no Museu de Lyon, porcelanas no Museu do Louvre. A melhor colecção de História Natural que estava em Lisboa foi levada para o Muse de História Natural de Paris."
Numa altura em que Portugal está a planear a criação de um Museu da Viagem, seria importante, afirma Natália Correia Guedes, discutir este assunto com os responsáveis franceses. "Neste momento, o Governo francês está muito generoso, tem as reservas cheias de obras de arte que não serão vistas nos próximos cem anos e está a ter uma política de descentralização em relação aos seus museus em França."
Dá um exemplo: as mais de 60 peças do escultor Auguste Rodin que o Museu Rodin e o Governo francês emprestaram durante três anos ao Brasil e que podem, neste momento, ser vistas em Salvador da Bahia. Ou ainda a "antena" que o Museu do Louvre planeia abrir no Dubai. Sinais, segundo Natália Correia Guedes, de uma disponibilidade que o Governo francês poderia revelar também para com Portugal, até porque o que está em causa são peças que "nunca serão expostas em França". Não lhe parece que a iniciativa possa ser mal interpretada. "Há 30 anos podia ter uma leitura diplomática diferente. Neste momento não."
A antiga directora-geral do Património Cultural deixou outros recados ao novo director do Instituto dos Museus e da Conservação, João Carlos Brigola (cuja tese de doutoramento foca precisamente "o saque das colecções e museus de Lisboa"), que acaba de assumir o cargo, sucedendo a Manuel Bairrão Oleiro, e que ontem estava presente na apresentação das suas publicações. É necessário, disse Natália Correia Guedes, "recuperar o prestígio perdido a nível internacional do Instituto José de Figueiredo" de conservação e restauro; e é fundamental garantir "a sustentabilidade dos projectos de museus em curso".
A ministra da Cultura, Gabriela Canavilhas, referiu-se ontem de manhã a um desses projectos em curso, afirmando que o futuro Museu da Língua e da Viagem não será instalado no Pavilhão de Portugal, que "tem neste momento outro destino". Não revelando a localização do novo museu, disse apenas que gostaria que fosse num "espaço onde os portugueses se revêem na sua portugalidade".