R de reconstrução

Na foto da capa aparece a tapar um dos olhos preparando-nos para o que se segue. O quarto álbum de Rihanna surge nove meses depois do ex-namorado, o cantor Chris Brown, a ter agredido, provocando-lhe várias escoriações.

O disco não se reporta especificamente a esses acontecimentos, mas não os ignora. Há separações e paixões destrutivas mas sem o sentimentalismo habitual nas cantoras do mesmo espectro. Não é surpreendente.

Basta ouvir o anterior álbum, "Good Girl Gone Bad" (2007), para perceber que as canções de Rihanna abordam emoções complexas sem as reduzir a uma só dimensão ou à vulgar caricatura sexual. Do ponto de vista sónico esse disco constituía uma agradável surpresa, com algumas encenações digitalizadas a ficarem na história dos sucessos pop desta década, como "Umbrella", a canção onde Jay-Z, que a apadrinhou, também canta.

Mas "Rated R" vai mais longe, em todos os sentidos. Dificilmente será disco para consensos. Parece ocupar, como "808s & Hearbreak" de Kanye West, um lugar de mudança, expresso por uma sonoridade suja e pelo desconforto que percorre a maior parte das canções.

Ao contrário de Beyoncé, que actua com uma banda constituída por mulheres, Rihanna rodeia-se de homens, entre compositores e produtores, como Justin Timberlake, The-Dream, Ne-Yo, Will.I.Am ou os Chase & Status.

Nada disto interessaria se a música fosse uma desilusão, mas não é, com Rihanna - ironia? - movendo-se por entre elementos de linguagens conotadas com públicos masculinos, no limite do machismo, como os solos de guitarra do rock mais pesado ("Rockstar 101"), o balanço digital do dancehall jamaicano ("Rude boy"), as batidas do hip-hop mais gorduroso ("Hard") ou os ambientes turvos do dubstep inglês ("Wait your turn").

É um álbum que a reafirma como uma das cantoras mais estimulantes a operar no centro do mercado. Se Beyoncé se afirmou, nesta década, como a nova estrela planetária da pop, Rihanna surge como o espelho deformado da protectora. Alguém que, a cada disco, contribui para transformar a música que vamos ouvindo nas tabelas dos mais vendidos.

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