Foi Walesa a derrubar sozinho o dominó gigante na Festa da Liberdade
Passava já das 20h30 (19h30 em Lisboa) quando o ex-Presidente polaco, Lech Walesa, deu, sozinho, o empurrão que fez desabar a estrutura de 1,5 quilómetros, montada frente à Porta de Bradenburgo, no exacto local onde até 1989 se ergueu o “muro da vergonha”. As primeiras peças de esferovite, coloridas por jovens de várias partes do mundo, caíram cadenciadamente, perante o aplauso das cem mil pessoas que, munidos de guarda-chuvas e impermeáveis, resistiram ao dilúvio.
Até ao final, especulou-se sobre quem daria o empurrão no simbólico muro. Falou-se primeiro de Mikhail Gorbatchov, o líder que recusou mandar o Exército Vermelho esmagar as rebeliões nascentes. Durante o dia, foi dada como certa a participação do ex-dirigente húngaro Miklos Nemeth, que ainda antes da queda do Muro permitiu que os alemães do Leste passassem as suas fronteiras a caminho do Ocidente. Mas a honra coube ao fundador do Solidariedade, cujo movimento inspirou milhões a lutar contra o domínio soviético.
E Walesa mostrou mesmo o seu incómodo pela participação de Gorbatchov nas cerimónias. Ele “nunca quis a queda do comunismo” e atribuir-lhe a queda do Muro “é uma mentira”, disse numa entrevista à televisão polaca, sublinhando que o fim da Cortina de Ferro “se deveu em 50 por cento ao Papa João Paulo II, 30 por cento ao Solidariedade e apenas 20 por cento ao resto do mundo”. Ouvido pelo Times, o ex-líder soviético respondeu: “Creio que há aqui dois heróis, o povo alemão e o russo”.
Horas antes, os dois antigos dirigentes tinham acompanhado Angela Merkel noutro momento simbólico das comemorações. A chanceler repetiu, com convidados e muitos curiosos, os passos que há 20 anos a levaram à ponte de Bornholmer. Foi ali que a multidão acorreu na noite de 9 de Novembro de 1989 ao saber que a fronteira seria reaberta. Foi ali que as duas Alemanhas se reencontraram e o muro começou a ser derrubado.
Dezenas de iniciativas assinalaram a data, mas a grande festa ficou reservada para a noite. A Ópera de Berlim, sob a batuta de Daniel Baremboim, abriu os festejos, antes de Merkel e os líderes convidados atravessarem a porta de Bradenburgo, ao som de Wind of Change, a música do grupo alemão Scorpions, transformada em hino da reunificação. Aquele dia de 1989 “foi um dos mais felizes da minha vida”, resumiu Merkel, no meio da praça.