Devendra pop

"Hippie", o lugar-comum que associamos a Devendra Banhart, e "disci-plina" não são palavras que costumem andar de mãos dadas. Mas, assumindo o risco de sermos apelidados de reaccionários, proclamemos: bendita disciplina. É graças a ela que "What Will We Be" é o que "Smokey Rolls Down Thunder Canyon" não conseguiu ser. Faltavam direcção e ideias fortes ao disco anterior.

Devendra encontrou uma nova concisão pop e uma forma mais coerente de agarrar a explosão criativa (à folk juntou a Música Popular Brasileira, o funk, a pop mais descomprometida) que teve depois da dupla "Rejoicing in the Hands"/"Niño Rojo", de 2004. E nem precisou de mudar a banda que o acompanha.

Repare-se em "Angelika", que se faz de uma enternecedora frase de guitarra acústica, coros inocentes, guitarra eléctrica a polvilhar a melodia principal. Canção dois-em-um, na primeira metade mete-se pelo registo primaveril do melhor Donovan, deixando para a segunda parte cântico em espanhol e piano de bar de jazz de terceira categoria. Tudo coisas boas.

Devendra vai saltando de influência em influência, unindo tudo pela sua habitual atitude preguiçosa e veraneante. "16Th & Valencia, Roxy Music" emula o glam rock da banda de Bryan Ferry, na sua encarnação mais acelerada - no início da década não imaginaríamos o então trovador barbudo envolvido nestes deboches de ritmo, o que, só por si, é de saudar. "Rats" lembra o tom diletante dos Doors, mas deriva para hard rock desavergonhado (parece a versão "light" dos Led Zeppelin, e isso soa bem), enquanto "Foolin''" é um óbvio e feliz decalque de "Revolution Rock" dos Clash.

Longe de ser um disco fundamental, como é "Rejoicing in the Hands" (um dos melhores da década), num mundo ideal "What Will We Be" substituiria Jack Johnson e os seus clones nas "playlist" das rádios. O novo Devendra pop, que se estreia numa multinacional, ficaria certamente feliz e os cafés junto ar lugares mais aprazíveis.

Sugerir correcção
Comentar