Augusto Santos Silva foi o pior ministro da Comunicação Social desde o 25 de Abril, diz Balsemão
O presidente do maior grupo privado de comunicação social ainda se considera um jornalista. Francisco Pinto Balsemão, com quem nos encontrámos a semana passada na sede da Impresa, está à cabeça de um pequeno império que inclui o Expresso e a SIC – os dois projectos a que sempre esteve mais ligado – mas também revistas como a Visão, a Caras ou a Activa ou serviços na Internet.
“Reformar-me?”, atira-nos, malicioso, quando lhe perguntamos se um dia deixará a liderança do seu grupo. “Tenciono trabalhar até morrer – e isto se eu morrer, como costumava dizer o meu amigo Roberto Marinho” (da TV Globo). Passada a barreira dos 70 anos, mantém o gosto pelas discussões sobre o futuro do jornalismo, mostrando estar atento às novas tendências.
A Impresa tem uma posição central no sector da comunicação social, mas há analistas que consideram que lhe faltam capitais próprios. É verdade?Definimos uma rota e estamos a segui-la, pelo que até já apresentámos resultados positivos no segundo trimestre e, nas previsões que estão publicadas, contamos chegar ao fi m do ano – deste ano terrível –, com resultados positivos. Isso será possível porque tomámos medidas de contingência a tempo, faz agora já mais de um ano, e por isso conseguimos ter um orçamento para 2009 realista e que está a ser cumprido.
Os analistas têm dito que um dos pontos fracos do seu grupo é a existência de um défice de capital de cerca de 100 milhões de euros.Não sei o que é um défice de capital. Temos uma dívida que tem vindo a ser paga e temos investido. Em 2008 investimos na compra de 50 por cento da empresa das revistas e este ano investimos na compra de 40 por cento da Lisboa TV, proprietária da SIC Notícias. Vamos cumprir não só a rota defi nida paraeste ano como para os próximos anos e continuámos a investir, agora em estúdios para a SIC, um passo
intermédio para a construção de instalações para o grupo todo que deverão estar concluídas em 2011, 2012.
Começámos pela fusão das três redacções da SIC generalista, SIC Notícias e SIC online, que já estãointegradas. No grupo temos hoje uma agenda comum, criámos uma bolsa de especialistas, realizamos trabalhos para os vários meios com uma única equipa de jornalistas. Por outro lado, na integração online, embora cada marca mantenha a sua personalidade, ainda há muito a fazer mas já demos muitos passos. A equipa compreendeu que isto é um negócio multimédia, que temos de produzir bons conteúdos e depois distribuí-los no maior número de plataformas diferentes.
Todos os grupos que começaram com o papel têm estão a evoluir. Parar é morrer. Num grupo como o nosso é possível ter uma parte comum e depois cada “chefe de cozinha” de cada título, ou de cada plataforma, vai às matérias-primas buscar aquilo que entende para apresentar o seu produto final. O Expresso dá o seu tratamento, a SIC outro tratamento. Não é nada complicado.
Como financiar o negócio dos media quando as receitas do online são ainda tão baixas?O modelo actual ainda está muito centrado em ter mais tráfego, logo o acesso é gratuito, na esperançade ter mais publicidade. Está a demonstrar-se que isso não é possível. E julgo que a evolução, que será mais acelerada do que muita gente pensa, passará por uma parte dos conteúdos divulgados pela Net ser paga.
Esse exemplo é importante, pois vem do maior grupo de media do mundo. Julgo que esse é o caminho, não apenas criando sistemas de assinaturas, mas também permitindo a compra à la carte. Nada nos impede de vender a opinião do Expresso, as entrevistas da Visão, os conselhos de moda da Activa, a Quadratura do Círculo da SIC Notícias num pacote que o cliente forma ele próprio.
É possível rentabilizar estes negócios quando há um operador público a disputar receitas?É difícil porque a RTP faz não só concorrência desleal às televisões como a todos os meios de comunicação, pois, ao ter publicidade, está a ficar com uma fatia de um bolo que já é pequeno.
Continua, pois, a defender que a RTP não deveria ter publicidade?Sim. E que devia cumprir com rigor o contrato de concessão em matéria de programação. Os programasde entretenimento puro e duro já existem em dois canais privados, para além dos canais temáticos que já se dedicam ao entretenimento.
Uma coisa é haver políticos com melhores ou piores relações com a comunicação social, ou que compreendem melhor ou pior o papel de cada um. Outra coisa é haver, como julgo que existiu neste Governo, um plano para enfraquecer os grupos de comunicação social privados. Se virmos o Estatuto do Jornalista, a Lei da Televisão, os poderes concedidos à ERC, a lei da concentração ou o concurso para o quinto canal, encontramos dados objectivos que permitem fundamentar a existência dessa estratégia de debilitar e enfraquecer os grupos privados. Ainda por cima o ministro que foi escolhido para esta área, Augusto Santos Silva, e já lho disse a ele, foi o pior ministro que houve desde o 25 de Abril. Nunca fez qualquer esforço para compreender os problemas, para tentar ajudar à convergência, para perceber o salto que é preciso dar, para entender as dificuldades do modelo de negócio da Internet. Se se quer uma comunicação social que funcione, que seja independente e que ajude à formação e à informação das pessoas, é necessário não só conversar, como compreender e criar incentivos. Ora isso nunca aconteceu, pelo contrário: a estratégia foi a inversa.
O Governo quis fortalecer o grupo do Estado ou colocar os privados em situação de dependência?As duas coisas.
Isso surtiu efeito?Se olharmos para os jornais, para a informação das televisões, acho que não surtiu efeito em termosgerais. O que não quer dizer que não tenham existido alturas em que tenha conseguido os seus objectivos.
Todos os Governos são ao princípio demasiado bem tratados e no final demasiado maltratados. Este nãofoi tratado pior do que os outros. Há uma altura em que acaba o “estado de graça”, e de um momento para o outro inverte-se a situação. No caso deste Governo, boa parte do que sucedeu até se deve à sua atitude. Há ministros, como Vieira da Silva, que tiveram sempre a chamada boa imprensa, não é porque tenha mais jeito do que outros, mas porque fez uma obra que é respeitada. Os jornais não são injustos.
É um puzzle do qual me faltam algumas peças e portanto não me devo pronunciar.
Como jornalista, não apenas como gestor, considera que a decisão do accionista de pôr fim ao jornal de M.M.G. foi censura?Essa questão é complicada. Na Impresa meto-me muito pouco no que está para sair, mas meto-me bastante no que já saiu. Mas, daí a vantagem de ter sido jornalista, critico ou elogio de igual para igual nas reuniões semanais que faço no Expresso e na SIC. E quando falo, faço-o segundo critérios jornalísticos. No meu caso, se entendesse que esse serviço de notícias tinha defeitos jornalísticos, e teria alguns, já o teria dito.
De onde vem o poder de um director de informação?O director de um jornal ou de um canal de informação, enquanto tiver a confiança da administração, teráde ter todo o poder. Se perder a confiança nele, demito-o.
A observação é vossa. Mas digo mais: ao nomear um director de informação, é muito importante ouvir os jornalistas através do Conselho de Redacção (CR). Desde o tempo em que apresentei a Lei de Imprensa no Governo de Francisco Sá Carneiro que defendo os CR e não me importo nada que os CR tenham mais poder. Porque se o CR se opõe é porque a redacção não quer e não devo impor-lhe um director. É um disparate, não faz sentido. Prefiro mil vezes estar resguardado pelos representantes da redacção. O jornalismo é demasiado importante para haver decisões precipitadas seja de quem for, pelo que deve haver mecanismos de consulta, de ponderação, que eu sempre resguardei.
As próximas eleições podem criar um impasse político?Podem, mas até pode não ser completamente negativo o facto de só haver uma maioria relativa. Para mim, só uma coisa é certa: vou votar no PSD.
Sem tapar a cara da líder?Não tapo a cara a ninguém, muito menos a de Manuela Ferreira Leite, que está a fazer um bom trabalho, que tem contrastado com os outros. Já reparou que, nos debates, não tomou uma nota, nem levou dossiers, enquanto os outros iam cheios de papéis, de fotografias? Tem um rumo, está a segui-lo, esperemos que os portugueses a compreendam e a aceitem tal como ela é, pois não precisa de mudar.
O contraste com o actual primeiro-ministro é positivo?Esse contraste, neste momento, valoriza Manuela Ferreira Leite.