Os extremistas que chegam hoje ao PE

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Defendem que os barcos com imigrantes ilegais devem ser afundados, não admitem negros ou asiáticos no seu partido, comparam o islão a Hitler e o Corão ao Mein Kampf. E ainda questionam o Holocausto. Trinta e cinco deputados de partidos de extrema-direita sentam-se no Parlamento Europeu que hoje toma posse. Por Maria João Guimarães

a O Partido da Liberdade, da Holanda, é contra a presença da Roménia e da Bulgária na União Europeia. O Partido da Grande Roménia tem uma posição antiminoria húngara, e na Hungria o partido Jobbik alerta para o crime cigano. Na Eslováquia o Partido Nacional tem a bandeira da oposição contra a minoria húngara e contra os ciganos. Deputados de todos estes partidos sentam-se a partir de hoje no Parlamento Europeu.No parlamento que saiu das eleições de 7 de Julho há 35 deputados de partidos de extrema-direita de 13 países, desde os italianos da Liga Norte (nove lugares) aos holandeses do Partido da Liberdade, de Geert Wilders (quatro assentos), passando pelos estreantes britânicos do British National Party (dois deputados) e pelos repetentes franceses da Frente Nacional (três). São uma pequena minoria no total de 785 eurodeputados.
Uns são mais radicais do que outros - alguns recusam mesmo a etiqueta de "extrema-direita" e têm as suas diferenças, de modo que não conseguiram juntar-se para formar um único grupo, para o que necessitariam de 25 deputados de sete Estados. A formação de um grupo permitiria ter acesso a quase um milhão de euros por ano para pessoal, gabinetes e publicações em Bruxelas, Estrasburgo e nos seus países (alguns partidos de extrema-direita pertencem, no entanto, ao grupo dos eurocépticos).
Hoje, na sessão inaugural do parlamento, um deputado do Jobbik - Movimento para uma Hungria Melhor deverá envergar o uniforme negro de uma milícia que diz ter como objectivo defender os húngaros da criminalidade cigana.
Foi no fim-de-semana passado em Bucareste, numa cerimónia de "relançamento" da Guarda Húngara (Magyar Gárda), que Csanád Szegedi anunciou ir vestir hoje o uniforme. Os críticos do Jobbik dizem que a farda é semelhante à da época nazi, mas os seus defensores garantem ter por base o folclore local.
Este relançamento da milícia foi feito como desafio à sua proibição: a Guarda foi ilegalizada a 2 de Julho por intimidar e violar os direitos de aldeões ciganos. Em causa esteve um desfile semelhante a uma parada militar, em 2007, num local com grande presença cigana. Esta milícia ilegal tem várias centenas de membros e, apesar do estilo paramilitar, não possui armas.
O líder do Jobbik, Gabor Vona, afirmou não haver qualquer razão para temer a Guarda, adiantando que tem mais medo de empresas de segurança privadas, de pessoas que defendem a legalização da cannabis, de firmas israelitas que tentam comprar empresas húngaras e de "traidores da nação" - os socialistas e os liberais.
"Não somos contra ninguém, somos pela Hungria", disse Gabor Vona, insistindo que a organização tem apenas fins pacíficos. Apesar disso, um acordo entre a milícia e o Sindicato Independente da Polícia, que tem quase cinco mil membros, causou muita polémica.
Afundar barcos
Para além do Jobbik, outro partido cuja entrada no Parlamento Europeu deu muito que falar foi o British National Party (BNP). O partido de Nick Griffin não admite negros e tem defendido a proibição de relações interraciais.
O seu líder, que tem em geral umas bochechas coradas, defendeu recentemente que os países europeus deviam "afundar" barcos com imigrantes ilegais que tentam chegar à Europa. "Não é para morrer ninguém", explicou mais tarde.
A ideia de Griffin era fornecer depois uns barcos de borracha para que os potenciais imigrantes regressassem aos seus países. "E mostrar-lhes que não conseguirão chegar à Europa." Porque "a alternativa", explicou, "é aceitar que a Grã-Bretanha se torne igual a África".
Mas o BNP não fica por aqui. Tem também uma vertente anti-islão: Griffin chegou mesmo a sugerir que a Europa precisa de "quimioterapia" para se livrar desse "cancro" que é a islamização.
Griffin nega que o seu partido seja de extrema-direita e diz não ter nada a ver com fascistas. Mas em Bruxelas e Estrasburgo trabalhará informalmente com vários partidos como a Frente Nacional, de Jean Marie Le Pen (três deputados), que várias vezes fez no PE discursos em que relativizava o Holocausto (dizendo, por exemplo, que os campos de concentração foram um "detalhe" na Segunda Guerra Mundial).
Entre os casos de sucesso está ainda o partido do holandês Geert Wilders, reconhecível pelo seu cabelo louro platinado (a sua imagem de marca), que tem tido muita exposição mediática fora da Holanda com o seu filme anti-islão, que já lhe valeu um segundo episódio mediático quando a Grã-Bretanha lhe negou entrada no seu território.
Wilders tinha afirmado, a poucos dias da tomada de posse dos eurodeputados, que não é favorável à entrada de mais nenhum país na UE, chegando mesmo a defender a saída da Roménia e da Bulgária. "O meu país votou contra o Tratado [de Lisboa] por causa da entrada da Roménia e da Bulgária", afirmou Wilders numa entrevista à estação de televisão Euronews. "Acredito que estes países não estão prontos e são ainda muito corruptos."
Wilders recusa, tal como Griffin, que o seu partido seja de extrema-direita. Também o Partido do Povo Dinamarquês rejeita o rótulo, partilhando com Wilders a forte vertente anti-islão: parte da campanha para as últimas legislativas na Dinamarca foi feita, aliás, com base no episódio dos cartoons de Maomé (quando o diário Jyllands Posten publicou, em 2005, vários cartoons que causaram protestos em diversos países muçulmanos). Soren Krarup, um deputado do partido no Parlamento Nacional, descreveu em 2007 o islão como "um regime totalitário que tem milhares de vidas humanas na consciência". "O lenço [islâmico] é um símbolo deste regime e o Corão pode ser comparado ao Mein Kampf [de Hitler]."
O partido tem-se mantido como apoiante do Governo dinamarquês em troca de leis de imigração restritas.
O estranho caso finlandês
A extrema-direita teve ainda uma estreia na Finlândia, um país em que os rigorosos e longos invernos associados à pouca hospitalidade do povo têm contribuído para uma fraca presença de estrangeiros. Ainda assim, a violência dos ataques do partido Verdadeiros Finlandeses (Perussuomalaiset, um deputado no PE) é grande: um membro do partido, Jussi Halla-aho, chamou um dia num blogue "violadores em grupo africanos" e "parasitas" aos requerentes de asilo.
O Partido do Povo Dinamarquês e os Verdadeiros Finlandeses fazem parte de um grupo a que pertence ainda a Liga Norte e outros partidos eurocépticos que dizem não ser de extrema-direita.
A Liga Norte (Lega Nord, nove deputados) é o partido de extrema-direita com mais deputados. Os italianos - do Norte, claro, não do Sul, que desprezam - liderados por Umberto Bossi estão ainda presentes na coligação que governa Itália, liderada por Silvio Berlusconi. Recentemente foram responsáveis pela lei que criminaliza a imigração ilegal no país. A Liga Norte não quis associar-se aos ingleses do British National Party, mas partilha alguma da linguagem de Griffin em relação aos imigrantes ilegais que tentam chegar à Europa por mar, tendo sugerido o uso de canhões contra os barcos.
Alguns dos mais curiosos partidos de extrema-direita estão nos antigos países comunistas: o Partido da Grande Roménia (dois eurodeputados), por exemplo, diz que quer recriar o Reino da Roménia, unindo todas as pessoas de etnia romena e ficando com o território da Moldávia e da Ucrânia - isto para além de basear a sua identidade numa retórica antiminoria húngara. A minoria húngara é também, a par dos ciganos, o alvo dos ataques verbais do Partido Nacional da Eslováquia (um eurodeputado).
Contra a Turquia
A posição contra a adesão da Turquia é um traço comum à maioria destes partidos. Volan Siderov, do partido búlgaro Ataque (Ataka, dois deputados no PE) agitou o fantasma do poder turco: "Se ficarmos quietos e não trabalharmos como patriotas búlgaros, um dia eles vão conquistar-nos", disse. "Eles vão anexar regiões inteiras."
Nesta cruzada anti-Turquia destaca-se também o austríaco FPÖ (dois deputados), que partilha ainda a bandeira do anti-islamismo: "O Ocidente em mãos cristãs", defenderam na campanha.
Muito se falou do aumento dos deputados de extrema-direita. Explicaram-se as circunstâncias, lembrando, por exemplo, que mais abstenção favorece os mais radicais e penaliza o centro, e que o voto de protesto contra a crise, contra governos incompetentes e contra problemas como o crime ou a corrupção foi para a extrema-direita. Hoje sentam-se nas cadeiras do Parlamento Europeu mais oito eurodeputados do que em 2004, segundo as contas do Eurobserver. Mas os analistas são unânimes em dizer que uma maior presença da extrema-direita não deverá ter mais do que um efeito simbólico.

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