Pais e filhos respeitem-se!
Ter segredos é normal. Muitos são os pais que gostariam de saber tudo o que se passa na vida dos filhos adolescentes. É preciso confiança e disponibilidade, diz Javier Urra, autor de um livro que revela o que pais e filhos escondem uns aos outros. Por Bárbara Wong
a O que escondem os filhos? Os sentimentos mais íntimos, se namoram, se já iniciaram a sua vida sexual. Mas também as suas acções, as más notas, as asneiras que fazem ou de que são vítimas. Os filhos não são os únicos a ter segredos, os pais também evitam falar alguns problemas. Por um lado, não querem preocupar os mais pequenos. Por outro, não querem fazer má figura. O que ocultam os filhos, o que escondem os pais é o título do novo livro do psicólogo clínico e forense espanhol Javier Urra, autor de outro best-seller, O Pequeno Ditador, que alerta os pais sobre os filhos a quem tudo é permitido. O texto agora publicado foi feito a partir de uma leitura da realidade portuguesa. O autor pegou em mais de três mil inquéritos para perceber o que pais e filhos escondem. Depois, traçou algumas pistas para os protagonistas poderem ultrapassar esses segredos, num livro que deve ser lido em família, recomenda.
Ter segredos é normal e são essenciais na evolução para a maturidade, escreve o autor; por isso, os pais devem respeitá-los. No entanto, devem criar um ambiente que permita aos adolescentes e jovens confiar-lhes alguns deles. É que nem todos os segredos são bons de ser guardados, como, por exemplo, quando os filhos são vítimas de bullying ou de agressões na escola.
E como conseguir esse ambiente? Para Urra parece haver dois tipos de casas em Portugal: o hotel e o lar. Tal como num hotel, há casas onde cada um dos elementos da família entra e sai, sem dar satisfações ou querer saber do outro. "Preocupam-me os pais a quem pergunto: diga-me três coisas positivas do seu filho e respondem que não sabem", confessa ao P2. O autor recorda o depoimento de um adolescente de 11 anos que dizia que aos pais não interessava se estudara ou se comera na escola; lembra oito rapazes que não confessaram a sua homossexualidade aos progenitores e três raparigas que iam à escola, mas não comiam.
Quanto ao lar, é aquela casa onde todos se conhecem, passam tempo com qualidade, mesmo que seja pouco, conversam sobre tudo. Se o pai falar de um colega de trabalho, talvez o filho partilhe uma história que se tenha passado na escola, sugere. Urra ficou impressionado com o número de filhos que dizem que contam tudo aos pais. "Num lar pode haver conflitos, mas pais e filhos não se tratam como desconhecidos", defende.
Apesar de haver poucos jovens a confessar que escondem problemas de consumo de álcool ou de estupefacientes, Javier Urra está preocupado porque é uma ameaça que os jovens tratam com alguma leviandade, pois consideram que têm tudo sob controlo. "Não se pode dizer a um filho que não beba, e estar com um copo na mão", alerta, o psicólogo. O exemplo dos pais é pois fundamental. Mas há mais: "É preciso levá-los aos bairros pobres de Lisboa, a um hospital com crianças enfermas, passar-lhes a mensagem de que ter saúde e vida é o mais importante."
Não há que ter medo de os chocar. "Os pais podem mimar os filhos, mas não deixá-los fazer o que querem, senão os miúdos ficam neuróticos. Aos filhos faz falta normalidade." Essa passa por ter boas relações e respeitar outros membros da família, como os avós, ou os professores; passa por actividades alternativas à escola, como o desporto ou a música, enumera.
Ao contrário do que acontece em Espanha, onde o autor fez o mesmo inquérito e escreveu um livro semelhante; em Portugal, há adolescentes e jovens mais melancólicos, que reflectem e calam muito. "Os pais devem estar atentos, escutar, captar os silêncios, respeitando."
Os pais devem mostrar disponibilidade: "Se um dia quiseres, eu estou disponível para conversarmos." Há diferenças entre ser pai e ser amigo, sublinha. "Um pai é sempre pai. É um amigo, mas de segunda linha e não o melhor amigo que sai com o filho. É aquele amigo com quem se pode ir ver um nascer do sol e jamais se esquecerá", conclui.