Válega assinala hoje 70 anos da revolta popular contra o corte de videiras americanas
Povo da freguesia de Ovar enfrentou militares para defender as terras. Dois homens morreram nos confrontos.
A lápide cravada na parede recorda o que aconteceu a 15 de Maio de 1939. A frase resume a história. "Neste local, foram mortos Jaime da Costa e Manuel Maria Valente de Pinho por uma força militar que investiu contra o povo de Válega que se opôs ao corte das videiras de vinho americano". Jaime era pedreiro e tinha 18 anos, Manuel era agricultor e tinha 38. A brigada chegou a Válega, Ovar, para cumprir a lei de Salazar que proibia a plantação de videiras americanas sem ser para porta-enxertos de castas portuguesas. O povo revoltou-se, armou-se com alfaias agrícolas, cercou os militares no adro da igreja e os sinos tocaram a rebate. Os reforços não tardaram. A população atirou pedras, a resposta foi dada com tiros. Houve feridos e presos. Hoje, 70 anos depois, a Associação da Lavoura do Distrito de Aveiro volta a organizar uma homenagem aos mártires do corte das videiras com uma romagem à campa dos dois falecidos, a partir das 11h00. José Maria Almeida tinha 25 anos, tem agora 94. Era agricultor e chegou a pegar numa gadanha para impedir o arranque das videiras pelo pé. "O presidente da junta acompanhou sempre a gente", recorda. Era dia de juntar-se aos pais numa feira agrícola em Estarreja. Foi buscar a bicicleta, passou pela igreja, viu a confusão e pedalou para avisar os pais que voltassem por outro caminho. "Muita gente foi para casa tirar as balas das costas", lembra. Dias depois foi intimidado para um inquérito policial em Ovar e o pai chegou a estar preso em Aveiro. "Toda a gente estava cheia de medo".
João Maria Valente tinha 10 anos em 1939. O pai era agricultor, um dos que se juntou ao povo e teve de fugir. "Alguns até se esconderam nos fornos de cozer o pão", conta. "Sabe por que queriam cortar as videiras? Porque o pessoal da Bairrada queria vender o seu vinho". João Maria tornou-se agricultor, chegou a plantar videiras de vinho americano branco e tinto. Agora, com 80 anos, as pipas e as cubas estão vazias. "Já não é preciso guerra, nem barulho, para cortar as videiras", comenta.
Filomena Amaral tinha 10 anos e recorda-se dos homens da cavalaria que chegaram a Válega algumas semanas depois de 15 de Maio. Vinham cumprir a lei e, dessa vez, não houve luta. Não eram mais de dez, não entraram no pátio da casa e fizeram o seu trabalho. "Mexeram nas pilhas de estrume para ver se havia pipas de vinho escondidas", recorda.
Teresa Amaral, directora do Museu Etnográfico de Válega, mostra a "relíquia". A tinta preta não se apagou na página amarelada do diário que começou a ser escrito em 1918. José Maria Tavares escreve que foi preso no dia 15 de Maio "por causa das videiras" e "posto em liberdade no dia 26 de Junho de 1939". O diário fará parte da exposição O Vinho - Da Cepa à Pipa, que abre hoje no museu de Válega, tal como um placard dedicado ao corte das videiras de 1939. "Naquele tempo, o vinho era essencial numa casa de lavoura", sublinha.
O decreto-lei de 18 de Abril
de 1935 não permitia
a plantação de videiras-
-americanas sem ser para lhes enxertar castas nacionais, determinando
o arranque, a substituição
ou enxerto das existentes.
Os viticultores eram
obrigados a inutilizar as enxertias efectuadas depois
de Outubro de 1934.
Nove anos depois, a legislação mudou e decidiu-se aplicar
uma multa aos agricultores
que desrespeitavam os imperativos legais.
a A lápide cravada na parede recorda o que aconteceu a 15 de Maio de 1939. A frase resume a história. "Neste local, foram mortos Jaime da Costa e Manuel Maria Valente de Pinho por uma força militar que investiu contra o povo de Válega que se opôs ao corte das videiras de vinho americano". Jaime era pedreiro e tinha 18 anos, Manuel era agricultor e tinha 38.
A brigada chegou a Válega, Ovar, para cumprir a lei de Salazar que proibia a plantação de videiras-americanas sem ser como porta-enxertos de castas portuguesas. O povo revoltou-se, armou-se com alfaias agrícolas, cercou os militares no adro da igreja e os sinos tocaram a rebate. Os reforços não tardaram. A população atirou pedras, a resposta foi dada com tiros. Houve feridos e presos. Hoje, 70 anos depois, a Associação da Lavoura do Distrito de Aveiro volta a organizar uma homenagem aos mártires do corte das videiras com uma romagem à campa dos dois falecidos, a partir das 11h00.
José Maria Almeida tinha 25 anos, tem agora 94. Era agricultor e chegou a pegar numa gadanha para impedir o arranque das videiras pelo pé. "O presidente da junta acompanhou sempre a gente", recorda. Era dia de juntar-se aos pais numa feira agrícola em Estarreja. Foi buscar a bicicleta, passou pela igreja, viu a confusão e pedalou para avisar os pais que voltassem por outro caminho. "Muita gente foi para casa tirar as balas das costas", lembra. Dias depois foi intimado para um inquérito policial em Ovar e o pai chegou a estar preso em Aveiro. "Toda a gente estava cheia de medo".
João Maria Valente tinha 10 anos em 1939. O pai era agricultor, um dos que se juntaram ao povo e tiveram de fugir. "Alguns até se esconderam nos fornos de cozer o pão", conta. "Sabe por que queriam cortar as videiras? Porque o pessoal da Bairrada queria vender o seu vinho". Já Filomena Amaral, que tinha 10 anos, recorda-se dos homens da cavalaria que chegaram a Válega algumas semanas depois de 15 de Maio. Vinham cumprir a lei e, dessa vez, não houve luta. Não eram mais de dez, não entraram no pátio da casa e fizeram o seu trabalho. "Mexeram nas pilhas de estrume para ver se havia pipas de vinho escondidas", recorda.
Teresa Amaral, directora do Museu Etnográfico de Válega, mostra a "relíquia". A tinta preta não se apagou na página amarelada do diário que começou a ser escrito em 1918. José Maria Tavares escreve que foi preso no dia 15 de Maio "por causa das videiras" e "posto em liberdade no dia 26 de Junho de 1939". O diário fará parte da exposição O Vinho - Da Cepa à Pipa, que abre hoje no museu de Válega, tal como um placard dedicado ao corte das videiras de 1939. "Naquele tempo, o vinho era essencial numa casa de lavoura", sublinha.