A humana Bella Swan e o vampiro Edward Cullen vão casar-se em "Amanhecer" ("Breaking Dawn"), o último volume da saga "Luz e Escuridão" criada pela americana Stephenie Meyer e que irá para as livrarias portuguesas a 9 de Junho (Gailivro). É o mais esperado por todos os que têm seguido esta saga para jovens adultos, estrondoso sucesso mundial, que nos conta a paixão entre Bella e Edward. "Crepúsculo" ("Twilight", adaptado ao cinema), "Lua Nova" ("New Moon") e "Eclipse" ("Eclipse") são os livros que já fizeram com que uma dona de casa do Arizona fosse considerada a nova J. K. Rowling.
Logo no primeiro capítulo de "Amanhecer" os leitores ficam a saber que Bella, uma adolescente americana igual a outras, filha de pais divorciados e que vive com o pai em Forks, vai casar-se aos 18 anos com Edward, o vampiro belo e imortal por quem se apaixonou. Quando os dois vão ter com Charlie, o pai de Bella, e lhe dizem que se vão casar, a primeira reacção dele é perguntar, furibundo: "Estás grávida, não estás?" A filha responde: "Não! É evidente que não estou!"
Bella casa virgem com um vampiro. Sexo só depois do casamento. Toda a saga é "uma parábola sobre a abstinência", sentenciou a "Newsweek" quando "Crepúsculo" foi para as salas de cinema (na obra de Meyer a castidade e a forma como as personagens lidam com a sexualidade estão relacionadas com temas religiosos: a autora é mórmon e há quem considere isso uma evidência nos livros.) Mas isto, em vez de afastar os jovens da leitura, parece atraí-los. Num artigo intitulado "Nada de sexo por favor, somos vampiros" a "Newsweek" concluía: "Para a maioria dos romances, a política de 'nada de sexo, por favor' seria uma blasfémia. Mas os fãs de Meyer aceitaram isso como um casal de adolescentes que apenas se abraça no sofá. Muitas mães dizem que usaram os livros como forma de começarem aquelas estranhas conversas 'de mãe para filha' com as raparigas adolescentes."
Este é mais um dos segredos do sucesso da saga: atravessa as fronteiras entre a literatura para jovens e a literatura para adultos. A autora ainda está estupefacta com o sucesso. "Só sei o quanto amo as minhas personagens. Se calhar isso transparece nas obras e faz com que as outras pessoas as amem também", afirmou ao Ípsilon por email.
O ponto de vista da rapariga
Quando começou a escrever "Crepúsculo", Stephenie Meyer era uma mãe de 29 anos com duas crianças no colo. "Já tinha algumas semanas de avanço na minha escrita e a minha irmã mais velha juntou-se a mim como leitora. Durante todo o tempo em que escrevi 'Crepúsculo' a minha audiência rondava os 30 anos. Na verdade, fiquei mais surpreendida com o sucesso junto dos leitores mais jovens do que dos adultos."
Tem agora 35 anos e, tal como a sua heroína, Bella, cresceu em Phoenix, Arizona. Doutorou-se em Literatura Inglesa na Brigham Young University em Provo, Utah, universidade que pertence à Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias.
A história de sucesso começou em Junho de 2003 quando sonhou com as duas personagens que são os heróis destes livros. O sonho está descrito de "forma muito aproximada" no capítulo XIII de "Crepúsculo", quando Edward e Bella estão deitados num prado. Ele, belíssimo, cintilava debaixo dos raios de sol por não ser humano e tentava explicar à rapariga como era difícil não ceder à tentação de a matar. "Eu estava tão envolvida naquele sonho que senti a compulsão de o preservar. Quando acabei de registar os acontecimentos desse sonho, quis saber o que ia acontecer àquelas intrigantes personagens, por isso continuei a escrever. Nunca mais tive um sonho como aquele, mas também não precisei. Quando tenho personagens interessantes as histórias tendem a escrever-se sozinhas. À medida que explorava o que iria acontecer a Bella e a Edward, as suas famílias e os seus amigos ganhavam vida e isso trouxe-me mais personagens com outros conflitos. O problema não é arranjar mais histórias, o problema está em moldá-las numa direcção."
Decidiu escrever do ponto de vista da rapariga. Pareceu-lhe ser a única escolha. "Eu era uma escritora inexperiente e a história de Bella era aquela com a qual eu tinha familiaridade. Sou uma mulher, sou humana - estes factos deram-me o ponto de partida. Podia colocar-me na sua posição."
Quando lhe dizemos que a personagem é uma rapariga de 18 anos que parece de outro tempo - faz as tarefas domésticas, está disposta a sacrificar tudo por um homem, tem uma ligação casta com Edward e quer casar - Meyer não considera justo que se resuma Bella assim. "Quando se coloca na mesma frase a responsabilidade pelas 'tarefas domésticas' e o 'estar disposta a sacrificar tudo por um homem', tudo soa terrivelmente mal. Uma grande parte da personalidade de Bella é ela tomar conta dos outros - é o adulto da sua família", defende. "Para mim, cozinhar não é algo que uma mulher faz (e em minha casa acontece o oposto), é alguma coisa que um adulto faz. Estas qualidades de ajudar os outros contrastam realmente com o seu romantismo. O seu eu interior é mais adulto do que a sua idade; quando ela se apaixona, é a primeira vez que ela realmente age e se sente como uma adolescente", explica.
"A saga é uma fantasia", reforça. "Eu não estava a escrever sobre o tradicional amor com falhas que todos temos - o amor que se desvanece, que não é correspondido, que é corrompido - o amor humano trivial. Eu queria escrever sobre um amor perfeito, que não esmorece, que é correspondido, que se baseia em motivações puras."
É verdade que Bella sacrificaria tudo pelo seu homem, mas "isto não é um juízo sobre a sua feminilidade. Há uma total igualdade na relação de Bella e Edward que a torna perfeita - uma fantasia. Nunca ninguém sugere que há algo de errado com o total compromisso de Edward para com Bella e tenho ficado surpreendida com a quantidade de pessoas que vêem algo de errado com a parte de Bella na relação. É ter dois pesos e duas medidas."
Insistimos: como é que uma rapariga tão conservadora atrai tantas fãs? Meyer não acredita que o encanto de Bella esteja no ser uma heroína antiquada. O apelo está na sua normalidade. "Não existem muitas heroínas como Bella - qualquer pessoa pode colocar-se nos seus sapatos em qualquer altura da saga. Ela não tem superpoderes. Ela não tem fortuna. O facto de ser tão normal faz com que seja excitante ler sobre ela - porque se tudo isto aconteceu a Bella, não há razão para que não possa acontecer ao leitor."
Jana Riess, a ex-crítica literária especialista em assuntos religiosos da "Publishers Weekly" e editora na Westminster John Knox Press, defende que os romances de Meyer estão cheios de referências à teologia e simbologia do Livro de Mórmon. A ficção de Meyer provoca-lhe sentimentos ambivalentes: preocupa-a "o regresso aos estereótipos de género". Quando pedimos a Meyer que comente algumas das ideias defendidas por Riess, ou a síntese da revista "Time" que rotulou o seu trabalho como "o erotismo da abstinência", ela recusa; não quer pronunciar-se também sobre se os "media" estão ou não a dar uma imagem errada dela, rotulando-a como dona de casa mórmon e ignorando a sua preparação académica em literatura inglesa.
Lançado em 2005 em Portugal, pela Gailivro, o livro "Crepúsculo" foi re-editado com nova capa ao mesmo tempo que o filme realizado por Catherine Hardwicke chegava às salas portuguesas em 2008 (acaba de sair o DVD com vários extras). O primeiro livro da saga vendeu mais desde que se começou a falar no filme do que nos quatro anos anteriores. Entrou nos "tops" dos mais vendidos e levou atrás dele o segundo volume, "Lua Nova", que também já foi adaptado ao cinema. "Eclipse" vai ser adaptado por David Slade e "Amanhecer", o quarto da série, poderá vir a dar dois filmes.
Em Portugal, Meyer já vendeu 200 mil exemplares das suas obras, "sobretudo a jovens e sobretudo a raparigas". Embora "Amanhecer" só vá para as livrarias em Junho, há um mês foi publicado em Portugal "Nómada", o romance que escreveu para adultos e do qual já tem ideias para duas sequelas. Mas ainda não sabe quando as publicará. "Tenho tantas histórias que quero contar. A atenção que está a ser dada aos meus livros, para mim, não é questão; quando escrevo, esqueço-me da minha vida e entro dentro da vida de outra pessoa. Tudo o que preciso para isso é de tempo, mas o tempo é aquilo que me falta.