Alguns protagonistas

José Oliveira da Silva 64 anos, é economista e foi um dos principais liquidatários judiciais da zona Norte até ser detido em Julho de 2002. Nessa altura era um respeitado elemento da classe, presidindo ao Conselho Geral da Associação Portuguesa de Gestores e Liquidatários Judiciais. Esteve preso preventivamente duas vezes ao longo do processo, uma por três meses e outra por dois. Acusado de 48 crimes de corrupção passiva, 48 de participação económica em negócio e de 12 de peculato, foi dos poucos arguidos que, segundo a procuradora, contribuíram para a descoberta da verdade, tendo confirmado que recebia comissões dos leiloeiros, prática que disse estar enraizada nos processos de falência. O Ministério Público considerou que muitos dos crimes ficaram por provar (nomeadamente os de participação económica e os de peculato), mas mesmo assim pediu uma pena não inferior a 15 anos de prisão.
Francisco Alves 50 anos, é economista exercendo funções de liquidatário judicial desde 1997. Sobressaíam os sinais exteriores de riqueza que davam para sustentar um iate, um Audi A6, uma casa, metade de um estabelecimento comercial e aplicações financeiras de mais de 100 mil euros entre 2000 e 2002. Este arguido também foi preso preventivamente. Foi acusado de 12 crimes de corrupção passiva, 12 crimes de participação económica em negócio e quatro crimes de peculato, tendo o Ministério Público solicitado uma pena de 12 anos de cadeia.

Avelino Pedro Pinto 48 anos, era dono com a mulher, Aurora, 47 anos, da Sociedade Nacional de Leilões, e para a procuradora que acompanhou o julgamento o casal era o "cérebro de toda a actividade criminosa". A procuradora repetiu nas alegações finais que o leiloeiro era quem "dava a cara", mas era a esposa, professora universitária, que "controla tudo nos bastidores". "A maioria dos bens móveis foram vendidos a sucateiros e dos bens imóveis a imobiliárias", conclui então, contrariando a tese da defesa que alega que os leiloeiros tentavam sempre vender os bens das massas falidas pelo melhor preço ao consumidor final. Ao casal, o Ministério Público imputou 108 crimes de participação económica em negócio, 107 de corrupção activa e 11 crimes de peculato. Apesar de a procuradora ter reconhecido que muitos ficaram por provar, calculou que os dois obtiveram pelo menos cinco milhões de euros de benefícios com os ilícitos, tendo pedido 17 anos de prisão para ele e 13 para ela. Entre Setembro de 1998 e Março de 1999 foram transferidos para um conta off-shore do casal, em Nassau, mais de 10 milhões de euros.

Luís Aroso 41 anos, genro de Oliveira da Silva, chegou a estar inscrito como liquidatário judicial, mas não foi nomeado em nenhum dos casos investigados. O Ministério Público defendeu, contudo, que ele tinha uma "tarefa crucial" no recebimento das remunerações ilícitas pagas pelas leiloeiras, uma vez que era ele que se deslocava a estas empresas para receber o dinheiro. Várias vezes depositou nas suas bancárias o produto da venda de bens das falidas do sogro, fez aplicações financeiras com as referidas quantias e dividiu os juros com o sogro. Apesar de Oliveira da Silva ter insistido que o genro não sabia da origem do dinheiro e o ter tentado ilibar, os juízes não o pouparam.

Miguel Teixeira e Melo 60 anos, é economista e exerceu funções de liquidatário judicial desde 1991. O Ministério Público imputa-lhe a participação em dezenas de falências, tendo-o acusando de 32 crimes de corrupção passiva para acto ilícito, outros tantos de participação económica em negócio e sete de peculato. M.O. a Os três exemplos que se seguem revelam o comportamento dos liquidatários agora julgados, que tinham como função gerir o património das empresas falidas, e das leiloeiras que ficavam encarregues de vender os respectivos bens. Nem sempre salvaguardando o interesse dos credores.
Magalhães & Irmão
Em 26 de Fevereiro de 1998, o Tribunal de Santo Tirso declara a falência da sociedade Magalhães & Irmão, Lda, que detinha as Confecções Europa. A Sociedade Nacional de Leilões (SNL), de Pedro e Aurora Pinto, ficou encarregue de vender o património da empresa, tendo escolhido fazê-lo por negociação particular, sem recurso a leilão. Um empresa, administrada por um amigo de Pedro Pinto, fez a proposta mais alta oferecendo 250 mil contos. Quem sinaliza o negócio é, contudo, o próprio leiloeiro, que segundo a acusação terá informado o amigo dos valores das restantes propostas e terá permitido assim que este tivesse comprado os bens imóveis da Magalhães & Irmão. Facto é que, antes de o pagamento ser concluído, o bem é comprado por um outro interessado, que inicialmente apresentara uma proposta de 201 mil contos e que depois aceita pagar 375 mil contos pelo edifício. Os arguidos dizem que o que existiu foi um negócio legítimo: o comprador cedeu a sua posição a outro e, por isso, os 125 mil contos que ganhou são seus e não da massa falida. A SNL cobrou 10 por cento dos 250 mil contos, tendo entregue ao liquidatário Miguel Teixeira e Melo 8550 contos. As duas partes também foram remuneradas pelo tribunal, que pagou 2553 contos ao liquidatário e 1250 contos à leiloeira. Contas feitas, Miguel Melo recebeu mais de 11 mil contos em resultado da venda e a SNL 17.700 contos. Apesar de não ter sido provado, o Ministério Público considerou que a massa falida foi prejudicada em mais 125 mil contos.
Converfil
A Converfil - Sociedade Industrial Têxtil, SA, é declarada falida em 1999. O arguido António Anjos foi o liquidatário encarregue de vender a massa falida. Em Fevereiro de 2000 os bens imóveis foram adjudicados a uma empresa por 388 mil contos, tendo pago 76 mil contos em Junho desse ano. Pelo menos metade do dinheiro deveria ter sido nessa altura depositado à ordem da massa falida (a outra metade seria para pagar uma comissão à leiloeira), mas isso só aconteceu em Fevereiro de 2002. Durante um ano e oito meses, o casal Pinto usufruiu dos juros daquele dinheiro, o que, segundo o Ministério Público, equivaleria a um proveito nunca inferior a 1500 contos. Tal aconteceu, dizem, com a conivência do liquidatário, que não zelou, como era seu dever, por uma eficaz gestão dos bens da falida.
Fiação de Servez
Oliveira da Silva foi o liquidatário da Sociedade de Fiações de Tecidos de Servez, cuja falência foi decretada em Dezembro de 1993. A Sociedade Nacional de Leilões (SNL) ficou encarregue da negociação. Vários imóveis que totalizavam uma área de quase 40 mil metros quadrados no interior do perímetro urbano de Famalicão foram vendidos em 1996 por 93 mil contos, ou seja, pouco mais de dois contos e trezentos o metro quadrado. A acusação diz que um relatório de avaliação feito para prédios similares e com referência aos mesmos anos aponta para valores de 15 contos por metro quadrado. Esses imóveis foram vendidos a um amigo do leiloeiro Pedro Pinto e a duas empresas em que esse colega de faculdade e um outro estavam ligados. No ano deste negócio, em 1996, a acusação diz que a SNL recebeu perto de 97 mil contos no âmbito de processos de falência em que foi liquidatário Oliveira da Silva, tendo entregue a este mais de 48 mil contos. Dois dos pagamentos terão sido efectuados em dinheiro, um de 20 mil contos e outro de 18 mil. M.O.

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