Chegam os russos da Lukoil
A petrolífera russa quer 30 por cento da Repsol, o que a trará
para Portugal
a Em tempo de crise financeira as questões políticas atenuam-se, mas não desaparecem. Esta é a moldura que enquadra a venda de 20 por cento da espanhola Repsol YPF, por parte da construtora Sacyr, e as negociações que decorrem com a russa Lukoil. Na quarta-feira o primeiro-ministro de Espanha, José Luis Zapatero, afirmou que o Governo irá "defender a Repsol e seus accionistas de referência", todos eles espanhóis, mas "respeitando o mercado livre". Como é que isso será possível é que ainda não se sabe. Para já, existe um facto: a Sacyr precisa de liquidez. Aos 20 por cento do grupo que aglutinou a portuguesa Somague estão ligados mais cerca de 10 por cento do La Caixa, (accionista do BPI) que necessita de capital para a aquisição da eléctrica Unión Fenosa por parte da Gás Natural, da qual também é accionista. Assim, está no mercado quase um terço da maior petrolífera espanhola, avaliado em cerca de nove mil milhões de euros. Com o sector energético espanhol em mudanças accionistas, onde os estrangeiros têm vindo a aumentar o seu peso, vertentes da classe política mostram o seu desconforto perante o interesse russo numa área estratégica. Embora a Lukoil seja privada, ao contrário da Gazprom, o seu presidente e principal accionista, o milionário Vagit Alekperov, é próximo de Vladimir Putin e da elite dirigente russa. Só assim, aliás, poderia ter a dimensão que tem. Com receitas da ordem dos 80 mil milhões de dólares, a Lukoil existe há apenas 18 anos. Ao contrário da Yukos de Khodorkovsky, que foi desmantelada à força e depois incorporada na Rosneft, a Lukoil prosperou rapidamente. Embora seja pouco conhecida, a petrolífera de Alekperov é apenas superada pela Gazprom no panorama energético russo, e tem apostado em força na internacionalização. Além dos campos petrolíferos siberianos, a Lukoil tem diversas refinarias e bombas de gasolina fora do seu país de origem, desde a Ucrânia, Bulgária e Roménia até aos Estados Unidos. No passado dia seis Alekperov apresentou o seu mais recente investimento, uma refinaria na Sicília em parceria com a italiana ERG. Ao seu lado estava o presidente russo, Medvedev, e Berlusconi. De acordo com um estudo da escola de gestão de Moscovo, a Skolkovo, entre as maiores multinacionais russas foi a Lukoil a que mais se internacionalizou. Os seus activos no estrangeiro estavam avaliados em cerca de 20 mil milhões de dólares no final de 2007. Caso se concretize a entrada na Repsol, a Lukoil reforçará esta tendência. É que, além dos activos da própria Repsol em Espanha (incluindo 20 por cento da Gás Natural), está também presente em Portugal (na distribuição de combustível e na petroquímica, área está a investir mil milhões de euros em Sines). Fora da Europa, a Repsol tem uma presença importante na América Latina, região onde Medvedev esteve esta semana em viagem oficial subordinada ao tema energético. Sergei Guriev, reitor da New Economic School de Moscovo, afirmou ao PÚBLICO que o avanço da Lukoil deve ser entendido como uma estratégica empresarial, mesmo se há incentivos do Estado para investir no estrangeiro. Aleh Tsyvinski, professor de Economia na Universidade de Yale, acrescenta que diversas empresas estão em processo de diversificação, o que inclui a entrada no capital de companhias estrangeiras. "Embora a crise financeira também tenha atingido em força a Rússia, algumas empresas foram, e serão, menos afectadas, e estão a olhar para participações a 'preços de saldo'", afirma. Acrescenta ainda, no entanto, que o valor do negócio da Repsol é elevado, e que, com os actuais preços do petróleo, a Lukoil irá proceder de forma muito cautelosa no processo. Sobre a "sensibilidade política" do tema, diz qu e ao olhar-se para os 'pacotes de salvação' "feitos com dinheiro dos contribuintes na Europa e nos EUA, investimentos de empresas russas ou do governo russo deviam ser bem-vindos".