Para Nélson Évora o triplo salto é poesia e para Portugal é o primeiro ouro dos últimos 12 anos
Saltador juntou-se a Carlos Lopes, Rosa Mota e Fernanda Ribeiro,
mas é o primeiro atleta nacional a juntar os títulos olímpico e mundial.
O hino nacional toca hoje, em Pequim, às 13h de Portugal continental
a Há algo de poeta em Nélson Évora. Quando tem tempo e disposição, saem-lhe frases felizes, certeiras, inspiradoras. O homem que diz saltar para o infinito fez ontem mais do que poesia e saltou para a história (17,67m), ao tornar-se o quarto campeão olímpico de Portugal. Carlos Lopes teve Los Angeles (1984), Rosa Mota Seul (1988), Fernanda Ribeiro Atlanta (1996) e, agora, 12 anos depois, Nélson Évora voou para o ouro em Pequim, no "Ninho de Pássaro".Campeão do mundo no ano passado em Osaca, Nélson Évora é também o primeiro homem português a juntar um título olímpico ao de campeão mundial, repetindo um feito que só tinha sido alcançado por Rosa Mota (1987 e 1988) e Fernanda Ribeiro (1995 e 1996). A entrada na exclusiva galeria dos campeões olímpicos portugueses deixou o atleta quase sem palavras - e o primeiro-ministro, José Sócrates ,com um "nó na garganta", revelaria depois o saltador.
"É um orgulho imenso [estar ao lado de Carlos Lopes, Rosa Mota e Fernanda Ribeiro]. É algo a que vou ter de me habituar. Aconteceu tudo tão rápido, ainda não tive tempo de reflectir", confessou o atleta, que horas depois da vitória ainda não conseguia descrever o que é ser campeão olímpico, embora se sentisse maravilhado por ter cumprido um objectivo tão importante aos 24 anos. "Dei a volta de honra ao estádio com a bandeira portuguesa, o que marca um atleta."
Évora defende colegas
Com uma bandeira enrolada ao pescoço, que trouxe de Portugal com assinaturas de apoio, Évora era um homem feliz depois de ter conquistado a segunda medalha portuguesa em Pequim, o que significa o melhor resultado de sempre em termos de hierarquia no medalheiro, já que o Comité Olímpico Internacional (COI) ordena os países pelo número de medalhas de ouro (ver outro texto). "É bom poder dar essa alegria ao povo português", disse o saltador do Benfica, que na hora do sucesso aproveitou para defender os restantes atletas da comitiva olímpica. "Fizeram esse drama de estar a ser uma péssima prestação e de termos vindo para aqui passear. Isso não é verdade. Fiquei triste quando nos fizeram esse tipo de ataques e isso acabou por mandar um pouco abaixo a equipa."
Nélson Évora, no entanto, garantiu que isso não o afectou - "Unimo-nos e estiveram todos a apoiar-me" -, dando razão ao seu treinador, que o qualificou como "um animal de competição". A opinião podia ser de um mero treinador, mas João Ganço é mais do que isso. O saltador considera-o "como um segundo pai". É que foi Ganço, um antigo saltador em altura, que desviou Nélson Évora para o atletismo, quando os dois eram vizinhos em Odivelas.
Delapidar um diamante
"Ajudar o Nélson a ser campeão olímpico é uma bênção. Esforcei-me imenso, mas nem todos têm este privilégio, porque é um talento", disse João Ganço, que conheceu o atleta quando este ainda só falava francês.
Nascido na Costa do Marfim, filho de cabo-verdianos, Nélson Évora (20/04/1984) chegou a Portugal aos seis anos e iniciou-se no atletismo ao lado dos filhos de João Ganço. Demonstrou logo qualidades para os saltos (fazia salto em altura), mudando-se depois para o comprimento e o triplo. "Foram 18 anos a delapidar um diamante", explicou Ganço.
Agora o actual campeão do mundo e olímpico pensa em novas metas, como ser campeão da Europa. Vou procurar ser melhor, mais rápido, mais forte, melhor tecnicamente. Quero bater o meu recorde pessoal, melhorar no ranking de sempre, ser o próximo a passar a barreira dos 18 metros. São projectos que vou acrescentando, porque não devemos querer ter tudo de uma vez", disse Évora.
No rescaldo de uma jornada em que conquistou o ouro e antes de ter ido a um restaurante português comer "um belo bitoque", Nélson revelou que ainda não sabe o que vai fazer com os 30 mil euros que o Estado lhe vai atribuir, mas garantiu que o seu futuro é manter-se no triplo salto. "É o que eu amo fazer, adoro este movimento, esta dinâmica, esta poesia do triplo salto."
Ano Ouro Prata Bronze Total
1924 0 0 1 1
1928 0 0 1 1
1936 0 0 1 1
1948 0 1 1 2
1952 0 0 1 1
1960 0 1 0 1
1976 0 2 0 2
1984 1 0 2 3
1988 1 0 0 1
1996 1 0 1 2
2000 0 0 2 2
2004 0 2 1 3
2008 1 1 0 2*
Total 3 6 11 22
*até ao momento