Gonçalo Amaral diz que Madeleine morreu acidentalmente e que pais esconderam corpo
Ao longo de cerca de 200 páginas, o investigador que dirigiu o departamento de Portimão da PJ, que abrange a Vila da Luz, Lagos, donde desapareceu há um ano e dois meses a criança, com quatro anos na altura, apresenta a sua versão sobre o caso, arquivado na segunda-feira passada pelo Ministério Público.
Afastado do processo ainda durante a investigação, que seria inconclusiva e ditou o arquivamento, Gonçalo Amaral, 48 anos, defende que houve uma simulação de rapto da criança e considera existirem indícios de negligência na guarda e segurança dos filhos por parte dos pais, Kate e Gerry McCann, ao deixarem sozinhos no apartamento Madeleine e os dois irmãos gémeos, na altura com cerca de dois anos. Gonçalo Amaral revela, ainda, que os investigadores da PJ chegaram a pensar que Kate estaria disposta a revelar, de forma indirecta, a eventual localização do corpo da filha, cuja morte passou a admitir um mês depois do desaparecimento.
Em Junho de 2007, nos interrogatórios, a mãe "começa a dar conta de algumas informações relativas à localização do cadáver da sua filha", lê-se no livro, que vai ser apresentado pelo juiz-conselheiro jubilado e ex-director da PJ, Marques Vidal. "Segundo a própria viria a afirmar, tais dados tinham-lhe sido fornecidos por pessoas com poderes psíquicos ou paranormais. Poderia o cadáver encontrar-se num colector de esgotos que desemboca na praia da Luz, ou nos penhascos a nascente daquela praia, local em que, por vezes, praticava corrida", escreve o autor da obra.
Entre os vários episódios que terão ocorrido durante a investigação, conta um em que um vizinho dos McCann terá ouvido o pai, logo na noite que desapareceu a criança, dizer a alguém por telemóvel que "existiam redes de pedofilia em Portugal e que tinham sido essas redes as responsáveis pelo rapto de Madeleine". "É de pasmar! Poucas horas após o desaparecimento de Madeleine e o seu pai já tem quase certezas quanto aos responsáveis pelo rapto", comenta Gonçalo Amaral.
Pai demasiado descontraídoOutra situação que relata para ilustrar o alegado comportamento suspeito dos pais aconteceu num dia em que o pai de Madeleine se encontrava na PJ de Portimão com polícias portugueses e ingleses a aguardar o contacto através da Internet de alguém que dizia ter elementos que levariam à localização da criança, pelos quais exigia dois milhões de euros. "A tensão na sala era grande. Ao contrário, a postura descontraída de Gerry contrastava com a ansiedade dos polícias e deixava intrigados todos os investigadores envolvidos no caso, incluindo os ingleses", escreve o investigador que abandonou a PJ ao fim de 26 anos. O pai "chupava descontraidamente um chupa-chupa enquanto lia banalidades em sites da Internet e discutia rugby e futebol com um dos polícias ingleses”.
Gonçalo Amaral diz ainda que depois do desaparecimento "os pais terão contactado Gordon Brown, futuro primeiro-ministro inglês". "Havia um entendimento entre ambas as polícias para avançar num rumo de investigação que encarava seriamente a possibilidade de a morte da criança ter ocorrido no apartamento mas, subitamente, a polícia inglesa flectiu sem explicação técnica coerente", realça.
Mas Gonçalo Amaral não regateia elogios aos investigadores ingleses, destacando várias vezes o nome de Mark Harrison, Conselheiro Nacional para Buscas a nível de todas as agências de polícia do Reino Unido. Após "uma intensa semana de trabalho", produziu um relatório que apontava para o "provável cenário de Madeleine estar morta, e o seu cadáver escondido nas proximidades da Praia da Luz", revela.
Amaral justifica ter escrito o livro para "repor" o seu bom nome, que diz ter sido "enxovalhado na praça pública sem que a instituição a que pertencia há 26 anos" lhe tivesse permitido que se defendesse. Sobre a sua saída da Polícia, afirma que foi o modo que encontrou para fazer a sua "defesa pública".