Morreu Alfredo Saramago, estudioso da cozinha portuguesa
a O director da revista Epicur e autor de vários livros sobre as cozinhas regionais portuguesas, Alfredo Saramago, morreu ontem em Lisboa. Tinha 70 anos. Deixa uma obra extensa e sólida, sobretudo na editora Assírio & Alvim, com contributos para a elaboração futura de uma História da Alimentação em Portugal.Natural de Arronches, Alfredo António Saramago tinha escolhido, nos últimos tempos, Serpa para viver. Era um sibarita. Passou a vida a viajar, a estudar e a gozar a vida. Foi a joie de vivre, a alegria de viver, que marcou o seu percurso pelo mundo. Nos últimos anos regressava sempre que podia a sítios da Europa que já conhecia: Londres, Paris, Roma e Espanha. Adorava Espanha. Gostava de touradas, como de outras coisas "politicamente incorrectas": charutos, caça, comida requintada, mulheres bonitas. Sobre tudo isto escreveu, não fugindo a polémicas nos editoriais da Epicur.
Saramago orgulhava-se (era dos seus maiores orgulhos) por ter sido entronizado como "Chevalier du Tastevin", da prestigiada confraria francesa do borgonhês Château Clos de Vougeot, bem como de ser membro do Club des Gourmets. Mas era a pertença à confraria báquica que mais prazer lhe dava: ganhou a ela direito após ter ganho uma aposta em que um tinto Rosado Fernandes, de Reguengos de Monsaraz, bateu em prova tintos borgonheses.
E, no entanto, este estudioso das cozinhas regionais portuguesas, com particular atenção para a do seu pátrio Alentejo, tinha formação académica em Antropologia e História, por Friburgo e Oxford, e uma graduação em História da Alimentação, no Colégio de França, em Paris.
Um seu professor, Jean-Pierre Frandan, catedrático de História da Alimentação no Colégio de França, escreveu no prefácio da sua obra "O Vinho do Porto na Cozinha - história e gastronomia (Colares, 1995), que ele "já com duas licenciaturas, estudava como se fosse um jovem universitário, e com tanta perspicácia e interesse o fazia, que durante a minha orientação de graduação, aprendi tanto como ensinei". Um outro francês, Philipe de Brion, escreveu: "Com um pé no Alentejo e outro no mundo, Alfredo Saramago encontrou o balanço que vai do caviar à açorda de poejos".
O seu corpo encontra-se, em câmara ardente, na Igreja do Santo Condestável, em Campo de Ourique, Lisboa, de onde o funeral sai hoje, depois de missa de corpo presente às 9h15, para o cemitério de Benfica.