Morreu Bartolomeu Cid dos Santos, mestre da gravura portuguesa
O seu espólio, mais de três mil obras, ficará em Tavira, num centro de gravura
a inaugurar em breve
a Apesar de muito debilitado, trabalhou até ao fim e esteve toda a semana passada em Portugal, em Tavira, no Algarve, a tratar de pormenores do centro de gravura e desenho que decidiu fundar em parceria com a câmara municipal da cidade. No domingo, ao voltar a Londres, onde vivia desde meados dos anos 1950, foi directamente para o hospital, onde faleceu ontem, às 10h35, acompanhado pela mulher, uma das três filhas e dois dos seus mais antigos e próximos amigos, a artista plástica Paula Rego e o escritor Helder Macedo.
Aos 77 anos, Bartolomeu Cid dos Santos, um dos nomes centrais da gravura em Portugal, não resistiu às complicações decorrentes de um linfoma.
Segundo a Lusa, as suas cinzas deverão ser lançadas em data a marcar ao rio Gilão, em Tavira, a cidade onde depois de se ter reformado da Slade School of Fine Art montou o seu atelier. Era lá que recebia estudantes, artistas internacionais e onde planeava instalar-se definitivamente, acompanhando a criação do centro de gravura e desenho onde deverá ficar o seu espólio, cerca de três mil obras, suas e de antigos alunos e amigos, incluindo Paula Rego.
"Era um grande gravador, dos maiores. Sou grande admiradora do trabalho dele. Foi quem me ensinou a técnica da água-tinta", dizia ontem Paula Rego. "Ele tem uma visão e um uso de pretos e brancos completamente únicos."
"Professor extraordinário"Nos anos 1960, Paula Rego, que o conhecia de nome e "já era admiradora do seu trabalho", bateu à porta do gabinete de Bartolomeu Cid na Slade, onde ele foi professor entre 1961 e 1996.
"Um professor extraordinário", diz Paula Rego, que recorda a forma como o artista "ensinava a técnica de uma forma muito simples, directa e clara" e como deslocava as suas aulas das salas da escola para os corredores do British Museum, para que os alunos conhecessem os originais. "Era uma pessoa com muito bom coração", conclui a artista.
É também este homem "bestial" que recorda o escritor Helder Macedo, autor de vários textos sobre a sua pintura e gravura. "[Desde os anos 1950], tem sido um dos meus amigos mais próximos", sublinhava ontem o escritor, preferindo não comentar a obra, mas o homem: "O que interessa agora é que ele era bestial".
Aluno da Escola Superior de Belas--Artes de Lisboa (1950-56) e da Slade (1956-58, com Anthony Gross), Bartolomeu Cid era professor emeritus da Universidade de Belas-Artes de Londres, fellow do University College, também de Londres, e membro da Royal Society of Painter Printmakers.
Fez a sua primeira exposição individual em 1959, na Sociedade Nacional de Belas-Artes, sendo as suas mais recentes exposições individuais de 2004. São igualmente seus os painéis da estação de metro de Entrecampos, em Lisboa.
Segundo Jorge Queiroz, do gabinete de Cultura da Câmara de Tavira, Bartolomeu Cid estava ainda a desenhar o projecto de conteúdos do seu centro de gravura e desenho, mas todo o espólio está já inventariado.
Fernanda dos Santos, a sua mulher e co-fundadora do centro, deverá encarregar-se agora de um projecto a inaugurar "o mais breve possível" no antigo edifício da GNR de Tavira.
"Um professor extraordinário",
e "com muito bom coração", disse Paula Rego sobre Bartolomeu Cid dos Santos