"Pai" do SNS aplaude fim da gestão privada dos hospitais

Responsáveis do sector congratulam-se com decisão e apontam hospitais-empresa como caminho a seguir

a "José Sócrates percebeu que o partido não aguenta esta política liberal e regressou à matriz do PS." António Arnaut, socialista e um dos principais promotores do Serviço Nacional de Saúde (SNS), aplaudiu de pé a decisão do primeiro-ministro devolver a gestão do hospital Amadora-Sintra ao Estado e de reduzir a quatro, de uma lista de dez, os novos hospitais que serão geridos por privados. "Foi um anúncio imprevisto mas muito oportuno, porque era urgente que se subtraísse a Saúde à ganância das multinacionais", considera Ar-
naut, para quem o Governo sai dignificado com esta "correcção do er-
ro". "Vínhamos assistindo a uma retracção do público em benefício do privado e esta inflexão vem respeitar a concepção da Saúde como direito fundamental, previsto, aliás, no artigo 64.º da Constituição", congratula--se aquele responsável.
José Sócrates anunciou que só os
hospitais de Cascais, Braga, Vila Fran-
ca de Xira e Loures terão gestão privada. E isto apenas porque os concursos já foram lançados e era preciso "manter os contratos assumidos". Quanto aos restantes hospitais (Todos-os-Santos, em Lisboa, Faro, Seixal, Évora, Gaia e Póvoa de Varzim/Vila do Conde) a construção far-se-á por via de uma parceria público-privada, mas a gestão clínica será pública.
Esta sentença de morte às parcerias público-privadas na gestão dos hospitais assenta no pressuposto, adu-
zido por Sócrates, de que a gestão pública pode ser concorrencial com a privada, nomeadamente através do modelo EPE (entidades públicas empresariais) já implementado em 34 hospitais que, permanecendo públicos, têm uma gestão de tipo empresarial. "A gestão pública tem mostrado que é concorrencial com a privada e o modelo EPE tem tido resultados positivos", justificou Sócrates.
"Isso tem sido verdade", concorda
Manuel Delgado, presidente da Associação Portuguesa de Administra-
dores Hospitalares, para quem "a introdução de maior controlo e contenção" nos hospitais-empresa "dão grandes vantagens de gestão na área das compras e recrutamento de recursos humanos".
Também Constantino Sakellarides, director e professor da Escola Nacional de Saúde Pública, aponta os hospitais-empresa como modelo a seguir. "Se existem formas de gestão pública com resultados semelhantes à gestão privada, porquê ir para uma gestão privada que, ainda por cima, implica sistemas de acompanhamento muito complexos e, de uma ma-
neira global, são mal sucedidos?", questiona Sakellarides, considerando mesmo que o alargamento do mo-
delo de gestão pública de tipo empresarial a novos hospitais deve ser acelerado. "É um modelo que permite a intervenção do Ministério da Saúde, caso as coisas não corram bem. Na gestão privada, é impossível fazê--lo sem entrar em mecanismos de confronto e arbitragem", sustenta, alertando, porém, para o facto de o sucesso dos hospitais-empresa estar dependente da criação de mecanismos rigorosos de avaliação, actualmente inexistentes: "Só assim poderemos avaliar os resultados com precisão".
Considerando que o anúncio de Só-
crates assentou em "argumentos mui-
to razoáveis, aos quais é difícil encontrar falhas", Sakellarides acha que não se pode falar em recuo: "O que houve aqui foi uma inflexão de políticas".

Conflito no tribunal Sócrates também recusou falar em recuo. Mas, no caso do hospital de Amadora-Sintra, que vai voltar às mãos do Estado a partir de 1 de Janeiro de 2009, Correia de Campos tinha dito, em Janeiro, na Assembleia da República, que não iria revalidar o contrato com o grupo José de Mello Saúde. Mas chegou a falar em lançar um novo concurso público, a que juntaria um novo hospital em Sintra, manifestando assim a intenção de manter a gestão daquele hospital nas mãos de privados.
A adjudicação do hospital de Amadora-Sintra ao grupo Mello foi feita em 1995, era Lenor Beleza ministra da Saúde, apenas quinze dias antes das eleições que ditariam a vitória de António Guterres. E foi conflituosa desde o início. Em 2002, estava a actual ministra da Saúde, Ana Jorge, à frente da Administração Regional de Saúde (ARS) de Lisboa, surgiu relacionado um litígio com a entidade gestora do hospital, que acabou no tribunal arbitral e com o Estado a ter de pagar 38 milhões de euros ao grupo Mello. Posteriormente, o Ministério Público decidiu processar a ARS - Ana Jorge e 19 outros antigos dirigentes da ARS incluídos - por considerar que foram feitos pagamentos indevidos àquele grupo privado. O julgamento ainda não foi marcado.
"O hospital de Amadora-Sintra foi uma experiência mal-sucedida que gerou conflitos permanentes e que mostra que o Estado não pode delegar as suas competências num sector tão fundamental como os hospitais", considera António Arnaut. Já Manuel Delgado diz que a gestão privada do Amadora-Sintra "teve vantagens e foi
inovadora em alguns aspectos", nomeadamente porque teve "custos de
exploração mais baixos que os públicos". O que ficou por demonstrar, segundo Delgado, "é se houve ganhos no acesso e na satisfação dos utentes". com Catarina Gomes
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O hospital Amadora-Sintra foi uma experiência
mal-sucedida que gerou conflitos permanentes
"O hospital de Amadora-
-Sintra foi uma experiência
mal-sucedida que gerou conflitos permanentes"

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