Iranianos condenados a escolher entre conservadores radicais e pragmáticos
As legislativas de hoje não serão o grande teste a Ahmadinejad, mas a rampa de lançamento para as presidenciais de 2009. Aí, os reformistas querem ter uma palavra a dizer
a Quarenta e quatro milhões de iranianos elegem hoje o novo Parlamento (Majlis) num clima de relativa apatia. A campanha durou só uma semana e nem sequer cartazes eleitorais animam as ruas. Estas legislativas não são um teste à popularidade do Presidente, Mahmoud Ahmadinejad, e, muito menos, ao peso dos reformistas, antecipadamente marginalizados. São antes um exame da relação de forças entre conservadores radicais e conservadores pragmáticos, ou seja, a antecâmara das presidenciais de 2009. Por isso, os resultados serão relevantes. Após a eliminação maciça de candidatos reformistas, a competição centra-se entre dois blocos conservadores, um que apoia Ahmadinejad, outro que reúne os seus críticos conservadores. Aqueles concorrem sob a bandeira da Frente Unida dos Defensores dos Princípios (da revolução islâmica). Os "pragmáticos" invocaram o peso excessivo do partido de Ahmadinejad - o Doce Prazer de Servir - na lista de Teerão (dez em 30), para formarem a Coligação Alargada dos Defensores dos Princípios.
Nesta pontificam figuras como o antigo negociador nuclear Ali Larijani, o presidente do município de Teerão, Mohammad Baqer Qalibaf, ou Moshen Rezai, ex-chefe dos Guardas da Revolução. Os dois primeiros foram adversários de Ahmadinejad nas presidenciais de 2005 e preparam nova candidatura para 2009. O que os une não é a oposição a Ahmadinejad. Serão discretamente apoiados pelo antigo Presidente Akbar Rafsanjani, hoje líder do Conselho de Discernimento.
Genericamente, criticam a demagogia social e a desastrosa gestão económica do actual Presidente, tal como as suas provocações que contribuem para isolar o Irão. Apoiam o programa nuclear, mas exigem um maior papel para a diplomacia. O que os separa dos reformadores é a vontade de manter intactas as linhas mestras do regime teocrático, que o antigo Presidente Mohammad Khatami foi acusado de querer reformar.
Entre mais de 7000 candidatos aos 290 lugares do Majlis, foram aprovados 4500 pelo Conselho dos Guardiões. Entre os excluídos estão algumas das principais figuras do campo reformador, incluindo ex-ministros e muitos deputados, pelos mais variados pretextos: "falta de fé islâmica", "reputação duvidosa", crítica sistemática do governo ou até falta de habilitações académicas.
A operação terá sido este ano mais vasta que nas anteriores eleições, visando marginalizar os reformistas, próximos de Mohammad Khatami, para restringir a competição às facções ortodoxas do regime. Este objectivo foi conseguido. Assim, a Coligação dos Grupos Reformadores apenas concorre em 130 dos 290 círculos eleitorais e, anota um analista, se conseguir eleger 40 ou 50 deputados, será um êxito. "De facto, o destino de 160 lugares foi decidido antes de as eleições terem lugar", denunciou durante a campanha o reformista Mostafa Tajzadeh.
Falando na televisão, na quarta-feita, o Guia Supremo, Ali Khamenei, não tomou partido entre os conservadores e apenas atacou os reformistas: "Um dos critérios para uma pessoa não poder entrar no Parlamento é não estabelecer uma fronteira clara com o inimigo e as marionetas do inimigo."
Entre os reformistas, destaca-se o religioso Mehdi Karroubi, presidente do Majlis no tempo de Khatami, que mantém boas relações com o Conselho dos Guardiões e que se demarca de Ahmadinejad nos domínios das liberdades ou das relações com a América, declarando-se favorável a um reatamento das relações diplomáticas.
O Parlamento, que formalmente tem largos poderes, nunca foi uma instituição poderosa, estando manietado pelo veto do Conselho dos Guardiões. É, no entanto, um lugar de debate e uma excelente tribuna para falar ao país. Também Karroubi apostará nas presidenciais de 2009.
O calcanhar de Aquiles de Ahmadinejad é a situação económica, a alta inflação e o desemprego a crescer, sobretudo entre os jovens. A grande dúvida é a reacção dos eleitores com menos de 30 anos, 60 por cento do corpo eleitoral. Muitos dizem-se desiludidos com Ahmadinejad. Em Teerão o Presidente perderá. Mas será ainda popular na província, onde tem feito numerosas digressões multiplicando as promessas.
A incógnita
O sistema iraniano é anormal, "tanto por padrões democráticos como autocráticos", escreve Karim Sandjapour, do Carnegie Endowment for International Peace. As eleições não são livres, "mas os resultados são imprevisíveis". O Irão tem "eleições competitivas entre candidatos pré-selecionados". Acrescenta o politólogo iraniano Moshen Milani: "Com todos os seus defeitos, é através deste processo que podem ser esperadas mudanças na política e no comportamento iranianos."
A regra do jogo é clara. Os reformistas não podem vencer. Resta saber que tipo de conservadores vai o eleitorado escolher. Será um sinal para as presidenciais de 2009.