Acupunctura e hipnose não são eficazes para deixar de fumar

Todos os médicos devem abordar a cessação tabágica com os doentes fumadores. As mulheres precisam de mais do que ajuda farmacológica

a Os substitutos de nicotina (adesivos e pastilhas) estão entre os mé-todos mais eficazes para deixar de fumar. Já "a acupunctura e a hipno-
se têm efeito negligenciável ou nulo", afirmou o director do Centro de
Estudos de Medicina Baseada na Evi-
dência, da Faculdade de Medicina de Lisboa, António Vaz Carneiro, que coordenou um livro onde diz aos médicos o que resulta e o que não resulta em cessação tabágica.
"Não é opinião minha, nem opinião deste centro. É ciência", disse on-
tem o médico na apresentação de Norma de Orientação Clínica para Cessação Tabágica, um manual que
faz um resumo dos principais estudos científicos internacionais (foram incluídos 54) sobre a eficácia dos métodos para deixar de fumar. O livro pretende ser um manual pronto-a-
-usar para médicos que queiram levar os seus doentes a abandonar o vício ou mesmo promover consultas de cessação tabágica.
O director-geral da Saúde, Francisco George, referiu que é um dever dos 35 mil médicos que exercem em Portugal abordar a questão com os doentes, não precisando de haver re-
curso a consultas da especialidade - existem apenas 200 no país.
Vaz Carneiro sublinhou que basta uma conversa de cinco minutos com o médico de família para que a probabilidade de o doente deixar de fumar aumente em 30 por cento. Os métodos farmacológicos - substitutos de nicotina, ansiolíticos e antidepressivos - revelaram-se, nos estudos analisados, os mais eficazes. Mas há situações em que são precisos auxiliares. Por exemplo, as mulheres são um grupo em que é importante conjugar os medicamentos com outro tipo de apoios, lê-se.
O manual também aborda métodos alternativos. No caso da acupunctura e técnicas relacionadas, como a auriculoterapia (que em vez de agulhas usa choques eléctricos), "não há evi-
dência consistente de que sejam in-
tervenções eficazes na cessação tabágica". Não foi possível concluir se os seus efeitos são diferentes do "efeito placebo", lê-se. O livro não deixa de se referir que os estudos seleccionados "apresentam inúmeras falhas me-
todológicas".
Também o uso da hipnose para deixar de fumar "não demonstrou um efeito superior nas taxas de abandono do tabaco, aos seis meses, face a outras intervenções" ou mesmo "à ausência de tratamento". "Essas intervenções são basicamente inúteis, infelizmente", o que não quer dizer que não funcionem com algumas pessoas, ressalvou Vaz Carneiro.
O coordenador do livro afirmou "que técnicas como a auto-ajuda [panfletos, meios audiovisuais ou programas de computador] são discutíveis" e que "o apoio telefónico perde-se ao fim de poucas semanas". A terapia de grupo é mais eficaz do que a auto-ajuda, mas exige do fumador "o tempo e o esforço necessários para participar nas reuniões".
a Responsáveis e técnicos na área da acupunctura e hipnoterapia contactados pelo PÚBLICO são unânimes: só o "desconhecimento" e a "má von-
tade" justificam que se diga que as técnicas são ineficazes.
João Morais, hipnoterapeuta, sente que os resultados ontem apresentados se devem ao "descrédito com que a hipnose clínica tem sido tratada no meio académico", o que leva a que pessoas não credenciadas a pratiquem sem sucesso, "quando ela devia ser obrigatória nas licenciaturas na área da saúde".
Carlos Machado Saraiva, da clínica NãoFumoMais, frisa que a auriculoterapia (próxima da acupunctura) "também se baseia na evidência": as 15 clínicas já receberam "mais de dez mil clientes com uma taxa de sucesso superior aos 90 por cento nos primeiros seis meses". O responsável diz que basta uma sessão para que o doente fique curado, "podendo pedir o dinheiro [370 euros] de volta se recair".
Pedro Choy, responsável por 18 clí-
nicas de acupunctura, diz que afirmações sobre a ineficácia da técnica têm a ver com "má vontade" da "medicina convencional" e "de órgãos de cúpula da medicina" e lem-
bra que a Organização Mundial de Saúde a recomenda para várias pato-
logias, entre elas o tabagismo, onde as taxas de eficácia atingem os 90 por cento.
Em países como a Suécia e o Reino Unido, o tratamento é comparticipado pelo Estado, sublinha. Um dos pioneiros da técnica em Portugal afirma que hoje existem no paíss cerca de cinco mil pessoas a exercer e entre mil a duas mil clínicas.
A Lei do Tabaco dá um "novo direito aos portugueses" e deixa poucas dúvidas, pelo que "não faz sentido discutir formas de a contornar", disse ontem o director-geral da Saúde, Francisco George. Defendeu que o diploma se aplica a todos os espaços colectivos, "quer sejam públicos, quer privados". Assim, a proposta da Associação de Bares da Zona Histórica do Porto de transformar os estabelecimentos nocturnos em associações culturais e recreativas não é exequível, já que "não vão estar só os sócios" no espaço que, ao ser de "uso colectivo, está sujeito à lei".

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